Em qualquer país, prevê-se que as tendências populacionais futuras sejam, em grande parte, resultado do seu passado demográfico. E Portugal não é, obviamente, excepção a esta regra. .A demografia, ao contrário de outras áreas, possui uma certa inevitabilidade. Na economia, por exemplo, existem vários factores que podem mudar a situação económica de um país de forma bastante rápida, contrariando as previsões de crescimento ou declínio económico. Na demografia, antecipar um período de, por exemplo, 20 anos é muito diferente. .A grande maioria da população que existirá daqui a 20 anos já existe actualmente. Obviamente sabe-se que a população actual será simplesmente 20 anos mais velha, apesar de que alguns terão falecido. .É particularmente a população com idade inferior a 20 anos que, em parte, é desconhecida. Dizemos "em parte" visto que não é totalmente desconhecida. Deixando para já de lado a imigração, essa população será composta pelo número de nascimentos que vão verificar-se nos próximos 20 anos. Como sugerido acima, podemos possuir uma previsão razoável desse número, com base no que aconteceu no passado recente..Sabe-se que as taxas de natalidade diminuíram drasticamente na Europa nas últimas décadas, registando em muitos países níveis extremamente baixos que se revelaram uma grande surpresa. .O gráfico abaixo apresenta o exemplo de Portugal. Ele mostra o número médio de filhos que uma mulher em Portugal teria se a taxa de maternidade de um ano em particular se mantivesse inalterada (também designada de taxa de fecundidade total - TFT). .A TFT de Portugal diminuiu drasticamente na década de 70, dos anteriores 3,2 filhos por mulher, apesar de esse declínio ter começado mais tarde do que noutros países europeus. Mas a TFT mostra um padrão europeu comum ao desses países: após alcançar um nível muito baixo, manteve-se estável. .Hoje, as mulheres em Portugal têm uma média de 1,3 filhos, e esse número ainda não deu sinais de aumentar. A consequência de uma taxa de natalidade tão baixa é demonstrada na "pirâmide" populacional de Portugal, no gráfico abaixo. A faixa etária mais jovem, no fundo, com idades entre os zero e quatro anos, representa os nascimentos nos últimos cinco anos. Note como é progressivamente menor do que a faixa etária imediatamente acima. .O facto importante aqui é que o número decrescente de jovens irá naturalmente representar os progenitores de amanhã. Em Portugal, a maternidade regista maior incidência em mulheres com aproximadamente 30 anos de idade, e pode-se verificar que essa faixa etária já começou a diminuir e que as faixas etárias inferiores estão cada vez menores..De notar que a faixa etária dos zero aos quatro é praticamente metade do tamanho do maior grupo no País, com idades entre os 35 e 39..O resultado? Se a taxa de natalidade se mantiver, o número anual de nascimentos irá diminuir. Na verdade, mesmo se a taxa de natalidade aumentar ligeiramente, o número de nascimentos irá diminuir, ainda que um pouco menos. É claro que a TFT teria de aumentar para níveis comparativamente elevados para garantir uma qualquer "recuperação" a nível dos nascimentos. Mas, por agora, não há sinais desta recuperação..Porque se verificou este colapso da taxa de natalidade? Apesar de as causas variarem de país para país, existem algumas semelhanças. .Com certeza que o mal-estar económico que afectou a Europa nos últimos anos desempenha um papel importante, o qual foi exacerbado pela recente recessão global. .Os potenciais jovens pais que não conseguem encontrar um emprego estável podem acabar por nunca serem pais. Se o forem, a gravidez acontecerá mais tarde e terão talvez não dois mas apenas um filho. Mas parece ser algo mais do que isto. .Em muitos países industrializados, não apenas na Europa mas também no Japão e na Coreia do Sul, os jovens não sentem a necessidade de começar uma família tão cedo quanto antes. .Com um maior número de mulheres a trabalhar, muitas vezes a gravidez interrompe carreiras, diminuindo os rendimentos sem um apoio estatal adequado. E há distracções para os jovens na casa dos 20 que eram menos comuns no passado, como as viagens..Resumindo, vários anos de baixas taxas de natalidade prepararam o terreno para novas questões e decisões políticas. .Se os esforços para encorajar grandes famílias falharem, existe sempre a possibilidade de a imigração preencher as lacunas, apesar de nem sempre esta ser uma solução popular. À medida que diminui o número de trabalhadores para suportar os reformados e idosos, foi e será sugerida a proposta ainda menos popular de aumentar as idades de reforma. .Seja qual for a solução, esta terá de ser abordada agora, pois já se deixou passar demasiado tempo..Carl Haub é demógrafo e investigador visitante no Population Reference Bureau (PRB) em Washington D. C. e trabalhou ainda em instituições como a National Aca- demy of Sciences, World Bank, e o US Bureau of the Census. Tem licenciatura em Ciências Políticas e mestrado em Demografia pela Universidade de Georgetown, em Washington, D.C.. Carl Haub será um dos principais oradores do Encontro Presente no Futuro: os Portugueses em 2030, que a Fundação Francisco Manuel dos Santos organiza em setembro em Lisboa.