Sonho da independência está ligado ao 'amigo americano'

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"United States of Albania". A bandeira, riscas pretas e vermelhas e quatro águias bicéfalas em vez das estrelas dos 50 estados americanos, colada numa das primeiras lojas do lado albanês de Mitrovica ajuda a resumir porque é que o sonho albanês do Kosovo está ligado ao amigo americano, como uma criança à incubadora.

Um sérvio do lado norte diz ao DN perceber que eles queiram ter "os estados unidos dos albaneses", divididos pelos países dos Balcãs onde há regiões de maioria albanesa. "É natural, o problema é que há regiões de maioria sérvia no Montenegro, na Bósnia-Herzegovina [Republika Srpska] e na Krajina [Croácia]. E nós?", pergunta Ivan.

Enquanto o regresso à vida difícil fica adiado por uns dias, no eldorado da emoções, um kosovar pinta a vermelho num muro: "God bless America". A tinta do reconhecimento da Casa Branca à declaração de independência ainda estava fresca. Bush abriu quase todos os noticiários de ontem e quando o presidente sérvio, Boris Tadic, aparecia no ecrã, exigindo na ONU a anulação da declaração de soberania feita pelo Parlamento kosovar no domingo, logo o jovem albanês-kosovar Florent ecoava "bla, bla, bla?", para depois dizer que se "a América já reconheceu o Kosovo, nada pode parar o novo estado".

No mapa de Pristina, a bússola aponta um certo "Ocidente": Avenida Bill Clinton, Escola Americana, Hotel Victory (com uma réplica da Estátua da Liberdade no topo) ou restaurante Route 66, "a mãe de todas as estradas". Se Jack Kerouac fosse pelo Kosovo fora, talvez tropeçasse num poster gigante afixado na parede de um hotel da avenida Madre Teresa, com versão reduzida em vários bares. Por cima de uma bandeira albanesa, ao lado de uma bandeira americana, está Ramus Haradinaj, antigo comandante do UCK (Exército de Libertação do Kosovo), que está a ser julgado pelo Tribunal Penal Internacional por alegados crimes de guerra no Kosovo.

Kerouac também veria as ruínas de um edifício bombardeado pela NATO em 99, no centro de Pristina, à beira do estádio. Este monstro de cimento podre é quase fotocópia de uma imagem que também se pode tirar em Belgrado. Não muito longe, a escultura em letras gigantes que dizem "New Born" (recém-nascido) está assinada por milhares de albaneses. Pavarsia (independência em albanês) é o nome de uma das primeiras crianças nascidas domingo depois das três da tarde (hora da sessão parlamentar que declarou a independência). Pavarsia está ao colo da mãe e ainda não sabe dizer ou escrever o seu nome. Depois da guerra, em 99, também houve crianças chamadas pelo nome de um dos Clinton: Bill ou Hillary. Convido Kerouac para dar um salto à maternidade para ver se já nasceu algum Obamazinho?|

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