A carreira do declarado «inimigo público n.º 1» acabou aos 31 anos, sob balas do FBI, à saída de uma sessão de cinema em Chicago. E acabou por durar apenas uns 14 meses, durante os quais só perdia em popularidade para o então presidente dos EUA, Franklin Roosevelt. Dillinger assaltava bancos, sim, mas era também uma espécie de gentleman. Quando fazia reféns para fugir, tratava-os o melhor que podia, nas circunstâncias..Dillinger acabara de ver um filme de gangsters, Manhatttan Melodrama, interpretado por Clark Gable, no qual de algum modo se teria visto ao espelho. «Viver aqui dentro não é vida, morre depressa», dizia Gable para um outro preso. Na plateia, apesar de tão procurado, lá estava Dillinger, sorrindo: o conselho da personagem interpretada por Gable parecer-lhe-ia justo. Dali a muito pouco tempo, à saída do Biograh Theater, terminariam os seus assaltos e a sua vida. Uma das duas mulheres que o acompanhavam, romena ilegal nos EUA, encarregou-se de avisar a polícia de que o célebre assaltante de bancos iria ali. A colaboração de nada lhe valeu: acabou deportada em 1936. .Considerado pelos poderes um mero criminoso e por outros visto como uma espécie de Robin Wood do século XX (roubava os ricos, que eram os bancos, apesar de não distribuir os proventos pelos pobres...), John Herbert Dillinger teve uma agitada carreira de crimes numa América mergulhada em feroz depressão económica. Foram cerca de duas dezenas os bancos visitados por si e pelo seu grupo; e umas duas dezenas de polícias terão sido alvo da sua pontaria. Não distribuía os proventos dos assaltos pelos americanos famintos, mas repartia-os ao tostão com os seus companheiros de gangue..A primeira vez que esteve preso era um miúdo que cometera o erro de assaltar um merceeiro que «até era boa pessoa». Ter-lhe-á pesado tanto na consciência que fazia questão de, nos seus assaltos, rejeitar o dinheiro que os clientes tivessem na mão. Por esse primeiro roubo ao merceeiro, penou nove anos. Acabou por sair em liberdade condicional pouco antes de a pena estar integralmente cumprida. Mas na cadeia também se fazem amizades, e foi lá dentro que Dillinger conheceu os membros do que viria a ser o seu gangue. Aliás, ajudou-os a fugir..Oito semanas depois de ter saído da prisão pela primeira vez, já estava de novo preso. Mas aí, os seus amigos lá de dentro libertaram-no quase na mesma hora. Voltou ainda a ser preso, e a fuga, numa primeira sessão em pleno tribunal, foi também quase instantânea. A eficácia dos assaltos e as fugas bem-sucedidas valeram-lhe uma dedicada perseguição policial e a alcunha de Jackrabbit (Jackcoelho)..Dillinger (1903-1934) assaltava os bancos que os americanos consideravam os grandes responsáveis pela crise vivida por quase toda a gente. As suas operações davam evidentemente boas histórias para os jornais, num tempo em que eram eles, e não as televisões, a fazer a fama de quem, para o bem ou para o mal, se destacava do comum dos mortais..Seria até homem de bom humor. «O que é que lhe tira o sono?», ter-lhe-á perguntado um polícia. Resposta: «O café.» E se a sua morte, à saída do cinema, terminou com aquele jogo do gato e do rato, ajudou a compor a lenda de que ainda hoje goza. O filme de Michael Mann acabado de estrear (Johnny Deep é um Dillinger muito cool) não é, aliás, o primeiro sobre a sua pessoa. John Milius realizou Dillinger em 1973, interpretado por Warren Oats..Filho de John Wilson Dillinger (1864-1943) e da sua primeira mulher Mary Ellen Lancaster (1860-1907), Dillinger perdeu a mãe aos 3 anos. O pai batia-lhe, talvez essa fosse a única forma que conhecia para educar o rebento. Alistou-se na marinha, mas poucos meses depois decidiu desertar. Tinha uma personalidade inconstante, ao que parece. Mas a vida não estava nada fácil. .Roubar era um modo de dar a volta à magreza da carteira. Daí o primeiro assalto à mercearia, o tal de que se arrependeria para sempre e que lhe valeu nove anos de sol aos quadradinhos. Uma vez cá fora, reencontrou os amigos que conhecera lá dentro..Começava a espécie de roleta russa que foram os 14 meses de assaltos a duas dezenas de bancos. Um a um, os seus companheiros foram sendo mortos pela polícia, sempre em acção. Dillinger foi traído e morto pelas costas, o que não abona grande coisa à glória do caçador. .Os assaltos de Dillinger coincidiram no tempo com a implantação do FBI, permitindo que os ilícitos não ficassem circunscritos ao Estado onde eram cometidos e permitindo que fora deles a vida não fosse muito complicada para os criminosos. Edgar Hoover, o mais temido chefe que ao longo de décadas foi rei e senhor daquele organismo, ensaiava nessa altura a sua estratégia de poder. Os Kennedy não lhe escaparam, Hoover sabia tudo o que não era conveniente que se soubesse..Em 2006 o Discovery Channel exibiu o documentário The Dillinger Conspiracy, no qual se sugeriu que o sargento da polícia de Chicago Martin Zarkovich empunhara a arma identificada como a de onde partiu a bala que matou Dillinger. Certo, certo é que três balas o atingiram, e não apenas uma. .Um nome para a cultura pop.John Dillinger não é apenas o assaltante de bancos. Eis algumas apropriações do nome deste lendário criminoso..Dillinger apareceu como personagem na novela Timequake, de Kurt Vonnegut.Existe uma banda de mathcore chamada The Dillinger Escape Plan. Já desaparecida, existiu um outra banda de punk rock que se chamou Dillinger Four. Na canção The Ballad of Danny Bailey do disco Goodbye Yellow Brick Road (1973), Elthon John incluiu o verso «Dillinger's dead» no refrão. .Humphrey Bogart interpretou Duke Mantee no filme The Petrified Forest, uma personagem baseada em Dillinger, com o mesmo corte de cabelo e tipo de roupa. .John Dillinger é uma das principais personagens da série de livros de ficção científica The Illuminatus! Trilogy, de Robert Shea e Robert Anton Wilson..Stephen King escreveu um conto, The Death of Jack Hamilton, incluído na colectânea Everything's Eventual: 14 Dark Tales, em que Dillinger é a personagem principal..Dillinger (um boneco, obviamente) surge como jurado no episódio Treehouse of Horror IV, dos Simpsons.Uma fuga de Dillinger com uma arma falsa foi parodiada por Woody Allen no filme, 1971, Take the Money and Run (a arma derrete com a chuva) .