Hoje há frenesim no PS

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Ainda Jaime Gama não era Presidente da Assembleia da República e, no seu estilo truculento e desconcertante, dizia que se "o homem dos bigodes" - referindo-se a Guterres - fosse primeiro-ministro, o governo do PS seria só "frenesim, frenesim". A repetição era propositada, para enfatizar a energia que Guterres demonstrava e que, de alguma forma, maçava o "peixe de águas profundas", calmo e reflexivo, que é Jaime Gama, nas palavras de Mário Soares.

Hoje, esta terça-feira, é dia de frenesim no parlamento. E não será por causa do debate sobre o projeto lei do governo sobre a amnistia a conceder aos jovens por ocasião da visita do Papa Francisco a Portugal. Na bancada da maioria, volta a sentar-se Pedro Nuno Santos que, depois de mais de seis meses de afastamento, logo após a demissão do governo, regressa ao hemiciclo.
E este é um daqueles casos em que o partido, institucionalmente falando, não sabe bem o que fazer.

Pedro Nuno é querido e desejado pelos militantes socialistas, que o apreciam pela sua coragem, frontalidade, truculência, voz grossa e pelos ataques à direita. Pedro Nuno é o homem da geringonça, o negociador de cinco orçamentos, o "rapaz" que ergueu os cinco dedos quando aprovou o quinto orçamento, com aquele sorriso malandro do "habituem-se", o diabo não veio e isto até está a correr bem. É o ministro que decidiu a localização do novo aeroporto, e foi obrigado a recuar, um momento de quase humilhação pública que ficará para sempre na história da sua vida política. Nesse dia, Pedro Nuno tinha de se ter demitido. Acabou por fazê-lo mais tarde, na sequência do caso da indemnização a Alexandra Reis. Foi à Comissão de Economia e à Comissão de Inquérito à TAP fazer o luto dessa saída do Ministério. Confessou que estava "com saudades" da vida política.

Pedro Nuno volta hoje. Se for como de costume, terá lugar reservado na última fila, para onde os dois maiores partidos remetem ex governantes caídos em desgraça, remodelados ou protocandidatos à liderança. Houve um tempo, quer na bancada do PS quer na do PSD, em que a última fila parecia - e podia ser - a bancada do governo, tal era o número de renegados sentados longe das luzes da primeira e segunda filas de S. Bento.

O PS institucional não sabe o que fazer e como tratar Pedro Nuno. Costa já disse e também já outros disseram por ele que não vai embora tão cedo e que talvez possa ser candidato de novo nas próximas legislativas. O PS tem maioria, tem um primeiro-ministro, e ninguém neste PS quer afrontar o secretário-geral. O líder parlamentar, Eurico Brilhante Dias, também já veio dizer que Pedro Nuno é "valioso". E que tem espaço no parlamento. Costa nada disse e nada tinha que dizer. O aperto de mão, no momento da despedida do governo, com Costa sorridente e simpático e Pedro Nuno de mão estendida, firme e hirto, sem sorrisos, releva bem o estado da relação entre os dois. Costa deixou Pedro Nuno pelo caminho. Ele fez o luto e renasceu.

Nas comissões a que foi, já nos disse ao que vem. Teremos de nos "habituar" a ter de volta o "único" ministro das Infraestruturas que nos últimos 50 anos conseguiu pôr a CP e a TAP a "dar lucro". Palavras de Pedro Nuno, que fazem parte da construção da imagem que quer passar ao país. Um homem que deixou obra. O PS está rendido a este militante que anda a fazer o circuito da carne assada no partido, que conhece bem a máquina e que tem as suas tropas alinhadas e prontas. Só não sabe quando será o combate. Nem, exatamente, contra quem. Durão Barroso disse um dia que tinha a certeza que um dia seria primeiro-ministro, só não sabia "quando". Pedro Nuno também tem a certeza que um dia será secretário-geral, mas não sabe quando. Entretanto, que fazer com ele, sentado no parlamento, sem dar a ideia de que, ao estar perto do futuro, se está a afrontar o atual secretário-geral?

Jaime Gama, do seu privilegiado posto de observação, deverá estar a dizer, por estes dias: "frenesim, frenesim".


Jornalista

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