Viva o 25!

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Carlos Moedas, esse perigoso agitador, divisionista e causador de fraturas na sociedade, resolveu dizer que a Câmara de Lisboa vai comemorar o 25 de Novembro. A proclamação foi feita no 5 de Outubro. No dia em que se comemora a implantação da república, o autarca de Lisboa estava a pensar noutra data, a que, na verdade, consolidou a democracia e evitou que um regime ditatorial derrubado a 25 de Abril caminhasse para um outro regime ditatorial, como deixava antever o 11 de Março.

São, apenas, datas. Mas a cada data correspondem factos históricos. E a história não pode e não deve ser reescrita tendo em conta as conveniências político-ideológicas de cada um nos dias de hoje.

Se a Esquerda já se apropriou do 25 de Abril, e a sociedade foi aceitando que o golpe dos militares é pertença dos partidos "revolucionários", o 25 de Novembro está a ser apropriado por uma certa Direita, inculta e mal informada, que quer contrapor uma data à outra. Nada mais errado. O 25 de Novembro decorre, antes de mais, do 25 de Abril; decorre do 11 de Março; decorre do Verão Quente de 75 - onde se incluiu a manifestação da fonte luminosa e da "maioria silenciosa", por contraponto às minorias ruidosas de que Moedas também falou no discurso "fraturante e divisionista".

Seria redutor dizer que Abril trouxe a liberdade e Novembro do ano seguinte, a democracia. Mas se quiséssemos explicar numa frase simples a complexidade daqueles tempos quentes, abril foi liberdade e novembro foi (a consolidação da) democracia, que não acabou a 25. Terminaria com a Assembleia Constituinte, a aprovação da Constituição, as primeiras eleições legislativas e, no meu entender, a extinção do Conselho da Revolução, que só aconteceria em 1982, oito anos depois da liberdade.

Novembro é a data em que os partidários da democracia derrotam sem piedade os que defendiam outro caminho, mais autoritário, uma espécie de nova ditadura de sentido contrário àquela que tinha sido derrubada um ano e meio antes.

Não me parece, portanto, que a data tenha algo de divisionista ou de fraturante. O país em 1975 poderia ter mergulhado numa guerra civil, seguido uma deriva totalitária e "revolucionária", tornando Portugal a Cuba da Europa. Foram muitos os militares de Abril, os mesmos que trouxeram a liberdade, que se opuseram a essas tentativas, com a apoio dos que viriam a ficar conhecidos como partidos "do arco da governação". Mais tarde, as eleições ratificaram essa vontade popular de democracia representativa e ajudaram a consolidar um caminho que trilhámos até hoje.

Faz, portanto, todo o sentido, lembrar novembro. Tal como em 1975, continua a existir uma "maioria silenciosa" que apenas se pronuncia em eleições, enquanto ao mesmo tempo existem minorias ruidosas e com palco, que querem condicionar o pensamento livre, reescrever a história, apropriar-se dela como se a história tivesse donos ou como se os factos, puros e duros, naquele contexto específico, pudessem ser transformados em ideologia ou luta partidária.

Já agora, o discurso de Carlos Moedas no 5 de Outubro é bem mais do que um discurso de ocasião do presidente da Câmara de Lisboa. É o discurso de um líder da Oposição, do responsável por uma das poucas vitórias dos últimos oito anos que o PSD tem para apresentar, um discurso de quem avisa que está ali, mas quer algo mais. Montenegro tem um ano para mostrar quanto vale. Depois das europeias, o PSD volta a fazer contas. Podem marcar o congresso para um dia 25?

Jornalista

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