Cineasta americano de espírito independente, também actor e dramaturgo, Henry Jaglom morreu no dia 22 de setembro em Santa Monica, Califórnia, contava 87 anos (a notícia só foi divulgada alguns dias depois da sua morte). Grande amigo de Orson Welles, filmou-o naquele que seria o seu derradeiro papel no cinema, em Someone to Love/Alguém para Amar — rodado em 1985 (ano da morte de Welles), só seria difundido dois anos mais tarde.A estreia de Jaglom na realização, A Safe Place (1971) contou também com a participação de Welles, no papel de um mágico que “assombra” a personagem interpretada por Tuesday Weld, dividida entre as frustrações do presente e as memórias da infância. O filme conta também com a participação de Jack Nicholson que, em 1969, protagonizara Easy Rider, contracenando com Peter Fonda e Dennis Hopper — aliás, Hopper viria a ser o actor principal de Tracks (1976), em que Jaglom, de forma pioneira, encena as marcas traumáticas da guerra do Vietname..Nascido em Londres, a 26 de janeiro de 1938, Jaglom pertencia a uma família judaica que, nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, rumou aos EUA perante a ameaça nazi na Europa. Formado no Actors Studio, em Nova Iorque, onde teve Lee Strasberg como professor, Jaglom pertenceu a uma conjuntura artística e política muito marcada pelos ecos da “contracultura" (palavra que o historiador e filósofo Theodore Roszac cunhou como símbolo das muitas formas de contestação cívica e política ao longo dos anos 60/70).Por vezes participando no elenco dos filmes que escreveu e realizou (como aconteceu no já citado Someone to Love), Jaglom fez também carreira enquanto actor de outros cineastas, nalguns casos actores/cineastas como ele. Assim, por exemplo, encontramo-lo em Drive, He Said/Relações Cruzadas (1971), de Jack Nicholson, e The Last Movie (1971), de Dennis Hopper, sem esquecer The Other Side of the Wind/O Outro Lado do Vento, o filme póstumo de Orson Welles rodado no começo da década de 70 cuja conclusão só seria possível em 2018, graças ao trabalho de recuperação e pós-produção posto em marcha por Peter Bogdanovich (outro cineasta revelado no mesmo contexto cultural). .Muito influenciado por Federico Fellini — considerava mesmo Oito e Meio o filme que o ajudou a decidir a sua carreira —, Jaglom explorou com frequência formas narrativas não lineares, quase sempre envolvendo um desafio formal às regras do classicismo de Hollywood. Mais do que isso, as componentes ambíguas das suas histórias, frequentemente apelando a um estranho onirismo, eram sustentadas pela utilização muito livre de canções lendárias — em A Safe Place, por exemplo, ouvem-se, entre outras, La Mer (Charles Trenet), As Time Goes By (Dooley Wilson) e Someone to Watch Over Me (Dinah Shore).Na sua filmografia de cerca de duas dezenas de títulos, podemos encontrar ainda exemplos de comédia mais ou menos policial, como é o caso de Sitting Ducks (1980), uma variação sobre o melodrama conjugal em Déjà Vu (1997), e até um retrato sarcástico dos bastidores de Cannes. Intitulado Festival in Cannes (2001), rodado em cenários da Côte d’Azur, nele se conta a história de um produtor que tem um filme ameaçado, já que a sua vedeta, Tom Hanks, abandonou o projecto — o elenco não conta com o próprio Tom Hank, mas inclui, entre outros, Anouk Aimée, Ron Silver, Greta Scacchi, Maximilian Schell e Peter Bogdanovich.