Monte Real, condado polémico

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A origem do nome é dúbia, e os genealogistas não estão inteiramente de acordo sobre a verdadeira ascendência do 1.º conde de Monte Real. Eis a história de um condado polémico que suscitou injúrias nos jornais da época.

A contenda mereceu troca de galhardetes em praça pública, algumas injúrias e acusações mútuas. Artur Porto de Melo e Faro, o 1. º conde de Monte Real, não gostou que Álvaro Azeredo, antigo governador de Braga, escrevesse que o então novo nobre era descendente de um ramo bastardo da casa Soenga. Mais, Azeredo garantia que o pai do conde, José Dionísio de Melo e Faro, era filho ilegítimo de Henrique Azevedo Faro Noronha e Menezes.

Na altura, os títulos e as descendências valiam tanto como a honra. Por isso, atacado, o conde espalhou pelos círculos mais elitistas cobras e lagartos sobre o ex-governador.

"Nas Pedras Salgadas queixou-se a uma pessoa das relações de ambos: 'Que diabo disseste do conde de Monte Real? Está magoadíssimo. Diz que pretendeste desprover a memória de seu pai, mas que num livro que há-de publicar mostrará quem foi o grande homem donde procede'", contou Álvaro de Azeredo no livro As Minhas Relações com o Sr. Conde de Monte Real, no qual tenta esclarecer a origem nebulosa do conde. Em causa estaria também o apelido usado.

Segundo estudos genealógicos da época, o 1.º conde de Monte Real usava o apelido de Melo e Faro, apesar de esse nome não constar da sua ascendência. Magoado, o conde respondeu às acusações através do jornal O Século: "Não classifico o procedimento de Vossa Excelência querendo beliscar a memória de meu pai, para mim sagrado, dizendo que ele usou a ligação de Melo com Faro por achar bonita."

O condado de Monte Real foi criado por decreto do rei D. Carlos I, em 21 de Outubro de 1907. É um dos títulos mais recentes e também dos mais polémicos da nobreza portuguesa.

As histórias à volta da ascensão de Artur Porto de Melo e Faro ao estatuto de conde são variadas, algumas caricatas, a maioria, provavelmente, mito.

Conta-se, por exemplo, que, certa vez, D. Carlos foi à caça, mas ao chegar perto de um riacho, por ser muito forte, não conseguiu passar. Então Artur de Melo e Faro, que se encontrava entre os caçadores, agachou-se e carregou o monarca às costas. Como agradecimento, D. Carlos declarou ali mesmo ao ar livre que aquele humilde súbdito seria doravante conde. "Conde de quê?, perguntou-lhe o carregador, estupefacto. " Conde de Monte Real, porque me montei às tuas cavalitas", respondeu-lhe o rei.

O que se sabe ao certo é que o 1. º conde de Monte Real - Artur Porto de Melo e Faro - nasceu no Brasil, em 1866. Diplomado com o curso de Comércio, fez também os estudos consulares na escola politécnica. Foi 1. º oficial do Ministério da Fazenda, vice-governador do Banco Nacional Ultramarino e do Banco de Angola. Esteve igualmente ligado ao Conselho Fiscal da Companhia de Tabacos. Capitalista e milionário, teve um papel preponderante na economia do reino no final da monarquia.

Anos antes, o seu pai, José Dionísio, tinha-se feito à vida com pouco dinheiro no bolso e quase nenhuma instrução. Escritos da época descrevem-no como um homem simples - sem estudos, mas com uma enorme inteligência e força de vontade - que chegou a jornalista, comerciante e deputado, nos anos de 1869 a de 1871.

O 2.º conde de Monte Real, por seu turno, deixou marcas noutras andanças. Exímio corredor de automóveis, participou no Rali de Monte Carlo e foi presidente do Automóvel Clube de Portugal. Administrador do Banco Nacional Ultramarino, no 25 de Abril ficou sem nada depois da nacionalização do banco. Hoje, o tema permanece tabu na família.

Quando o DN contactou Maria Madalena Guimarães de Melo e Faro, a 3.ª condessa de Monte Real escusou-se a falar da história da família e assegurou que só pediu a renovação do título nobiliárquico ao Conselho da Nobreza porque na altura (estava-se então na década de 90) estava a produzir um vinho que queria inscrever com o nome Conde de Monte Real.

Mais solícito, o seu filho mais novo, o concorrente de reality shows Jorge Monte Real, contou ao DN que, após a revolução de 1974, a família teve de deixar o casarão na Rua de São Domingos à Lapa e mudar-se para a casa de férias de Cascais. " O meu avô tinha chauffeur e deixou de ter. Tinha iate, avião particular e bastante pessoal doméstico e deixou de ter", disse Jorge Monte Real. Com a fortuna dilapidada, ao condado de Monte Real resta-lhe hoje apenas o título, sem as mais-valias do passado.|

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