A ModaLisboa fez no ano passado 20 anos. Vinte anos é muito tempo, qualquer que seja a conta que se faz. Na moda, então, é uma eternidade. Moda é, por definição, velocidade. As tendências só o são quando a seguir a elas vêm outras que as fazem esquecer. E, mesmo quando existe uma tentativa de reabilitar algo que pertence ao passado, o que regressa já não regressa como era. Tem em cima de si a patine do tempo e tudo o que este sistema simbólico em que a moda existe lhe acrescentou de significado. Há, também, coisas que nunca passam de moda, como as minissaias, os blazers e fatos saia e casaco (vejam a nossa produção no final da revista). Mas mesmo esses clássicos são a cada nova estação renovados de acordo com o espírito do tempo. Aí está, o espírito do tempo é algo que define o sucesso da moda. De uma coleção sobre outra. É algo indefinível, o x do problema, um não sei quê que faz que um criador corresponda mais às expetativas do público do que outro. .Mas deixemos a semiótica para os Roland Barthes e os Umberto Ecos - intelectuais do nosso tempo a quem a moda encantou como fenómeno. Aqui, numa crónica de jornal, estes 20 anos da ModaLisboa servem mais para questionar de forma concreta a moda portuguesa. Sendo vinte anos muito tempo, podemos perguntar, sem sermos muito atrevidos, porque é que praticamente tudo continua na mesma. Os desfiles estão mais profissionais, é verdade. As coleções mais imaginativas. Os criadores são mais variados. Mas num ponto tudo continua na mesma - a moda portuguesa continua a olhar e a viver para ela própria, num sistema autossustentável em termos de negócio, de imagem, de rede. .Negócio... De que falo? A moda portuguesa, pelo menos a que se chama a si própria moda, não é, simplesmente, um negócio. Os criadores vivem mal, apesar das aparências, e vendem pouco. E, aparentemente, nada fazem para vender, para se massificar, ou, pelo menos, para que as suas criações ultrapassem o grupo restrito que vai... à ModaLisboa. A moda é, diz quem sabe, um negócio complexo que inclui uma parte de arte, ou criativa, e de pura estratégia financeira, económica, de marketing. E tudo isso faz parte da moda que se faz nas grandes casas como a Chanel, a Dior, a Prada... Há, em Portugal, casos de sucesso no mundo da moda - mas são marcas e não criadores individuais. Todos sabemos que os tempos estão difíceis. Mas não estiveram sempre difíceis nestes últimos vinte anos e a verdade é que Espanha, para dar um exemplo próximo, conseguiu ter marcas e criadores a dar cartas no mercado mundial da moda. Porque é que não há um único criador português que faça sucesso - a sério - no estrangeiro? Já houve várias tentativas, de Ana Salazar a Fátima Lopes. Mas o único criador português verdadeiramente importante internacionalmente não trabalha e não fez sucesso na moda portuguesa. É Felipe Oliveira Batista - é açoriano, mas estudou em Londres e sempre trabalhou no resto da Europa. .Parte do problema da moda portuguesa reside na primeira fila dos desfiles da ModaLisboa. Nas semanas da moda que verdadeiramente interessam ao mercado mundial a primeira fila é ocupada... por quem interessa ao negócio. Das editoras de moda cujas palavras são seguidas como ditames internacionais de mercado - de Anna Wintour a Suzy Menkes - às estrelas dos mercados que interessam - em Paris, só havia chinesas na primeira fila - passando pelos grandes clientes. Em Portugal, a primeira fila é ocupada por gente que já veste roupa que está a passar - e que vestirá sempre até porque, na maioria das vezes, é oferecida. Em todo o caso, a questão do mercado nem se coloca porque a maior parte das coleções que desfilam não estão acessíveis ao público. Em Paris, também é assim - o que passa na passerelle são flashes do futuro que vão iluminar as coleções de pronto-a-vestir das marcas que, essas sim, se vendem nas lojas. Na passerelle faz-se trabalho de marca. Nas lojas, negócio. O problema é que em Portugal falta esta parte.