A "bela morte" - é assim que Carlos Almeida, presidente da Associação Nacional de Empresas Lutuosas, se refere ao modo como hoje se morre em Portugal. À semelhança do que acontece na América e muito devido à entrada das multinacionais no mercado português, a morte está cada vez mais entregue aos profissionais: são eles que cuidam do corpo, que o vestem, que o maquilham, que o põem mais bonito até - fica um morto de faces rosadas e cheiro a perfume, que não choca o olhar dos mais sensíveis..Da mesma forma, também as antigas capelas mortuárias, lugares inóspitos e desconfortáveis, estão a ser remodeladas, ganhando ar condicionado, sofás, máquinas de café, salas de fumo, às vezes até cantinas com sopa incluída no preço do velório. Que, como é óbvio, já não se prolongam pela noite dentro. "Em alguns sítios ainda há essa tradição de não deixar o corpo sozinho, da mesma forma que há resistências em relação à cremação, porque as pessoas ainda olham muito para o corpo e vêem a pessoa", explica a antropóloga Clara Saraiva. Mas, de uma maneira geral, essa é uma relação que está a mudar. O afastamento em relação à morte é não só psicológico mas físico. O contacto é reduzido ao essencial.."Assistir às exéquias fúnebres é muito importante, para ter a certeza racional de que aquela pessoa morreu e que está enterrada", alerta José Eduardo Rebelo, autor do livro Desatar o Nó do Luto, fruto de um mestrado em psicologia do luto. O funeral marca o fim de algo. "Veja-se como é difícil ultrapassar a situação das pessoas desaparecidas, é um luto muito mais difícil." Esse é o papel indispensável dos rituais, sejam eles quais forem. É por isso que, diz Clara Saraiva, não vale a pena dramatizar. "Perdem-se uns rituais, mas ganham-se outros." MJC