Mais de dez mil pessoas participaram ontem numa marcha de protesto em Mar del Plata, na Argentina, contra o Presidente George W. Bush e a proposta norte-americana de uma zona de livre comércio desde o Alasca até à Terra do Fogo (ALCA). Uma manifestação que ocorreu horas antes da abertura oficial dos trabalhos da IV Cimeira das Américas, que reúne até hoje os líderes de 32 países do continente americano naquela cidade balnear. .O principal rosto e organizador da marcha, o ex-futebolista Diego Maradona, acabou contudo por não participar no protesto, devido à confusão. Maradona, juntamente com mais 150 pessoas - entre as quais o cineasta Emir Kusturica (que está a realizar um filme sobre o futebolista) e Evo Morales, líder socialista boliviano tido como favorito à vitória nas presidenciais de Dezembro - chegaram de manhã a à cidade no "Expresso de ALBA". À chegada, eram esperados por centenas de admiradores e jornalistas que, de acordo com os relatos, assaltaram literalmente o comboio. .A marcha de protesto ocorreu contudo de forma pacífica, não sendo necessária a intervenção de nenhum dos cerca de oito mil polícias destacados para garantir a segurança da cidade balnear. "Bush fascista, és tu o terrorista", era apenas um dos muitos gritos de ordem ouvidos durante o percurso até ao estádio onde, perante uma audiência de 50 mil pessoas, decorreu o encerramento da Cimeira dos Povos. Aí, no palco, ao lado de Maradona - com uma T-shirt onde se lia "Bush, war criminal" (criminoso de guerra) -, estava o Presidente venezuelano Hugo Chávez, que na véspera tinha dito sentir-se "inspirado" pelos manifestantes. .Presentes estavam também representantes das Mães da Praça de Maio, familiares de opositores desaparecidos durante a ditadura argentina (1976-1983) e uma delegação de 300 intelectuais, políticos e desportistas cubanos. Simbolicamente, foi feito um minuto de silêncio pela "morte" da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), uma proposta dos EUA contestada por vários países, especialmente a Venezuela. Em resposta, Chávez lançou, em 2004, a Alternativa Bolivariana das Américas (ALBA). .Ontem, o Presidente venezuelano propôs também a criação da ALCHA, a Aliança contra a Fome. "Vamos propor a ALCHA para que em dez anos acabemos com a fome na América Latina", disse perante a multidão. "A Venezuela oferece dez milhões de dólares. Estou seguro que contaremos também com o apoio de Cuba", acrescentou. .Antes, Chávez tinha explicado o seu plano aos jornalistas relançar a proposta do antigo presidente dos EUA, John Kennedy (1961-1963) - que, disse, "gostaria de ter conhecido". De acordo com o líder venezuelano será necessário um fundo de emergência de cem mil milhões de dólares para prestar assistência aos 262 milhões de pobres do continente: "os 222 da América Latina e os 40 milhões dos EUA". Kennedy, assassinado em 1963, tinha proposto uma aliança pelo progresso, que previa 20 mil milhões de dólares em 20 anos para lutar contra a pobreza e para a reforma agrária..cimeira. A ALCA, criticada pelos manifestantes por promover a desigualdade na região, é precisamente um dos temas que será debatido pelos Chefes do Estado na IV Cimeira das Américas. A grande questão é saber se haverá ou não no documento final da reunião uma data para o relançamento do projecto de livre comércio no continente - como desejam os EUA. A cimeira teve ontem início sem se chegar a um acordo sobre o tema, devido à oposição dos países do Mercosul. Contudo, apesar da "morte" da ALCA, os EUA têm vindo a estabelecer acordos bilaterais de comércio com vários países da região, como os centro-americanos ou os andinos (com os quais começaram as negociações).