Sentamo-nos antes da uma e já vem saindo gente. Aqui almoça-se muito cedo. A certa altura, uma senhora comenta para outra: "Credo, com este vento..." Acha-nos malucos. Nós estamos confiantes: ao final de uma semana de trabalho, a ordem cósmica vai encarregar--se de fazer o vento rodar para norte, deixando-nos protegidos sob os toldos..Mandamos vir um Frei Gigante e uma travessa de lapas grelhadas. A Catarina gosta das bravas e eu gosto das mansas, o que talvez pudesse dizer tudo sobre nós mas não diz. Estas foram apanhadas há algumas horas, aqui mesmo ao lado, e o modo como recebem a manteiga, o alho e a massa de malagueta prova que foi para isto que nasceram..Limitamo-nos a fazer parte de uma cadeia. Estamos aqui para servir..Comemos uma sopa de marisco, servida dentro de um pão, e mandamos vir o peixe. Se for Inverno, talvez cherne. Se for Verão, lírio.de certeza. Ou então uma mista, daquelas que o Fernando costuma sugerir. O espadarte, dispensamos. Se não há lírio, então uma garoupa ou um boca-negra, mais uma posta de cântaro e outra de xaréu..Lá em cima, toca o sino. De vez em quando chega uma embarcação, que o guindaste iça para terra, enquanto um senhor com uma prancheta manda pesar as safatas. Passam crianças correndo atrás de uma bola. Um rapaz com ar de cobói. Uma motorizada..E nós ali, a fumar, satisfeitos porque o vento mudou para norte, ou então é do Frei Gigante. Sonhando comprar uma chata com motor fora de borda, para passear aos sábados..Os restaurantes tornaram-se o nosso luxo burguês. Perdemos o gosto das boutiques e dos stands, e o cinema está impossível. Aos restaurantes, ainda vamos. Mas a esplanada do Beira-Mar, num sábado de sol, não é restaurante: é milagre. Ademais vendo a partir de sexta.