O que mais o surpreendeu nesta investigação sobre os jovens portugueses entre os 15 e os 17 anos?._Muita coisa me surpreendeu: a complexidade dos sentimentos, as tensões nos relacionamentos com os namorados, os amigos ou os pais, as brigas com a imagem corporal - as borbulhas, os dentes desalinhados, mamas minguadas ou exageradas. À vista desarmada, os jovens parecem viver "numa boa", mas é um equívoco, porque a investigação mostra realidades diferentes. Há jovens que desfrutam de grande liberdade nas saídas ou nos gastos. Outros sentem-se bem na pacatez da casa. Outros, pelo contrário, discutem com a família para conquistarem mais autonomia, poderem chegar mais tarde a casa quando saem à noite. .Como é que eles vivem o namoro e a sexualidade? ._A pesquisa realizada mostra que muitos dos antigos entraves desapareceram, por isso a sexualidade é hoje vivida de forma muito mais solta e descomplexada. No entanto, ganhou novas complexidades. Recentes dados da rede de pesquisa europeia Kids Online mostram que 77 por cento dos adolescentes europeus dos 13 aos 16 anos têm perfil próprio nas redes sociais da internet. A sua exposição a conteúdos pornográficos ou que promovem condutas anoréticas ou técnicas de suicídio é preocupante. E o pior é que alguns pais não estão plenamente conscientes dos riscos daí resultantes para os seus filhos. .O que é estranho, tendo em conta que muitos pais, como refere no livro, temem que o acesso dos filhos adolescentes a informações sobre sexo resulte em «tentações» precoces...._É verdade. Numa entrevista coletiva em que participaram pais e mães de jovens entrevistados, uma mãe apresentou um caso que dá que pensar. Contou que a sua filha, de 9 anos de idade, chegou a casa dizendo-lhe que tinha dado na escola o sexo oral e anal. A mãe nem queria acreditar. A questão que ela levantava era a da adequação da informação à idade da filha. .O que mudou nas relações entre pais e filhos? ._O modelo educacional que predomina é o das rédeas soltas. As relações entre pais e filhos são muito mais descontraídas, é o tu-cá-tu-lá. Os pais ocupam, como dantes, o lugar central no círculo dos afetos juvenis, no entanto, os relacionamentos mudaram: em algumas famílias, as regras fragilizaram-se por ausência ou desrespeito. Se outrora o respeito se conseguia através das ameaças de castigo, hoje a permissividade tende para a falta de regras. Mas também há famílias onde a permissividade se alia ao companheirismo e ao sentido de responsabilidade. .O estudo confirma que os rapazes escondem e reprimem mais os sentimentos do que as raparigas. Porque é que eles fazem isso, afinal?._Por causa dos modelos culturais de construção da masculinidade e da feminilidade. Um dos capítulos do livro trata precisamente de como os jovens encaram provérbios como «Do homem a praça, da mulher a casa», «Mulher que a dois ama a ambos engana» ou «Saia de mulher chega onde quer». Eu esperava um maior repúdio dos rapazes em relação a estes provérbios de cunho machista. As raparigas foram muito mais críticas..É mesmo verdade que os atrevidos têm mais sucesso no amor? ._Pois, esse provérbio, «O amor ajuda os atrevidos», também foi debatido. De facto, os atrevidos levam bem longe o atrevimento, não tomam a iniciativa apenas por paixão ou amor. Alguns encaram as conquistas amorosas como um passatempo ou acumulação de experiências. Quanto à capacidade de sedução, hoje não há diferenças de género, a sedução tende a ser assumida por ambos os sexos (no passado, pelo contrário, uma mulher conquistadora era sedutora e olhada como leviana)..Até que ponto a ideia que têm do seu próprio corpo pode influenciar as suas conquistas amorosas?._A imagem corporal é uma forte estratégia de sedução. O corpo é diariamente confrontado com o espelho, que devolve uma imagem de vaidade ou repúdio, segurança ou vulnerabilidade. Quando os jovens se sentem bem com o seu corpo, a construção da imagem corporal é gratificante. As conquistas amorosas e sexuais são mais fáceis. A autoestima ajuda, claro..O sexo está sempre ligado ao amor, à paixão, ou para eles uma coisa não implica a outra?._Há sensibilidades e comportamentos diferentes, embora seja mais entre os rapazes que a sexualidade é vivida como obsessão. Para uns, o ato sexual não faz sentido sem uma relação afetiva, a sexualidade não é um prazer instantâneo que se esvai. Mas há jovens que é isso mesmo que procuram: o sexo, as atrações instantâneas, as relações descomprometidas. .A educação sexual nas escolas continua a ser polémica. Acha-a necessária?._Depende do que se entenda por educação sexual. Se for sentenciosa, uma inculcação de dogmas e uma formatação ideológica da sexualidade, aí tenho sérias dúvidas. Se for informação pertinente, mobilizando os jovens para um debate em torno das dúvidas que têm, nesse caso acho-a necessária..Em que moldes? Debitar informação para evitar gravidezes indesejadas e doenças é suficiente?._Faz todo o sentido que a saúde reprodutiva seja discutida, que haja informação sobre as doenças sexualmente transmissíveis, no entanto, a sexualidade é também expressão de sentimentos e afetos e isso deve fazer parte da educação sexual nas escolas. Um ato sexual é muito mais do que uma simples penetração. É fazer amor. Levada à letra, esta expressão é diferente de copular ou fornicar, não é?.Os professores estão preparados para essa tarefa?._Deveriam estar, mas não é certo que todos estejam. Será que todos os professores têm vocação ou competência para ensinar? Há professores excelentes, outros não tanto. No caso da Matemática, se um professor falha, o problema é contornável, pode arranjar-se um explicador. No caso da Educação Sexual é diferente. Se um professor de conduta duvidosa é chamado a lecionar Educação Sexual, aí há legítimas razões de desconfiança. Pais e professores que não saibam lidar com a sua sexualidade dificilmente estarão em condições de induzir aos jovens atitudes corretas..Existe uma idade certa para começar a ter relações sexuais?._A pergunta foi colocada num recente inquérito europeu sobre os tempos e as transições de vida. Os portugueses acham que a idade certa para se começar a ter relações sexuais é pelos 16 anos (no caso dos rapazes, é um pouco antes). Comparando com a média europeia, estamos entre os países que apontam para uma iniciação sexual mais precoce..Os miúdos de 14, 15 anos sentem pressão, por parte dos amigos, para deixarem de ser virgens?._Essa pressão existe sim e é mais sentida pelos rapazes. Por isso mesmo tendem a iniciar-se mais cedo. A falta de experiência é motivo de chacota, o que explica a gabarolice entre os rapazes. Tem que ver com a afirmação da masculinidade. Em contrapartida, as raparigas propendem a idealizar a primeira vez com alguém especial. Os rapazes são mais caçadores de oportunidades..Ainda é significativa a percentagem de jovens que não usam preservativo?._Sim, ainda é significativa, mas também são muito significativos os avanços que se deram. Dados de um recente inquérito realizado no Instituto de Ciências Sociais mostram que cerca de oitenta por cento dos jovens dos 18 aos 24 anos usam preservativo. As percentagens baixam muito com o avançar da idade - só cerca de seis por cento dos inquiridos dos 55 aos 65 anos usam proteção. Ou seja, os idosos, principalmente os do sexo masculino, são os mais inconscientes em relação aos riscos das doenças sexualmente transmissíveis. São um grupo de risco, muito mais do que os jovens..Acha que o uso das tecnologias e as redes sociais estão a prejudicar as relações pessoais?._Tudo depende do uso. Se for obsessivo, pode ter efeitos perversos sobre os relacionamentos. Há jovens que se gabam da quantidade de amigos do Facebook. Mas há alguém que, na realidade, possa ter dois mil amigos, verdadeiros amigos, no Facebook? São traços dos tempos que vivemos. Privilegia-se a quantidade em detrimento da qualidade. .Dedica um capítulo inteiro a alcunhas. Elas podem marcar um adolescente para sempre?._As marcas perduram, sim, sobretudo em relação às alcunhas que exploram caraterísticas físicas. Nem todas as alcunhas são simpáticas. Uma jovem a quem chamavam «porta-chaves» por ser pequenina dificilmente vai deixar de ser «porta-chaves». Outros eram conhecidos por «dentes de mula», «janelas» ou «castor» por terem os dentes da frente grandes, desalinhados ou separados. As alcunhas são sempre um marcador de relações sociais.