Rússia desmente ter envenenado ex-espião

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O Kremlin considerou ontem que o envolvimento russo no alegado envenenamento do ex-espião Alexander Litvinenko é um completo "disparate".

"As alegações que estão a surgir em Londres tocam as raias da loucura e não são merecedoras de uma reacção oficial do Kremlin", afirmou à Sky News Dmitry Peskov, o porta--voz do Governo de VladimirPutin.

Os serviços secretos russos no exterior (SVR) também desmentiram ter tido qualquer ligação ao envenenamento do dissidente russo há seis anos exilado no Reino Unido.

Litvinenko, que os peritos dizem ter sido envenenado com tálio, foi ontem transferido para os cuidados intensivos e, segundo um amigo, tem 50% de hipóteses de sobrevivência nas próximas quatro semanas.

"Não temos nada que ver com o que aconteceu a Litvinenko", declarou, à AFP, o porta-voz dos serviços secretos encarregues da espionagem no estrangeiro, Serguei Ivanov, acrescentando que "é preciso procurar noutros círculos".

O FSB (serviço federal de segurança russo, sucessor do KGB) escusou-se, por sua vez, a fazer qualquer comentário e exigiu um pedido oficial de declarações por fax.

Litvinenko, ex-agente do FSB, afirmou ter recusado, em 1998, uma ordem para assassinar o bilionário russo Boris Berezovki e foi depois preso por "abuso de poder".

Julgado à revelia por traição, o agora cidadão britânico é um contundente crítico do regime de Putin, ele próprio um ex-agente do KGB. Litvinenko, de 44 anos, estava actualmente a investigar a morte da jornalista russa Anna Politkovskaya.

Esta foi assassinada a tiro no elevador de casa, em Moscovo, no dia 7 de Outubro deste ano. Politkovskaya era uma das jornalistas mais críticas da política de "normalização" levada a cabo na Chechénia.

A Scotland Yard investiga agora a pista do envenenamento através de tálio, um metal pesado altamente tóxico usado para matar ratos, estando a interrogar várias pessoas e a ver os registos de videovigilância. A investigação está a ser liderada pela unidade de contra-terrorismo.

As atenções concentram-se essencialmente sobre duas pessoas: um homem russo com quem Litvinenko falou num hotel e tomou chá e o italiano Mario Scaramella com quem almoçou num restaurante japonês de Londres no dia 1.

O ex-espião começou a sentir-se mal horas depois do almoço e antes de ficar gravemente doente confidenciou a um jornalista: "Mario disse que queria falar comigo (...) Eu pedi o almoço mas ele não comeu. Estava muito nervoso. Entregou-me um documento de quatro páginas para eu ler imediatamente". Tratava-se de informações sobre os alegados assassinos de Politkovskaya.

Após perceber que foi a última pessoa a falar com Litvinenko, Scaramella apresentou-se na embaixada britânica em Roma, estando agora escondido por recear pela vida, disseram amigos ao Times.

"O italiano não tem nada que ver com isto", disse ao mesmo jornal Oleg Gordiaevsky, antigo espião do KGB e o mais alto agente secreto a desertar para o Reino Unido, acrescentando que o envenenamento foi patrocinado pelo Kremlin e executado por um antigo colega russo recrutado na prisão pelo FSB.

No caso de serem confirmadas as suspeitas de que o Kremlin está envolvido no envenenamento, afirmaram vários diplomatas ao Times, esta poderá ser a mais grave crise entre Reino Unido e Rússia desde que Putin chegou ao poder há seis anos.

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