Um dia depois de o plano B de Theresa May ter sido apresentado e desmascarado como o plano A, mas com uma atitude dialogante para com os partidos da oposição, a primeira-ministra enfrenta forte oposição no interior do governo. A ministra do Trabalho Amber Rudd advertiu May que dezenas de secretários de Estado e ministros podem demitir-se se os deputados conservadores tiverem disciplina de voto nas emendas que irão a votos na terça-feira no sentido de impedir um Brexit sem acordo.."Amber disse a Downing Street para dar liberdade de voto em nome de muitas pessoas", disse uma fonte ao Times. A ministra argumentou que esta emenda iria fortalecer a posição da governante em Bruxelas e evitar que até um terço dos membros do governo (mais de 130 no total, como pode ver aqui) bata com a porta..As emendas ao plano B de Theresa May podem ser apresentadas até à véspera da votação. Nem todas as emendas vão a votos. A escolha é feita pelo presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow. As emendas selecionadas precisam de apoio de mais de uma bancada, dada a distribuição dos deputados. Por exemplo, a emenda apresentada pelo líder da oposição, Jeremy Corbyn, que prevê como saídas um novo referendo ou uma união aduaneira, precisava de votos favoráveis dos conservadores.,Uma hipótese que, neste momento, não parece provável..Quaisquer alterações aprovadas não são juridicamente vinculativas, mas têm peso político e é tradição que o chefe de governo não as ignore..Fronteira na Irlanda.Em Bruxelas, o porta-voz da Comissão Europeia lembrou que, sem acordo, voltará a existir uma fronteira entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte, apesar do acordo de paz de 1998 prever o contrário. Questionado sobre a posição da UE, Margaritis Schinas disse: "Se quiser que especule sobre o que poderia acontecer num cenário sem acordo na Irlanda, eu acho que é bastante óbvio - existirá uma fronteira física.".A falar na comissão dos assuntos constitucionais, o eurodeputado Guy Verhofstadt disse que o mecanismo de salvaguarda (backstop) não é negociável, mas mostrou abertura a que a declaração política sobre a relação futura possa ser revista e mencionar uma relação mais próxima. Fez estes comentários à luz de, nos próximos dias, o Parlamento Europeu iniciar os procedimentos para ratificar o processo de saída do Reino Unido. "Isto significa que não há renegociação possível para nós sobre o acordo de retirada. Se há renegociação possível, é apenas na declaração política em que nada temos contra uma relação futura mais profunda entre a UE e o Reino Unido", afirmou o belga..A caminho do caos.As perspetivas de uma saída do Reino Unido da União Europeia sem acordo deixam os empresários nervosos. E têm motivos para tal. A Sky News revelou um relatório governamental que prevê uma queda do comércio de mercadorias através do Canal da Mancha entre 75% e 87% nos primeiros seis meses em caso de hard Brexit.."Os franceses vão aplicar pelo menos o mínimo legal de controlos aduaneiros de países terceiros a todos os bens e controlos sanitários e fitossanitários a determinados produtos alimentares e agrícolas. Isto inclui a imposição de controlos de documentos aduaneiros a 100%. Mesmo após o choque inicial, o novo normal para o transporte no canal da Mancha será de 50-100% em relação aos fluxos atuais até que sejam introduzidas alterações significativas para melhorar o regime fronteiriço, como a automatização"..O documento que a Sky News revelou conclui: "Uma parte significativa dos operadores comerciais não está preparada para o D1ND (primeiro dia sem acordo)".."Ao recusar excluir a opção de saída sem acordo, a primeira-ministra está a jogar com o abastecimento do país em medicamentos e comida essencial numa tentativa desesperada de salvar o seu acordo do Brexit", comentou a deputada trabalhista Jo Stevens. Outro colega de bancada, David Lammy, foi mais longe: "A inexistência de acordo será catastrófica para o comércio britânico.".No mesmo dia soube-se de empresas a mudar a sede de local, de outras a refazerem as contas e de companhias aéreas sem saber se poderão continuar as atuais rotas dentro da UE..James Dyson, o empresário que revolucionou os aspiradores com a sua tecnologia sem saco, está a mudar o seu domicílio empresarial e registo fiscal de Inglaterra para Singapura. Uma das mais sonantes vozes a favor do Brexit apostou recentemente na investigação e desenvolvimento de um automóvel elétrico, que irá ser construído na cidade-Estado asiática. A empresa, através do administrador executivo Jim Rowan, assegurou que a mudança não tem relação com o Brexit.."Quando as sedes são transferidas, a propriedade intelectual também são. Traição ao público que confiou nele como uma empresa britânica que defendeu um Brexit sem acordo", escreveu o deputado Sam Gyimah..No mesmo dia a empresa de navegação P&O anunciou que vai registar a frota de navios que opera no canal da Mancha em Chipre - uma mudança carregada de simbolismo, mas sobretudo por razões práticas. "Por motivos operacionais e contabilísticas concluímos que o melhor a fazer é mudar o pavilhão de todos os navios para a bandeira cipriota", disse o porta-voz da empresa..A japonesa Sony confirmou, por sua vez, que vai mudar a sede europeia de Londres para Amesterdão..No setor automóvel, a Bentley, propriedade da Volkswagen, anunciou que o Brexit sem acordo põe em "risco fundamental" os resultados da empresa, que estava a recuperar de uma situação de prejuízo. Além do mais, anunciou que vão constituir stocks de peças importadas e tentar direcionar carros para outros mercados..Richard Harrington, secretário das Empresas e da Estratégia Industrial, disse à BBC4: "Tenho medo do encerramento da Jaguar, do encerramento da Mini, do encerramento da indústria das ciências da vida e de todas as outras coisas." Para o membro do governo, a saída sem acordo seria "um desastre absoluto para o país apoiado por uma minoria de uma minoria de pessoas"..A Jaguar Land Rover (JLR), que tem fábricas em Birmingham e Solihull, e 40 mil trabalhadores no Reino Unido, já anunciou que vai cortar em 4.500 postos de trabalho a nível mundial, mas a maioria no Reino Unido, tendo já convidado os trabalhadores britânicos a candidatarem-se a uma rescisão voluntária..Companhias aéreas têm de mudar estrutura acionista.Por fim, as companhias aéreas com capital maioritário de cidadãos não europeus enfrentam o risco de perder o direito de voar dentro do bloco europeu após o Brexit devido às regras de participação no capital..Embora continuem a poder voar de e para a UE, as licenças de exploração para voar entre destinos no interior da União Europeia estão reservadas às companhias aéreas maioritariamente detidas e controladas por cidadãos da UE, do Espaço Económico Europeu ou da Suíça. A EasyJet, a Ryanair - que tem sede na Irlanda, mas 54% dos acionistas não são da UE - e a IAG, proprietária da British Airways, estão entre as companhias aéreas que terão de alterar o capital social se quiserem continuar a explorar as atuais rotas.