O dia de Diamantino Santos inicia-se a partir das quatro ou cinco da manhã. Começa por ir para junto dos hotéis onde apanha turistas que querem ir para o aeroporto. A partir daí faz praça de táxis e fica atento ao telemóvel para não perder nenhuma chamada que possa chegar..Sou taxista desde fevereiro de 1976", diz, orgulhoso, ao DN. Esteve um ano sem trabalhar depois de se reformar mas não se sentiu bem com essa paragem. Decidiu voltar para os táxis e agora trabalha até cerca das 13:00. A parte da tarde é um momento que tira para fazer coisas que gosta como uma caminhada ou andar de mota.."Isto antigamente trabalhava-se mais ou menos mas agora há mais concorrência com os TVDE. É a vida que nós temos e de facto não há muito a fazer", afirma Diamantino sobre a profissão, enquanto olha atento para garantir que é o primeiro da fila da praça de táxis..O taxista nota entre os seus clientes um aumento de reclamações dirigidas aos TVDE. "Já tenho feito serviços em que as pessoas apanharam TVDE e acabaram por ir por caminhos estranhos, por exemplo. Penso que que apanhar um táxi é um pouco diferente. Claro que há TVDE com muita experiência mas o táxi é sempre diferente", diz Diamantino..Nos últimos anos, e segundo a ANTRAL e a Federação Portuguesa do Táxi, o setor do táxi está a perder mão de obra, especialmente nos grandes centros. "Nas aldeias, pequenas vilas e cidades do interior os táxis trabalham muito bem. Nos grandes centros tem-se deteriorado de ano para ano. Neste momento, Lisboa ainda tem algumas centenas de táxis que não trabalham porque não há mão de obra", afirma Florêncio Plácido de Almeida, presidente da ANTRAL..Paula Teixeira trabalha como taxista há seis anos e há um ano deixou de fazer praça para passar a fazer seguros, em que o trabalho que tem é marcado e mais estável. A pandemia empurrou-a para a estabilidade dos seguros. "Se uma pessoa está na praça tem de esperar que haja clientes. Aqui tenho trabalho marcado e tenho sempre trabalho", afirma a taxista ao DN enquanto espera pela hora de apanhar o seu próximo cliente..Começou por fazer TVDE e só depois iniciou o trabalho com os táxis. "Ganha-se muito mais no táxi no que no TVDE e não se faz tantas horas", compara Paula. Considera que os conflitos entre os motoristas das plataformas e os taxistas, especialmente no aeroporto, acaba por criar uma má imagem da profissão. Os conflitos surgem devido a motoristas que utilizam carros particulares e que afirmam ser táxis, cobrando valores altos pelas viagens que fazem. "Isto acaba por criar uma má imagem dos taxistas porque se acontecer alguma coisa numa dessas viagens, as pessoas lembram-se de ter apanhado um táxi e não um TVDE"..O Transporte Individual e Remunerado de Passageiros em Veículos Descaracterizados a partir de Plataforma Eletrónica (TVDE) chegou a Portugal em 2014, mas apenas em 2018 é que o Parlamento aprovou uma lei para regulamentar estes transportes. Passou a ser obrigatória a formação de motoristas, o licenciamento no Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), a constituição de uma empresa para ser parceiro de uma das plataformas autorizadas a ter atividade em Portugal e poder ter automóveis, além de outras coisas. Segundo os dados mais recentes do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), estão registados 62.892 motoristas de TVDE e 13 plataformas eletrónicas..Em 2022, o setor das plataformas eletrónicas teve um crescimento de 50% em Portugal..Atualmente, segundo os dados do IMT, existem em Portugal 12 mil viaturas em táxi, 9 mil empresários e 28 mil motoristas. O número de motoristas TVDE já ultrapassou largamente o número de taxistas nas ruas do país..Florêncio Plácido de Almeida, presidente da ANTRAL, considera que é importante haver uma maior regulação do setor dos TVDE para que ambos os setores existam e funcionem em harmonia. "Enquanto os TVDE não forem regulados como deve ser vai ser muito complicado para os táxis. Os táxis nos grandes centros, no meu entender, é para acabar e o público vai pagar seriamente por isso", afirma o presidente de uma das associações que representa os taxistas..Em julho deste ano, o Presidente da República promulgou um novo regime jurídico para o setor do táxi. Este prevê, entre outras coisas, a agregação de municípios para acabar com a tarifa de retorno e reduzir preços, a criação de uma tarifa sazonal que pode ser adotada em zonas turísticas e em concelhos com grande movimentação no verão. Foi constituído um grupo de trabalho e houve um longo período de conversações entre o Executivo, a Federação Portuguesa do Táxi, a ANTRAL e outras entidades.."Na Federação estamos convencidos que esta é uma lei que abre portas e muitos horizontes para que o setor do táxi se adapte às várias realidades. Enquanto a lei atual é de cariz nacional e não permite criar soluções diferenciadas, porque o país não é todo igual em termos de procura, este novo quadro jurídico vai permitir que o setor se adapte em colaboração com o poder local para responder às realidades territoriais de cada região", afirma Carlos Ramos, presidente da Federação Portuguesa do Táxi..A ANTRAL concorda com várias das coisas acordadas no novo regime, mas nem tudo, e por isso enviou para o Governo um documento escrito sobre as áreas em que não concordam.."Esperemos que o setor consiga aproveitar este novo quadro legal e que o poder local também esteja recetivo a aproveitar as novas oportunidades que a lei vai criar", diz Carlos Ramos..Além dos taxistas, as próprias federações e associações reconhecem que há clientes a regressar aos táxis depois de má experiências com TVDE. Segundo o Portal da Queixa, as reclamações dirigidas aos operadores TVDE subiram 25% em relação a 2022. As queixas estão relacionadas principalmente com problemas de faturação, a não comparência do motorista ou com a má conduta do motorista..Também as melhorias tecnológicas e a nível das frotas que o setor tem feito ao longo dos anos são vistas como razão para regressar a este transporte. "Há uma melhoria da frota e os clientes reconhecem que o setor evoluiu. Já há motoristas a conduzir táxis com formação académica, filhos de empresários que têm uma perspetiva de negócio diferente da dos pais", afirma Carlos Ramos..Expectativas e desejos partilhados por Diamantino Santos e Paula Teixeira que acreditam que pode existir uma harmonia no setor dos transportes..sara.a.santos@dn.pt