O Governo ficou "completamente" surpreendido com o pedido de demissão do presidente da ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, Jorge Vasconcelos, apresentada ontem. .Contactado pelo DN, o ministro da Economia, Manuel Pinho, remeteu para o director-geral de Energia. Em declarações ao DN, Miguel Barreto disse que "foi uma verdadeira surpresa a atitude do presidente da ERSE, neste momento". O responsável sublinha que "nunca houve divergências entre e o Governo e o presidente daquela entidade relati- vamente a qualquer assunto" e, acrescentou, "se o Eng.º Jorge Vasconcelos não estava de acordo com a interferência do Governo na questão das tarifas eléctricas propostas pela ERSE para o próximo ano, então faria mais sentido ter-se demitido há dois meses, e não deveria ter feito a proposta agora apresentada"..Ontem, em comunicado, Jorge Vasconcelos considerou que a legislação que travou a subida das tarifas "representa uma ruptura com a prática e evolução legislativa dos últimos 11 anos (...) e significa, do meu ponto de vista, o fim da regulação independente do sector eléctrico português". O presidente demissionário, que promete mais esclarecimento no Parlamento na terça-feira, considera que a medida do Governo não é sustentada em qualquer lógica económica do sector e, realça, o défice tarifário criado em 2007 (mais de 800 milhões de euros) que irá ser pago a partir de 2008 por todos os consumidores de baixa tensão, "distorcendo o funcionamento do mercado (...) com prejuízo para os consumidores e empresas"..Também a vice-presidente da ERSE, Margarida Corrêa de Aguiar, manifestou à Lusa, a surpresa pela demissão de Vasconcelos, sublinhando a "sua grande inconsistência". "Se não concordava porque não se manifestou antes?" Jorge Vasconcelos conhecia a nova legislação desde que foi aprovada em Novembro e coordenou a proposta apresentada na semana passada ao Conselho Tarifário, a quem pediu celeridade no parecer. No entanto, ontem, soube o DN, votou contra a decisão final sobre as tarifas, que era muito próxima à que tinha proposto. .O presidente da ERSE nunca terá mostrado publicamente discordância com as medidas legislativas e na sessão dos 10 anos da ERSE, a 4 de Dezembro, quando questionado pelos jornalistas considerou normais divergências entre regulador e agentes, tendo realçado que se se tivesse sentido desautorizado teria "tirado as devidas consequências", o que acabou por fazer 10 dias depois..Para algumas fontes contactadas pelo DN, uma explicação possível para esta mudança de atitude poderá ter sido a perda do cargo de secretário-geral da poderosa Agência Internacional de Energia (AIE). Segundo o Diário Económico, a candidatura de Vasconcelos era apoiada desde Maio por membros da AIE, mas terá ficado comprometida de forma irremediável pelo alegado atraso do Governo em formalizar o processo, embora este defenda que ainda havia possibilidades. Só na quarta-feira pas- sada terá ficado claro que o cargo iria para outro, adiantou fonte governamental. .O Ministério da Economia conclui que "chegando ao fim do actual mandato dentro de semanas [31 de Janeiro] e não podendo ser reconduzido no cargo por razões estatutárias, o presidente da ERSE entendeu apresentar a sua demissão". O Governo explica que aprovou as normas regulamentares, que já foram promulgadas, com vista a amortecer o aumento das tarifas para o próximo ano. Para o presidente da ERSE, teria sido possível ao Governo reduzir os custos de natureza política (como apoios às renováveis e rendas aos municípios) que oneram as tarifas, mas, diz, a opção não foi essa, mas sim impor um limite administrativo. .O Executivo explica que "está a preparar todas as medidas necessárias a limitar o aumento dos custos que oneram a tarifa", para assegurar "uma contenção sustentada da evolução tarifária nos próximos anos". Entre estas medidas está o fim dos CAE (contratos de aquisição de energia) e a revisão dos apoios via tarifa à co-geração (um dos custos que mais têm crescido). Mas estas alterações demoram mais tempo.