Entrevista a António Fagundes (actor): "Uma telenovela não é feita para enganar o povo"

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Regressou às telenovelas após quatro anos de afastamento, em que se dedicou a séries e ao cinema. Sentiu que precisava de "mudar de ares"?

Foram cinco anos a fazer a série Carga Pesada. Não foi bem para mudar de ares, mas para levar à frente a série, a qual gosto muito e que completa 30 anos em 2008. É bom lembrar que nesse período fiz alguns filmes e actuei no teatro, inclusive em Portugal.

O que o levou a aceitar o papel de Juvenal Antena, em Duas Caras?

A equipa é muito boa e o texto é excelente. Jamais poderia recusar. Acho que o personagem começou muito bem e está a agradar ao público, pois é bem forte.

Como é que se preparou para este personagem? Foi a favelas para conhecer esta realidade?

Não procurei ninguém, nem fiz "laboratório". Tenho a minha própria maneira de estudar um personagem e não acho que ir ao local ou "fazer laboratório" seja essencial. Se assim fosse, ninguém poderia fazer um papel de suicida ou de um personagem histórico.

Está a ser visto pelo público como um personagem de destaque...

O personagem, como a telenovela, ainda está em formação. Só no fim é que se pode dizer se o personagem foi tão bom assim. Mas prefiro que isso parta do público e dos críticos, não de mim.

Contracenar com uma jornalista como Marília Gabriela é uma experiência diferente?

Marília é excelente. É minha amiga há 30 anos e uma grande pessoa. É fácil trabalhar com uma pessoa como ela. Talvez nem ela soubesse que seria tão boa actriz. O facto de ser muito culta e muito interessada pela cultura certamente que facilita o seu trabalho nos palcos e nas telenovelas.

Acha que Marília Gabriela é melhor actriz ou jornalista?

Acho que ela desenvolve as suas qualidades igualmente bem como actriz e como jornalista. É uma grande mulher.

O que distingue Aguinaldo Silva dos outros autores?

Aguinaldo está chegando ao auge, como autor. Cada escritor tem o seu estilo. Eu trabalho com vários e sou amigo de muitos. Aguinaldo está a sedimentar o seu conhecimento, está realmente muito bem e com o trabalho em Duas Caras vai crescer mais, pois a resposta do público engrandece actores e o autor.

O que é uma telenovela para si: boa literatura ou ópio do povo?

Se alguém pensa que telenovela é feita para enganar o povo, está errado. No Brasil, as telenovelas ganharam um sentido social muito forte e não há quem possa negá-lo. Em Duas Caras temos a discussão de questões como racismo, homossexualidade, drogas e um debate diário sobre como é viver num local marginalizado, que é a favela. Acho que isso dá à telenovela um estatuto de boa literatura, de algo que mexe com preconceitos e agita toda a sociedade. As telenovelas têm sido muito positivas para fazer com que o povo se interesse por temas importantes.

Qual é o seu melhor trabalho?

Sobre o meu melhor trabalho, deixo a escolha para os críticos... quando eu morrer. Só posso dizer que vejo o trabalho de forma global: tanto faz ser telenovela, minissérie, peça de teatro ou uma participação no cinema. Não vejo um segmento predominar sobre qualquer outro.

Como vê o Brasil?

Para falar sobre o Brasil teria de ficar um mês a pensar e a expor as minhas posições, tal a força e os contrastes do país. Mas o que posso adiantar é que sou optimista em relação ao Brasil.

Num momento de guerras, aquecimento global e outros problemas, o que mais o aflige?

O que mais me preocupa é a má distribuição de rendimentos, não só no Brasil, mas por todo o mundo.| Com RITA BRAVO

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