Macau e Hong Kong rejeitam aviso da UE sobre ameaça das liberdades essenciais

A última estimativa dada à Lusa pelo Consulado-geral de Portugal na região apontava para 170 mil portadores de passaporte português entre os residentes em Macau e em Hong Kong, sendo que o regime jurídico chinês não reconhece a dupla nacionalidade.
Publicado a
Atualizado a

A aprovação de uma nova lei de segurança nacional "ameaça minar as liberdades fundamentais" em Macau, alertou um relatório divulgado pela União Europeia (UE), descrito este sábado pelo governo da região chinesa como calunioso e difamatório.

Num relatório divulgado na sexta-feira, a UE recordou que entrou em vigor a 30 de maio em Macau a revisão da lei de segurança nacional, que alarga o crime de secessão a ações não violentas, amplia a definição de sedição e pode abranger qualquer pessoa no estrangeiro que cometa crimes contra a segurança nacional da China.

"O foco crescente na segurança nacional corre o risco de minar as liberdades fundamentais em Macau e corroer o princípio 'um país, dois sistemas' e o alto grau de autonomia" da região chinesa, sublinhou o relatório do Parlamento Europeu publicado pela Comissão.

A integração de Macau na China, acordada com Portugal, foi feita em 1999 com base no princípio "um país, dois sistemas", que previa a manutenção do modo de vida local durante 50 anos, incluindo as liberdades e direitos individuais.

O relatório da UE disse ainda que "a liberdade de reunião continua sob ameaça", recordando que desde 2020 que as autoridades proíbem a realização de uma vigília pública em homenagem às vítimas do massacre de Tiananmen.

Au Kam San, um dos fundadores da União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia, confirmou à Lusa em maio que a associação que organizou durante mais de 30 anos a vigília foi extinta por receio da nova lei de segurança nacional.

Em resposta, o Governo do território defendeu que o documento "caluniou descaradamente" a revisão da lei de segurança nacional, "difamou os direitos humanos e o estado de Direito em Macau e fez alguns comentários falsos" sobre o princípio 'um país, dois sistemas'.

Num comunicado, o executivo do território "manifesta forte descontentamento e firme oposição" ao que chama de "manipulação política" e que atribui "inteiramente a preconceitos".

O Governo de Macau defendeu serem "fatos básicos inegáveis" que os residentes gozam "plenamente dos amplos direitos e liberdades consagrados na Lei Básica", a miniconstituição da região administrativa especial chinesa.

A última estimativa dada à Lusa pelo Consulado-geral de Portugal na região apontava para 170 mil portadores de passaporte português entre os residentes em Macau e em Hong Kong, sendo que o regime jurídico chinês não reconhece a dupla nacionalidade.

Num outro comunicado divulgado este sábado, o Comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China em Macau disse que a UE "não tem o direito de interferir" nos assuntos do território, porque "são assuntos internos da China".

O Governo de Hong Kong rejeitou também este sábado o relatório da União Europeia (UE) que avisava que a região chinesa está a sofrer "uma contínua erosão" da autonomia, dos princípios democráticos e das liberdades essenciais.

Num comunicado, o executivo do território disse que "discorda veementemente e rejeita firmemente os ataques infundados, calúnias e difamações" presentes no documento, preparado pelo Parlamento Europeu e publicado pela Comissão Europeia na sexta-feira.

O Governo de Hong Kong apelou à UE para "distinguir fatos de falácias, respeitar a lei internacional e as normas básicas que regem as relações internacionais, e parar imediatamente de interferir nos (...) assuntos puramente internos da China".

O relatório europeu dá conta de uma "contínua erosão do alto grau de autonomia de Hong Kong e dos princípios democráticas e das liberdades essenciais, que deveriam estar protegidas até 2047".

O documento aponta para a imposição, em 2020, da Lei de Segurança Nacional, que coartou parte da autonomia de que Hong Kong beneficiava e, entre outras decisões, passou a criminalizar críticos do regime chinês.

Em apenas um ano, as autoridades chinesas continuaram as detenções de críticos do Governo de Pequim e até da administração daquela região.

Até 31 de dezembro de 2022, 236 pessoas foram detidas ao abrigo da legislação, enquanto outras 145, bem como cinco empresas, foram multadas.

O Governo da região chinesa acusou o bloco europeu de "fechar os olhos" ao fato de que "muitas pessoas de Hong Kong não puderam desfrutar dos seus direitos e liberdades durante o período de violência grave", referindo-se aos protestos pró-democracia de 2019.

A implementação da lei de segurança nacional "rapidamente e efetivamente restaurou a estabilidade e a segurança em Hong Kong" e permitiu a "transição do caos para a ordem", defenderam as autoridades.

A percentagem de condenação dos detidos foi de 100% desde que a Lei de Segurança Nacional entrou em vigor.

A UE denunciou que também há pelo menos 47 ativistas que lutam pela democracia que estão a aguardar julgamento.

O Governo de Hong Kong garantiu que "os casos nunca serão tratados de forma diferente devido às convicções políticas ou aos antecedentes das pessoas envolvidas".

Além disso, o executivo da região defendeu que a intervenção da China, para proibir que advogados estrangeiros participem em casos ligados à segurança nacional, "não prejudicou de forma alguma o poder judicial independente e o poder de julgamento final dos tribunais de Hong Kong".

Em simultâneo com os outros direitos fundamentais, a liberdade da imprensa "continuou a declinar em 2022", acusou o relatório da UE, entre as detenções de jornalistas e encerramento de órgãos de comunicação social independentes.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt