Ao saber que "Panamá" significa, na língua indígena, "abundância de peixes, árvores e borboletas", tive a curiosidade de saber se a realidade atual confirma essa aceção antiga. Disseram-me que ainda há muito peixe no mar e que as borboletas voam entre os humanos e nas florestas tropicais plenas de árvores. Fiquei mais descansado. Logo no primeiro dia, enfiei, não o barrete, mas um chapéu, que eu pensei que fosse genuíno do Panamá, mas esse era "Hecho en Ecuador". A vendedora da loja de chapéus "Panamá" esclareceu-me que a palha nasce no Equador e os chapéus são feitos manualmente, há mais de 1000 anos, por índios incas. "Estos se hicieron en seis meses, porque son los mejores", disse. Desconfiei, mas as descrições referem, efetivamente, que um "Panamá" pode levar de 2 dias a 6 meses para ficar pronto, dependendo do chapéu. O nome remonta ao início do século XX, quando os franceses e os americanos, que participaram das obras de construção do canal do Panamá, começaram a imitar os trabalhadores locais, usando os chapéus para se protegerem do calor e da humidade. Ao regressarem aos seus países, diziam que os traziam do Panamá. Conta-se que a fama se espalhou, a tal ponto que o então presidente dos Estados Unidos da América, Theodore Roosevelt, fez uma visita às obras do canal e apareceu nas capas dos jornais americanos com o chapéu. Fiz o mesmo, mas não fui retratado, nem motivo de notícia quando ali estive, numa visita verdadeiramente impressionante. O canal tinha sido ampliado, há meses, para receber navios ainda maiores. Dirigi-me ao Centro de Visitantes de Miraflores, que é um espaço que permite uma experiência única, porque sintetiza a informação acerca do canal. As salas de exposições retratam a história, a biodiversidade, o funcionamento e a importância estratégica. O edifício tem dois níveis para observar o funcionamento do canal, a passagem dos navios pelas eclusas e o seu percurso. Historicamente, a França começou a construir o canal em 1880, mas teve de suspender a empreitada devido a problemas de engenharia e à alta taxa de mortalidade de trabalhadores por doenças tropicais. Os Estados Unidos assumiram o projeto em 1904 e levaram uma década para concluir a obra, que foi inaugurada, oficialmente, em 15 de agosto de 1914. A partir dessa data, o canal reduziu muito o tempo de viagem para ligar os oceanos Atlântico e Pacífico de navio. O tempo aproximado para cruzar o canal varia entre 20 e 30 horas. Existem bloqueios nas extremidades, ou seja, três grupos de eclusas, um em Gatún (lado do oceano Atlântico) e os outros dois em Miraflores e Pedro Miguel (lado do oceano Pacífico). As eclusas são abertas e fechadas durante as travessias e, quando fechadas com o navio dentro, elevam o nível das suas águas para passar para a eclusa seguinte, totalizando os 26 metros, nível do lago Gatún, que permite a circulação por dentro do istmo do Panamá. No Centro de Miraflores, o simulador é um dos elementos expositivos mais procurado, onde é possível ter a visão de "dentro da cabina" de um navio ao passar pelo canal, a que se segue a entrada na sala de exibição de um vídeo 3d. Apesar de haver simulações e também cinematografia, nada me pareceu igual a uma sessão de cinema no centro comercial em Miraflores, que dispenso, nem à vista dele sobre o Tejo. E ainda senti borboletas no Panamá..Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.