Histórias da avó babada do rock brasileiro

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Música. Três DVD com a carreira de Rita Lee

A cantora que começou nos Mutantes está a adorar envelhecer

Chegar aos 60 anos enxuta e feliz depois de uma vida de desbunda geral não é para todos. Mas é para a brasileira Rita Lee. A comprovar com a caixa Biografiiti, que foi lançada no ano passado no Brasil e agora está disponível em Portugal: três DVD dirigidos por Roberto de Oliveira nos quais a cantora faz uma retrospectiva dos seus 40 anos de carreira: Imagens de arquivo (como por exemplo, Rita e Elis, em 1976), concertos recentes e entrevistas nas quais não há acertos de contas, mas onde Rita fala abertamente de seus medos, de sua voz pequenina, dos ácidos, de sexo e de amor.

"Sempre achei que meninas bonitas são chatas", diz Rita Lee logo a abrir. "Eu gosto de desacatar a autoridade e faço questão de manter a minha fama de má." O primeiro DVD intitula-se precisamente Ovelha Negra e nele a cantora de Lança Perfume fala dos pais, da sua São Paulo natal, dos sonhos de infância - a paixão por Carmen Miranda e James Dean, os tempos da rádio, as diabruras no Liceu Pasteur. E recorda as primeiras músicas cantadas com as Teenage Swingers, a adoração pelos Beatles, o rock a entrar na sua vida.

Contra todas as expectativas familiares Rita decide fazer desse passatempo a sua profissão. Foi o tempo dos Mutantes e do encontro decisivo com Gilberto Gil e Caetano Veloso a quem Rita Lee agradece por lhe terem mostrado o seu lado brasileiro. É ela mesma quem diz que suas músicas são uma espécie de "boss'n'roll e de rockarnaval". Nos extras desse DVD é imperdível o depoimento de Tom Zé, desbocado como de costume.

O segundo episódio chama-se Baila Comigo e é um olhar sobre a carreira da já consagrada Rita Lee. Vale a pena ver o dueto com João Gilberto, gravado em 1980, ela de vestidinho e sorriso inocente. A maioria dos momentos musicais são de um concerto de 2007 na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Em palco, a cantora de cabelo cor de fogo transforma-se numa versão feminina de Mick Jagger, com a língua de for a, gestos teatrais, som eléctrico. "Quando entro no palco eu perco todos os piriris", assume.

O grande protagonista deste segundo DVD é Roberto de Carvalho, companheiro de Rita Lee desde 1976, na música e na vida. Eles têm três filhos, compõem juntos (Mania de Você é o grande hino de amor do casal) e mostram-se ainda apaixonados - quem disse que o rock não combina com família feliz?

Finalmente, o terceiro DVD tem o título de Cor-de-rosa choque e é completamente dedicado ao "feminino". Até porque, como diz Rita, para cantar rock é preciso tê-los no lugar. Comparando com as imagens de há dez anos dá para ver como Rita Lee está mais velha. Mais gordinha, enrugada, a voz gasta. E ela não tem medo de o assumir. Diz que já não tem paciência para viajar, sobretudo para o estrangeiro. Confessa que chega ao fim dos espectáculos exausta. "Fico um caco velho." Reconhece que já há muito tempo se deixou de loucuras - agora não tem mais drogas, não tem mais noitadas, ela quer mesmo é ficar em casa com os seus animais, suas coisas, suas plantas, sua família.

Rita Lee, 61 anos, não é saudosista ("só tenho saudades do futuro") e tem toda a certeza que, apesar de se ter divertido imenso quando era nova, a vida agora é muito melhor do que antes. Não consegue imaginar-se sem computador e continua a fazer planos para novas músicas. Está a adorar envelhecer. E está verdadeiramente apaixonada pela sua netinha. "Espero que ela mande bala", diz. Se sair à avó babada vai "peitar a vida" com garras e uma guitarra.

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