Grupo Wagner critica Moscovo em pleno "inferno" da luta por Bakhmut

Líder dos mercenários queixa-se de não ter recebido as munições prometidas e de o seu representante ter sido travado no quartel-general russo. Zelensky reforça posições na cidade.
Publicado a
Atualizado a

O líder dos mercenários russos do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, voltou a queixar-se de que não está a receber as munições prometidas por Moscovo, avisando que as posições dos seus homens podem ser comprometidas em Bakhmut. As declarações prometem incendiar mais os ânimos com os responsáveis da Defesa russos, numa altura em que a Ucrânia promete não desistir desta cidade na região de Donetsk. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, tomou a decisão de reforçar a presença militar na localidade que se tornou num símbolo, apesar de ter pouca relevância estratégica.

Os combates pela conquista de Bakhmut duram há meses e, na sexta-feira, Prigozhin disse que a cidade estava praticamente cercada - restando apenas uma via de saída para os ucranianos. Mas, já no domingo, o responsável pelo Grupo Wagner avisou que sem as munições prometidas por Moscovo no final de fevereiro, os seus mercenários podem ser obrigados a recuar, deixando as posições militares russas em Bakhmut desprotegidas. "Por enquanto, estamos a tentar descobrir a razão: é apenas uma questão burocrática ou uma traição", indicou no canal de Telegram do seu serviço de imprensa.

Para agravar mais a tensão entre o Grupo Wagner e as chefias militares russas, Prigozhin revelou ontem que um dos seus representantes foi proibido de entrar no quartel-general das forças russas na Ucrânia. "A 5 de março, escrevi uma carta ao comandante do agrupamento da operação militar especial [como os russos apelidam a invasão e a guerra] por causa da necessidade urgente de disponibilizar munições. A 6 de março, às 8.00 da manhã, o meu representante na sede teve o seu passe cancelado e viu-lhe ser negado o acesso", indicou no mesmo Telegram.

Já na semana passada, Prigozhin tinha feito várias críticas ao ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, e ao comandante das Forças Armadas, Valery Guerassimov, acusando-os de traição por se recusarem a fornecer material de combate ao grupo paramilitar. Mas, dias depois, foi aprovado um decreto que ordenou o abastecimento de armas e munições às "forças voluntárias" que combatem na Ucrânia.

Num vídeo divulgado no sábado, mas alegadamente filmado ainda em fevereiro, Prigozhin disse que os seus homens temem estar a ser usados como eventuais bodes expiatórios caso a Rússia perca a guerra na Ucrânia. "Se recuarmos, vamos ficar na história como as pessoas que deram o passo principal para perder a guerra", referiu. O Grupo Wagner nasceu em 2014, o ano em que os russos anexaram ilegalmente a Crimeia e começaram a apoiar os separatistas na região do Donbass, mas atualmente está presente não apenas na Ucrânia mas em vários países africanos.

A situação em Bakhmut não está melhor para o lado ucraniano. O Kyiv Independent publicou ontem testemunhos dos soldados que estão na cidade, com queixas da falta de apoio e de proteção diante dos constantes ataques russos. Os soldados dizem que se trata de uma frente de guerra "trituradora de carne" pelo elevado número de baixas que está a provocar em ambos os lados do conflito. Nem ucranianos nem russos indicaram as baixas que já sofreram na cidade.

No Telegram, o comandante ucraniano Volodymyr Nazarenko, que está em Bakhmut, disse que não recebeu nenhuma ordem para recuar e que "a defesa está a aguentar-se", apesar de em condições extremas. "A situação em Bakhmut e nos arredores é um inferno completo, tal como é em toda a frente no leste", disse num vídeo, citado pela Reuters.

Entretanto, Zelensky prometeu ontem reforçar as defesas na frente de Bakhmut, depois de terem precisamente surgido relatos de que Kiev estaria a recuar. O presidente esteve reunido com os seus comandantes e, segundo o seu conselheiro Mykhaylo Podolyak, "existe um consenso entre os militares da necessidade de continuar a defender a cidade e de desgastar as forças inimigas, enquanto se constroem novas linhas de defesa caso a situação mude". Em declarações à AFP, Podolyak indicou que as forças já cumpriram o objetivo ao esgotar as forças russas e dar a oportunidade aos militares ucranianos para se prepararem para uma contraofensiva".

Segundo a AFP, as forças ucranianas no terreno consideram que a queda da cidade é inevitável e já há unidades que começaram essa retirada. O Instituto para o Estudo da Guerra indicou que a retirada estratégica da cidade já teria começado. "As forças ucranianas estão provavelmente a fazer uma retirada tática limitada de Bakhmut, apesar de ainda ser muito cedo para perceber as intenções ucranianas em relação à retirada completa da cidade", referiu o instituto norte-americano na sua última análise.

susana.f.salvador@dn.pt

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt