Se o terramoto de 1755 se repetisse hoje, Lisboa viveria uma nova tragédia. A comunidade científica ligada à engenharia sísmica não tem grandes dúvidas disso..Embora não exista um estudo sistemático das fragilidades concretas do parque habitacional e das infra-estruturas da capital, sabe-se que elas existem. Falta, porém, conhecer essas vulnerabilidades caso a caso e dar o passo que a seguir se impõe intervir onde isso for necessário. Ou, como sublinhou ontem o presidente da República na sessão de abertura da conferência internacional "25th Anniversary of the 1755 Lisbon Earth Earthquake", "o sismo não pode ser evitado, mas a tragédia sim". Foi, de resto, nesse sentido que Jorge Sampaio apelou, ao afirmar que "é preciso aproveitar as capacidades actuais das ciências da engenharia para reforçar ou substituir as construções mais fracas", disse, sublinhando, no entanto, que as questões que se colocam não são apenas de âmbito técnico-científico e da protecção civil. "A resolução envolve a participação do Estado e da sociedade civil em geral, na discussão pública das sugestões propostas.".Referindo a importância de um programa de redução de vulnerabilidade sísmica, o presidente notou ainda que uma das consequências fundamentais desse programa seria "estimular os cidadãos e as autoridades, os consumidores e as empresas, a exercer uma cultura de exigência na aquisição e manutenção de bens imobiliários"..A questão da prevenção foi, aliás, o tema forte da sessão de abertura da conferência que, até sexta-feira, reúne na capital portuguesa 200 peritos de várias áreas científicas - da geotectónica e geofísica à engenharia sísmica ou o planeamento urbano. Quanto ao problema da prevenção, Sálvano Briceño, que dirige o programa das Nações Unidas para a redução das catástrofes referiu-se-lhe também na mesma sessão, ao afirmar que "as consequência catastróficas dos desastres naturais resultam sobretudo das fragilidades das sociedades". E lembrou a propósito que, "só este ano, Portugal sofreu uma das piores situações de incêndios florestais a nível internacional, a Bulgária e a Roménia tiveram inundações graves, os Estados Unidos foram surpreendidos pelo furacão Katrina, e há poucas semanas, o sismo no Paquistão foi devastador". .Minimizar as consequências dos desastres, sublinhou, "não pode ser encarado como uma questão académica, mas como algo que tem que ser vivido no quotidiano, com investimento na prevenção, a nível nacional e local". Isso, afirmou, "só será possível se conseguirmos mostrar aos responsáveis, e aos cidadãos também, que a relação custo-benefício tem que ser equacionada". O que pressupõe educar para a cultura de risco..Necessidade de Acção. Carlos Sousa Oliveira, especialista em engenharia sísmica do Instituto Superior Técnico, e um dos organizadores da conferência, sublinhou, por seu turno, a necessidade de se tomarem medidas em algumas frentes, já que Portugal tem um elevado risco sísmico.. "A engenharia sísmica tem soluções para evitar os danos provocados pelos tremores de terra", explicou, sublinhando que, "se aproveitarmos o tempo até ao próximo sismo, poderemos no futuro evitar uma catástrofe humana"..Para isso, o especialista, que é também o actual presidente da Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica, defende que se deve tomar uma série de medidas sem perda de tempo. Criar fiscalização sistemática das construções, que não existe, e avançar para uma legislação (também inexistente) que permita fazer a reabilitação sísmica dos edifícios antigos são apenas duas delas. . Outra tarefa "urgente", defendeu Sousa Oliveira em declarações ao DN, é a avaliação sistemática de infra-estruturas, como hospitais e escolas, no âmbito de um programa de diagnóstico global, para a resistência sísmica. "Há alguns trabalhos pioneiros não existe um programa global, que deveria abarcar pelo menos as zonas de maior sismicidade". O especialista admite que "não se pode atacar tudo de uma vez, mas era importante definir uma estratégia, com prioridades, para as coisas se irem fazendo". Quanto à responsabilidade de um programa dessa natureza, diz, ela "caberá ao Governo".