GNR não assume atropelamento mortal

Publicado a
Atualizado a

Lamego. Realiza-se hoje o funeral de José Santos, o homem de 51 anos que foi mortalmente atropelado no sábado à noite, alegadamente por um militar da GNR. A viúva queixa-se de falta de acompanhamento da Guarda - que não vai assumir o acidente, esperando pela decisão dos tribunais

Vítima pode ter sido atropelada duas vezes

A Guarda Nacional Republicana (GNR) não vai assumir a responsabilidade no atropelamento mortal em que esteve envolvida uma viatura da corporação, cujo seguro é feito pelo próprio Estado. "Não é possível assumir a responsabilidade deste lamentável acidente. Será o tribunal a decidir e a GNR cumprirá", disse ao DN o tenente-coronel Costa Lima, porta-voz da corporação. A GNR abriu entretanto um processo disciplinar ao militar envolvido para apurar "porque não disse que foi o interveniente neste acidente".

A investigação do acidente, ocorrido no sábado à noite na EN226, junto a Rossas, no concelho de Lamego, prossegue a cargo da própria GNR que aventa a hipótese de o peão poder ter sido atropelado duas vezes, versão que é afastada pelos socorristas que apontam a velocidade "elevada" a que seguia o carro da corporação. O corpo de José Santos, de 51 anos, foi ontem autopsiado em Vila Real e é sepultado hoje ao final da tarde, mas a viúva não tem dinheiro para pagar o funeral.

O acidente ocorreu na EN226, junto a Rossas numa recta bem iluminada e com limitação de velocidade. José Santos "saía de um café e caminhava na berma da estrada, cerca das 23.00, quando foi atropelado de forma brutal pela GNR", conta José Marco, genro da vítima.

O militar, que estava em serviço, encobriu o acidente e só a intervenção da equipa de investigação da BT levou à sua descoberta e posterior confissão. De acordo com o porta-voz da GNR a viatura descaracterizada da corporação "estava envolvida numa operação. O agente recebeu uma ordem para ir buscar um outro militar com quem se juntaria numa acção regular já planeada", adianta o porta-voz. Segundo Costa Lima "o soldado parou, prestou socorros e esperou pelas autoridades" mas quando os bombeiros chegaram ao local "só lá estavam a GNR e vários populares", recorda um dos socorristas do INEM.

Segundo esta fonte "o homem [José Santos] ainda estava vivo e apenas pedia que lhe tirássemos os ténis. Sofreu um embate bastante violento e apresentava fracturas na bacia, costelas e uma exposta no membro inferior esquerdo. Para ter estes danos o carro da GNR devia ir a grande velocidade. Morreu à entrada do Hospital de Vila Real onde foi confirmado o óbito".

Não é possível conhecer a velocidade a que seguia o carro da GNR. "Não existe forma de, a posteriori, apurar com certeza a que velocidade seguia o carro", assevera o oficial.

Um dos agentes ligados à investigação suspeita que a vítima, "pelos vestígios encontrados na roupa", tenha sido "atropelada duas vezes" mas haverá certeza "com o resultado da autópsia". A tese é contrariada pelo socorrista: "para isso suceder teria que haver esmagamento de ossos, o que não foi o caso".

O apuramento das responsabilidades cabe ao Ministério Público (MP) que já abriu um processo-crime e constituiu o soldado da GNR, um indivíduo de 48 anos colocado em Lamego, como arguido e sujeito a termo de identidade e residência.

Entretanto a Guarda iniciou "um processo disciplinar para apurar porque razão o militar não disse que tinha sido o interveniente num acidente", afirmou o porta-voz da GNR.

Por esclarecer continua a responsabilidade cível no acidente. A grande maioria das viaturas do Estado estão isentas de seguro (ver caixa) e nesses casos compete à entidade proprietária da viatura a assunção das responsabilidades e a regulação do sinistro. Mas a GNR assegura que "não é possível assumir qualquer despesa até que o tribunal decida". Segundo Costa Lima "só o inquérito determinará se o dolo ou o dano por negligência foi provocado pelo carro da GNR ou se determinado por causas externas", disse sem especificar.

Ao DN a viúva garante que não foi contactada pelaGNR "para saber se precisava do que quer que fosse". Isabel Santos adianta que no domingo foi observada por uma psicóloga no quartel da GNR de Lamego e apenas lhe disseram para não se preocupar com o corpo "que eles depois diriam quando o poderia ir buscar".

A viúva lamenta a perda do marido, que "era o único sustento da casa. Tenho um filho menor e um outro deficiente e nem sei como vou fazer para cuidar deles. Nem para pagar o funeral tenho dinheiro. Houve uma vizinha que se disponibilizou e se não fosse ela nem podia enterrar o meu homem!"|

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt