Faltam seis dias para as eleições americanas, estamos em véspera de Halloween e a segunda temporada de uma série promete alguns sustos... políticos. Sobressaltos, melhor dizendo. A Diplomata, que em abril do ano passado apresentou uma fabulosa Keri Russell no papel de embaixadora dos Estados Unidos em Londres, está de volta amanhã, Dia das Bruxas, para mexer com as nossas células nervosas e confirmar o sucesso da primeira temporada – um sucesso que talvez tenha passado despercebido por cá, apesar da liderança do Top 10 da Netflix nos primeiros dias, mas que se certificou globalmente, com o primeiro lugar mantido ao longo de duas semanas em 87 países e 174 milhões de horas assistidas só nas primeiras quatro semanas. Estranhamente, dados sem forte correspondência em prémios, já que Russell foi “apenas” nomeada para o Emmy de melhor atriz, Golden Globe, Critics Choice e SAG Awards, e a série acumulou pouco mais que a nomeação para um Globo..Se recuperamos toda esta contabilidade paradoxal, é para deixar claro o seguinte: caso ainda não tenha visto, The Diplomat pode muito bem ser aquela excelente série que lhe está a passar ao lado sem nenhuma razão em particular. Uma criação de Debora Cahn que prima pelos diálogos rápidos e inteligência narrativa, confiando na capacidade do espectador para acompanhar a linguagem de um meio que não se afigura propriamente acessível. “É como uma explicação em forma de massa filo”, resumiu a própria criadora à revista Variety. “Apanhamos um bocadinho, depois mais um bocadinho, e a seguir ainda mais um pouco – o que, honestamente, se assemelha à maneira como todos nós vamos adquirindo conhecimento sobre os assuntos em geral”..Portanto, nada de simplificações para espectadores “turistas da política”. E esse é talvez um dos maiores ganhos de A Diplomata, que logo nos primeiros oito episódios nos fez mergulhar de cabeça num mundo que se aprende a decifrar pela energia espontânea das questões urgentes, e o modo como o desenho da geopolítica se insinua na psicologia das personagens..Na rota da vice-presidência.Recapitulando, tudo começou com a súbita designação de Kate Wyler (Russell) para o cargo de embaixadora quando esta se preparava para uma missão, mais ao seu estilo, em Cabul. Porquê a escolha de última hora para preencher um lugar que estava vago desde a presidência de Trump? Porque um porta-aviões britânico foi atacado, causando a morte a dezenas de membros da marinha, e para apurar responsabilidades num cenário de crise internacional é preciso a pessoa certa no momento certo. Mais: por trás da escolha de Wyler está, concretamente, a perspetiva de a chamar a substituir a vice-presidente dos Estados Unidos; o que significa que a posição de embaixadora é “só” um teste para avaliar a sua genica estratégica ao mais alto nível..A primeira temporada de A Diplomata introduziu-nos então a coreografia dos bastidores da política na Winfield House, assim como a complexa relação de Wyler com o marido, Hal (Rufus Sewell) – também ele um diplomata de carreira, com mais visão prática do que compasso moral –, e pelo caminho fez-nos apreciar o brilho dos secundários, aquelas personagens/atores que tornam cada episódio uma verdadeira máquina comportamental..Chegados à segunda temporada, vamos agora reforçar os laços com estas peças de xadrez humano, algumas a lidar com o trauma de uma explosão, mas todas aptas para escavar os eventos da temporada anterior, antes de receber a visita da ainda vice-presidente dos EUA, interpretada por Allison Janney. Será ela – aliás, dona e senhora de algumas das melhores cenas do novo capítulo –, quem se encarrega do tão necessário discurso de mulher para mulher que põe Wyler/Russell na direção certa para o próximo cargo (“Este é um mundo visual”, diz-lhe), alterando o aspeto cómico da relação da embaixadora com os códigos de vestuário e sofisticando, ainda mais, a dinâmica da realpolitik..Com a pedalada que lhe deu a escrita de episódios de séries como Os Homens do Presidente (1999-2006) e Segurança Nacional (2011-2020), Debora Cahn faz aqui do thriller político um envolvente jogo de ação, levado a um patamar superior pela desenvoltura singular de Keri Russell (olá, The Americans!). É ver a perfeita mistura de garra, vulnerabilidade e atração num corpo que está a interiorizar a dança sinuosa do poder..Desta vez com seis episódios, que apontam todas as setas para a terceira temporada (já anunciada), A Diplomata não nos prepara para o seu novo final estrondoso, a “brincar” com a titubeante atualidade política americana... A conferir.