É verdade que alguns conseguem sentir nojo até de um advogado com toga, mas há outros que são menos esquisitos e só se deixam impressionar com coisas mesmo muito terríveis como, por exemplo, as fraldas usadas pelo filho dos vizinhos do 5.° esquerdo que passou a noite anterior a comer salsichas embrulhadas em couve-lombarda. Este tema sobre as coisas que enojam tem muito que se lhe diga. Porque é que provocam náuseas mesmo sendo inofensivas? Porque é que certos objectos ou cheiros provocam repulsa a pessoas espalhadas pelos quatro cantos do mundo e atravessam quase todas as espécies? Quem ganha, afinal, com o facto de causar tamanha repulsa aos animais? Se se aguentarem sem vomitar, vamos reflectir sobre o assunto.Primeiro, algumas palavras sobre a reacção de seres humanos a uma coisa nojenta. Há estudiosos que afirmam que as expressões emitidas quando alguém depara com algo que lhe causa nojo (palavras como iaque, bahhh, arghhh…) são as mais universais. Ou seja, todos os povos emitiriam esses sons se vissem as fraldas usadas pelo filho dos vizinhos do 5.º esquerdo. Estes investigadores, que não têm mais nada para estudar do que tentar perceber a razão por que achamos certas coisas nojentas, afirmam que as expressões faciais de repugnância são também mundiais – franzir a testa, torcer o nariz e descer os cantos da boca. Ninguém ensina as crianças a reagir assim e no entanto todas o fazem da mesma maneira.Primeira pergunta: o que provoca nojo é também internacional? Parece que sim. Tanto os esquimós como os chineses, passando pelos habitantes de Oeiras, acham repelentes umas fraldas usadas e ainda mais uma retrete com… percebem? A aversão a estas coisas parece ser mais ou menos evidente. Mas por que razão a lista inclui aranhas, lesmas, larvas, cuspo, suor ou a dentadura da avó no copo ao lado da cama? A explicação não é imediata, apesar de se poder considerar que alguns destes elementos são, na verdade, apenas causadores de fobias (sentir medo apesar de não achar necessariamente nojento).O cheiro parece explicar alguma coisa (falta explicar por que razão o cheiro enjoa, mas isso é outra história), mas, no entanto, há imagens que chocam sem as vermos ao vivo (uma fotografia de uma ferida com larvas, por exemplo). Nesses casos, é mais plausível que seja a imaginação a funcionar. A sugestão é tão forte que às vezes quase sentimos o cheiro de coisas nojentas que vimos na televisão.E os animais? Será que também para eles os cheiros ou os objectos são como repelentes? Provavelmente sim, se bem que certos cães que conheço adorem fraldas usadas, e até insistem em partilhar o prazer de vasculhar o seu conteúdo com as visitas durante um jantar de cerimónia. Embora haja muitas coisas que não são comuns, há outras que causam repugnância a quase todos os animais – peixe ou carne podre, por exemplo.As explicações para a origem e interesse biológico dessa repugnância é que não encontram consenso universal. Há quem diga que há um fundo genético para tudo isto – a evolução colocou sinais de alarme para materiais potencialmente prejudiciais ou portadores de doenças. Isto esclarece o motivo por que ninguém tem ténias em aquários em casa, mas não explica porque é que os nossos filhos bebés chamavam «um figo» às pastilhas-elásticas mastigadas encontradas coladas debaixo da cadeira do cinema ou às beatas enterradas na areia da praia.Há alguns cientistas que dizem que este é o resultado da civilização no seio do qual o homem aprendeu a transmitir aos seus filhos atitudes que em princípio o distinguem dos animais. Evitar lamber a cara de todos os que encontramos no metropolitano ao fim do dia seria um dos resultados. De qualquer forma, esta teoria não explica a aversão a coisas tão humanas como as unhas do pé cortadas e colocadas em cima da mesa de jantar! Enquanto esperamos pacientemente pela resposta, vamos fazendo iaque, torcendo o nariz e esperando que o miúdo do 5.° esquerdo aprenda a ir à casa de banho. Segunda pergunta: sabendo que os cheiros repugnantes são produzidos por microrganismos que se desenvolvem na, por exemplo, carne em putrefacção e nas fraldas sujas, que vantagem biológica os leva a persistir em causar tamanha aversão nos diversos animais? A resposta é avançada por cientistas que publicaram as suas teorias na revista Ecology. Dizem os investigadores que o objectivo principal das bactérias e fungos, que soltam gases malcheirosos enquanto se deliciam no material putrefacto, é garantir que a refeição seja só para elas. Numa experiência (de resultado previsível), deram iscos de peixe fresco e outros mantidos durante um ou dois dias em água morna a caranguejos. Como os caranguejos não são animais estúpidos, é óbvio que atacaram o peixe fresco e desprezaram os que já se encontravam em estado avançado de decomposição (cheio das tais bactérias que cheiram mal). Ou seja, se as bactérias não fossem eficientes a repugnar os potenciais comedores de peixe e carne morta, ou mesmo de frutos, estes alimentos seriam escassos e a população de microrganismos decompositores ver-se-ia aflita para sobreviver. Enojar passou assim a ser um excelente modo de vida.