Sem sombra de dúvida, o bacalhau cozido com pencas foi o prato que irmanou as consoadas portuguesas. Mas como acontece com as tradições que não tiveram para nós nem uma avó, nem a melhor das velhas tias ligadas a elas, quando não se interiorizaram, há uma altura em que se não reconhece e aceita o porquê da repetição. E, por cansaço, deseja-se mudança. .Isto já acontece com alguns dos meus leitores, que me pedem uma alternativa, neste dia, ao «fiel amigo» cozido. Deslumbrada, como sabem, com a consoada minhota, e convencida também de que muitos sentirão a falta do «tal amigo», venho propor-lhes, não uma substituição, mas um complemento. .Que tal incluir o não menos tradicional guisado de polvo, que nas províncias portuguesas do Norte, na ementa deste banquete, sucede ao bacalhau em posta e o antecede em bolinhos acompanhados de esparregado de nabiças?..Como a carne do polvo é muito dura, dar-lhe uma tareia antes de o cozer é consensual, não escandaliza ninguém. Sobre a cozedura prévia necessária em quase todas as preparações, já as opiniões divergem. Eu prefiro a cozedura suave ou, o que parece uma contradição, em panela de pressão. Vinte a 25 minutos, é o tempo geralmente usado em panela de pressão..Como, segundo o calendário, é tempo de ser generoso, hoje tenho duas receitas, minhotas dos quatro costados, para lhes propor.1 - Toma-se um polvo com 2 kg, pelo menos, dá-se-lhe uma boa tareia e coze-se em panela de pressão com uma cebola, a que não se retiraram as túnicas douradas. Depois de toda a pressão se ter escapado, cortam-se os oito tentáculos e o saco em bocados grandes, mas regulares. Faz-se um refogado com 2 cebolas grandes e 1,5 dl de azeite; quando bem apurado, junta-se-lhe o polvo e a polpa de pelo menos 1 kg de tomate - não vejo inconveniente, nesta época do ano, em que se utilize o tomate em conserva, que tão bem sabemos fazer - e deixa-se cozer 10 minutos. Rega-se tudo com 4 dl de um vinho branco seco, ou vinho verde, 1 ramo de salsa, 1 de tomilho - eu recomendaria de aneto, 2 dentes de alho esmagados, tempera-se com sal e pimenta, tapa-se hermeticamente e deixa-se cozer suavemente até o polvo estar macio. Nesta altura, junta-se 1 cálice de Porto, que não deve ferver mais do que 30 segundos.. Tem-se um prato coberto ou travessa funda forrada com fatias de pão torrado ou frito, sobre as quais se deita o polvo..2 - Prepara-se e coze-se o polvo com se disse, sem água adicionada, mas reserva-se a água que o próprio largou ao cozer. Faz-se um refogado como o anterior, mas juntando aqui, e apenas, meio dente de alho picado. Introduz-se o polvo no refogado, junta-se 1 colher de maisena dissolvida num pouco de água fria, tapa-se e deixa-se cozer suavemente, juntando a água de cozedura à medida que for necessária. Tempera-se com sal e pimenta e deixa-se apurar bem. .Serve-se como na anterior receita sobre fatias de pão frito. A fritura do pão é nesta receita obrigatória. Porquê dizem que impede o pão de absorver todo o molho do polvo. Eu nunca discuto ou ponho em dúvida estas crenças, quando se trata de tradições. O povo raramente se engana?.Um bom e saboroso Natal é o que lhes deseja esta vossa amiga, que fazendo jus ao título desta página, quer para todos uma Boa Vida.