Israel. Na altura em que se celebram ainda os 60 anos da polémica criação do Estado de Israel, judeus um pouco por todo o mundo dividem opiniões em relação à celebração. Falámos com dois desses judeus que optam por lembrar nesta data a 'nakba' - ou seja a catástrofe palestiniana. Opiniões que não fogem à polémica, antes pelo contrário.Um judeu americano que optou por viver em Portugal. Outro que trocou Israel por Londres.Alan Stoleroff é judeu americano e optou por via do casamento por se radicar em Portugal, onde lecciona Sociologia no ISCTE. Apesar de não ter nascido em Israel, cresceu num ambiente fortemente judaico, onde, segundo as suas palavras, o sionismo estava constantemente presente e a identidade com Israel era tomada como um dado adquirido.."Por muitos à minha volta Israel era visto como uma dádiva, um abrigo para os judeus, donde poderíamos obter refúgio face aos perigos do anti-semitismo. Crescendo com uma forte consciência da minha condição enquanto judeu, nunca podia ignorar Israel, mas tinha consciência de várias contradições existentes entre os mitos do regresso à "terra prometida" e o enraizamento no país onde vivíamos, os EUA. Quando perdi a crença na religião os mitos adquiridos sobre o que é ser judeu e sobre Israel caíram para mim, embora não tenha perdido a minha identidade enquanto judeu. Adoptei uma perspectiva humanista e universalista com base numa interpretação secular do significado do nosso legado judaico. A minha perspectiva política crítica permitiu-me olhar para Israel e a sua história com uma visão crítica. Após as guerras de 1967 e 1973 a ocupação dos territórios palestinianos levou--me a desenvolver mais profundamente a minha crítica de Israel e do sionismo. Encarei a colonização de terras palestinianas como um roubo, uma contradição radical com os valores da minha educação, o que tornou a ocupação intolerável e vergonhosa para minha consciência judaica. Outros - que se reclamavam da mesma identidade como eu - estavam a cometer crimes no meu nome. A minha convicção firme de que o Holocausto impõe aos judeus uma obrigação moral de lutar contra a opressão racial e nacional levou-me a envolver-me cada vez mais na luta pelo fim da ocupação e pelos direitos humanos e políticos dos palestinos", afirma o sociólogo..Também Gilad Aztmon, nascido e criado em Israel, onde serviu inclusive no Exército, optou por se auto-exilar em Londres, em 1994, com a família. Conta ao DN gente como foi crescer em Israel: "Foi muito bom. Boa comida, céu azul, raparigas liberais, uma forte crença na ideologia expansionista militante. Estava pronto para morrer na primeira guerra que Israel enfrentasse.". Mais duro nas suas palavras, Atzmon continua: "Por volta dos meus 17 anos comecei a perceber que as coisas não estavam bem. Perguntava: Quem são os judeus? Eu sou um judeu? Dois anos mais tarde tornei-me num soldado num exército que invadia o Líbano.".Apesar de terem percursos diferentes, Stoleroff e Aztmon alinham na mesma ideia de que nenhum deles tem mais direito a um pedaço de terra que qualquer outro árabe palestiniano. "As pessoas não percebem que os israelitas ainda têm que conhecer o que foi a Nakba e a limpeza étnica da maioria dos Palestinianos em 1948." Foi em 1982 que Gilad mudou a sua crenças no Estado de Israel com a guerra contra o Líbano: "Comecei a enfrentar a terrível ideia de que estava a envolver- -me numa terra que não me pertencia. Acabei por achar inaceitável e decidi sair de Israel para não voltar.".Alan Stoleroff optou por não ir viver em Israel, onde poderia fazê--lo devido à lei do retorno que permite que qualquer judeu na diáspora possa viver em Israel. Reitera que se envolve muito na questão palestiniana e afirma que não é o único. "Existem muitas diferenças ideológicas e políticas entre judeus em geral e entre os israelitas em particular. Em certo sentido, podia--se dizer que Israel está nalgum conflito consigo mesmo mas parece-me que o movimento colonizador tem conseguido prender o país, tomá-lo como refém do seu projecto, e arrastá-lo para a sua jihad contra os palestinos.".Não nega a sua identidade como judeu. "Sou uma pessoa cosmopolita e desenraizada, identifico-me algo com a figura do judeu errante, que era uma figura numa história yiddische da minha infância. Todavia, tenho ligações fortes com os dois países das minhas duas nacionalidades, Portugal e os EUA.".Tal como Aztmon, mantém relações de amizade com palestinianos, árabes em geral: 'Tenho tido o privilégio na vida de ter amigos de uma grande variedade de países, incluindo felizmente muitos países predominantemente islâmicos", diz Stoleroff.