O Governo decretou para hoje um dia de luto nacional pela morte, na madrugada de ontem, em Lisboa, do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e, por inerência, do Conselho Superior da Magistratura. Jorge Alberto Aragão Seia faria 69 anos no próximo dia 29 de Abril e era a quarta figura do Estado português, depois do Presidente da República, presidente da Assembleia da República e primeiro-ministro. Aragão Seia também presidia ao conselho de gestão do Centro de Estudos Judiciários (CEJ)..Não era um homem de facilidades, muito menos complacente. Nos últimos anos, sobretudo depois da sua reeleição no ano passado, tornou-se numa das vozes mais interventivas do meio da Justiça. Na tomada de posse do seu segundo mandato atreveu-se mesmo a lançar algumas farpas ao poder legislativo e executivo, dizendo-se contra uma certa cultura política do "deixa andar". Sobre a eterna temática da lentidão da Justiça nacional chegou a afirmar que não são só os cidadãos que devem sentir-se revoltados por não verem as suas questões resolvidas em tempo útil "Também os juízes se penalizam por não poderem ultrapassar as muitas limitações que são postas à celeridade da Justiça." O que só se resolve com mais dinheiro, sublinhou numa das suas últimas entrevistas (ao JN, em Dezembro de 2003). "É inquestionável que o aumento de eficácia do sistema depende, em larga medida, dos meios financeiros", disse..Outra das suas últimas batalhas, em termos públicos, foi a excessiva mediatização do fenómeno da Justiça. O processo Casa Pia foi algumas vezes referido como exemplo, embora Aragão Seia não considerasse que tudo o que estava mal tinha a ver com aquele caso . "Apetece perguntar se a Justiça deve ser notícia ou espectáculo. E se é legítimo que se veja envolvida nas agendas da comunicação social, com objectivos de share das audiências?", afirmou o 34.º presidente do STJ em Abril do ano passado..Mas o homem que pedia "recato" e "serenidade" ao meio judicial era capaz, por vezes, de "desalinhar" do coro institucionalista de muitos dos seus pares. Aconteceu quando, em Novembro passado, deixou escapar algumas reservas à nomeação da nova directora do CEJ. Questionou se a carreira de professora universitária a qualificava para as suas funções no CEJ, recorrendo a um paralelismo 'cortante' - nem toda a gente que frequenta uma escola de equitação aprende a andar a cavalo ou vira cavaleiro... Uma veia polémica que aplicou também quando em 2003 arrasou o programa Bombástico, da SIC, onde acórdãos judiciais eram atirados ao chão e pontapeados, supostamente por causa de injustiças dos tribunais. A ameaça de que as televisões podiam perder as suas licenças de emissão foi a resposta pronta que deu ao programa..o percurso. Aragão Seia nasceu no Porto e licenciou-se pela Faculdade de Direito de Lisboa em 1959. A carreira, sempre ascendente, iniciou-a como delegado do procurador da República na comarca de Miranda do Douro. Antes de se tornar Juiz de Direito (em 1968), fez uma comissão de serviço em Lisboa como inspector da PJ. Subiu todos os degraus da hierarquia da magistratura, passou por Macau, e em 1995 ingressa no STJ como conselheiro.. * Com Lusa