Foram detectados pela primeira vez em Portugal ovinos com uma forma atípica de scrapie - encefalopatia espongiforme transmissível, que corresponde, nas cabras e ovelhas, à BSE dos bovinos e à Creutzfeldt-Jakob dos seres humanos. Até ontem tinham sido identificados 26 animais infectados com o prião alterado, no âmbito de um rastreio que decorre desde 2002 e já envolveu mais de 30 mil animais..O trabalho, realizado por um grupo de investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) e do Laboratório Nacional de Veterinária (LNV), insere-se no quadro do programa europeu de vigilância da scrapie. Os resultados, que já estão disponíveis online no Journal of General Virology, serão publicados em Novembro na edição em papel..A necessidade deste rastreio mais atento da scrapie a nível europeu tornou-se evidente em 2002, depois de experiências laboratoriais no Reino Unido terem demonstrado que as ovelhas alimentadas com derivados de bovinos infectados com BSE desenvolvem a doença. «Como a BSE e a scrapie se distinguem com dificuldade do ponto de vista clínico, levantou-se então a hipótese de a BSE poder ter passado para os ovinos, já que existe esse risco geográfico», explicou ao DN Pedro Simas, investigador do IGC e um dos autores do trabalho..No Reino Unido, nomeadamente, a utilização comum, entre ovinos e bovinos, de pastos que chegaram a ser adubados com restos de animais infectados (com BSE) poderia ter proporcionado a transmissão da doença bovina para as ovelhas. A ser assim, isso tornaria muito difícil a erradicação da doença, uma vez que a encefalopatia espongiforme se transmite facilmente de ovelha para ovelha. .Desde que o rastreio europeu da scrapie se intensificou, em 2002, não houve até agora, no entanto, nenhuma evidência de que a BSE se tenha transmitido ao gado ovino..Poderia ainda levantar-se a hipótese de esta forma atípica de scrapie ser o resultado da transmissão da BSE para as ovelhas, «mas isso é muito pouco provável, porque analisámos a assinatura molecular de uma e de outra e vimos que são muito diferentes», adianta Pedro Simas, notando que «esta é uma boa notícia para a saúde pública»..A primeira forma atípica de scrapie foi identificada em 1998, na Noruega e, depois disso, também em França e na Alemanha. Chegou agora a vez de Portugal, onde curiosamente nunca foi detectado nenhum caso clássico daquela doença das ovelhas. Esta é, aliás, uma situação para a qual Pedro Simas não tem ainda qualquer explicação, já que a scrapie clássica existe em Espanha..Ao contrário do que acontece na scrapie atípica, os animais infectados com a forma clássica da doença apresentam sinais clínicos da patologia. Além disso, há diferentes zonas do sistema nervoso central dos animais que são afectados, num e noutro caso..A par do rastreio no terreno, que vai continuar, o grupo já iniciou uma nova fase na pesquisa, em colaboração com investigadores alemães, para caracterizar a proteína infecciosa em causa e determinar a sua transmissibilidade. «Mas não haverá resultados antes de três meses», conclui Pedro Simas.