De Almada para Hollywood

Nasceu em Lisboa, mas foi na Margem Sul que Tony Lima viveu até à altura em que partiu para Los Angeles. Hoje é actor e, há dois anos, criou a Lima Entreprises, empresa de aluguer de limusinas. Diz que vive no paraíso!<br />
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O cinema sempre o fascinou e era raro o domingo em que não assistia aos filmes que passavam na Academia Almadense. Achava piada e tentava imaginar como tudo aquilo era feito, como se punham as pessoas a chorar e a rir e a movimentar-se de determinada maneira. Mas sentado nas cadeiras de «suma-pau» do velho teatro, o jovem António Manuel estava muito longe de imaginar que um dia usaria o nome artístico de Tony Lima, passaria para os bastidores da indústria cinematográfica de Hollywood e que tomaria contacto com a arte e magia que tanto lhe aguçava a curiosidade.


O então estudante do Externato Frei Luís de Sousa, em Almada – onde foi entrevistado pela NS’– ainda nem havia posto os olhos no actor por quem acabou por nutrir especial admiração e com quem, anos depois, viveu um dos momentos mais intensos da sua vida. «Marlon Brando gostava de comida indiana e eu também. No dia 3 de Janeiro de 2000 encontrámo-nos num restaurante. Ainda não o tinha visto, quando o meu manager me disse que ele estava atrás de mim. Pensei que estava a brincar e respondi que sim, que eu também era a rainha de Inglaterra. Mas depois ouvi aquela voz inconfundível e, no final, quando já não se encontrava mais ninguém no restaurante fui cumprimentá-lo. Ele foi muito simpático, quis saber o que eu estava a fazer e disse-me: se tens um sonho, deves segui-lo.»

Tony tremeu que nem varas verdes quando apertou a mão a Marlon Brando e ainda hoje as palavras daquele ícone do cinema americano, falecido em 2004, ressoam na sua mente. «Nunca mais esqueci esse momento!»

Não foi, contudo, um sonho que levou Tony Lima a terras norte-americanas, aos 18 anos, mas sim o desejo de visitar familiares e de conhecer uma nova realidade. Na bagagem levava um visto para noventa dias e o seu inseparável quimono de judo. Foi exactamente essa peça de equipamento daquela arte marcial que acabou por ditar-lhe o futuro. «Dei aulas no externato e representei o Judo Clube do Estoril durante vários anos, nunca me separava do quimono», conta, orgulhoso do seu passado.


Chegado a Long Beach, Los Angeles, Tony Lima não descansou enquanto não arranjou um local para treinar e, passado um tempo, foi convidado para representar o colégio onde se praticava a modalidade. Aceitou, entregou-se de corpo e alma à sua missão e acabou por ganhar os campeonatos abertos de Los Angeles. O feito, a perseverança com que se entregou ao trabalho e os resultados conseguidos chamaram a atenção de quem lhe estendeu a mão e depressa foi tratada toda a papelada que lhe garantiu a residência americana e o caminho até ao mundo do cinema.


Enquanto vivia na casa dos familiares, Tony Lima lavou pratos e conduziu monta-cargas em armazéns, entre vários outros trabalhos. Continuou a dar aulas de judo numa cidade chamada Chino, onde residem muitos portugueses, e treinou atletas que se classificaram sempre muito bem. Um dia apareceu no local de treino um indivíduo ligado aos Estúdios Paramount que enalteceu as suas qualidades judocas e lhe perguntou se alguma vez tinha pensado em ser duplo de cinema. Os dados estavam lançados.


O sonho que Tony Lima então alimentava era ingressar no Instituto de Educação Física, mas aquela proposta, lembra, «ficou a morder-me um bocadinho e, entre ser duplo e saber se realmente tinha algum talento para o cinema, resolvi tentar a segunda hipótese». Falou com algumas pessoas de Los Angeles, «onde se centra a indústria cinematográfica mais forte do mundo a seguir à indiana», e foi então que ouviu falar em The Beverly Hills Playhouse – uma das mais respeitadas escolas de actores, criada pelo prestigiado realizador e professor Milton Katselas, onde estudaram Gene Hackman, George Clooney e Alec Baldwin, entre outras estrelas.


Preparou uma cena do filme Um Eléctrico Chamado Desejo e um monólogo de Arthur Miller. Foi aceite. Ficou dois a três meses na classe intermédia e depois estudou durante quatro anos na classe avançada. E não se tornou duplo: «O único duplo que fiz foi de mim próprio, Only the Strong, de Sheldon Lettich e em The Sons of Trinity (Filhos de Trinitá), de Enzo Barboni.» É que Tony Lima tem no seu currículo outras habilidades: sabe andar a cavalo, é condutor de precisão de automóveis e motos, é bom nadador e jogador de ténis, bilhar e futebol. E os realizadores «gostam de não ter de recorrer a duplos, porque assim podem fazer planos de aproximação».

O lançamento de Tony Lima como actor, logo que terminou o curso, foi na telenovela Days of Our Lives que já passa no Estados Unidos há mais de quarenta anos. Integrou o elenco durante cinco anos, protagonizando o papel de rebelde. Embora não aprecie muito o trabalho de telenovela, o actor reconhece que é uma das melhores escolas: «Recebe-se o guião quase no dia anterior às filmagens e temos de fazer tudo.»


Foi, porém, em 1993, que Tony Lima deu o salto para outro patamar de representação  quando ganhou o prémio de melhor actor de teatro em Los Angeles, atribuído pela Southern California Theatre Association, com a peça The Monkey’s Paw. Assinou com uma agência mais forte e os trabalhos começaram a aparecer. Tem participado em muitas produções norte-americanas e europeias e, em Portugal, também já entrou em filmes realizados por Paulo Rocha, Carlos Silva e Jorge Paixão Martins. E claro que gostava de filmar com Manoel de Oliveira, partilhando o objectivo com Dustin Hoffman, «que recentemente confessou esse desejo a uma revista americana», lembra.

 Papéis em telenovelas e séries televisivas também não têm faltado ao actor: Lusitana Paixão, Nunca Digas Nunca, Espírito da Lei, Sociedade Anónima, Polícias e Roseira Brava, entre outras.


Em cena já se cruzou com nomes como Dwayne Johnson e Cristopher Walken (de quem salienta a cena da roleta russa no filme O Caçador, que muito o impressionou).


A vida de Tony Lima em Los Angeles não se resume, contudo, à arte de representar. Além da sua paixão pelas motos Harley-Davidson  e por carros, o actor criou, há dois anos, uma empresa de limusinas, a Lima Entreprises. O negócio está a correr às mil maravilhas, diz, tanto mais que a empresa já adquiriu um avião: «Bruce Willis disse um dia que estava farto de aviões comerciais e que era bom existir essa alternativa em Los Angeles, a empresa achou a ideia interessante e comprou um.»


Surf em Malibu

António Manuel Contreiras Vilhena de Rosa Lima, 49 anos, solteiro e sem filhos, gosta de vir a Portugal visitar o pai e os amigos, mas a sua casa é em Los Angeles: «É tudo muito prático, calmo, tenho tudo à mão. Se existisse um paraíso na terra, o meu seria lá. Estou no meio da indústria cinematográfica, faço surf em Malibu, esqui numa estância a pouco mais de uma hora e posso andar de moto 360 dias por ano.»


Portugueses no cinema americano

O nome mais sonante daqueles que singraram no cinema americano é o de Joaquim Almeida. Seguem-se os de Maria de Medeiros e de Daniela Ruah. O jovem actor Diogo Morgado foi recentemente escolhido para entrar no elenco da longa-metragem Mary Mother of Christ. Porém, muito antes, quando o cinema ainda era mudo, Eduardo Lozano Guedes, nascido em Luanda em 1897, filho de pai português e de mãe espanhola,  tentou a sua sorte. Tony d’Algy (nome artístico) contracenou com Rudolfo Valentino, em Monsieur Beaucaire (1924). Em Portugal participou em O Leão da Estrela e Fado, História de uma Cantadeira.
Também o madeirense Virgílio Teixeira marcou presença em Hollywood. Entre as décadas de cinquenta e sessenta, contracenou com Yul Brynner em O Regresso dos Sete Magníficos e entrou em A Queda do Império Romano, entre outros filmes.
Victor Nuno Botelho (Tyler Bowe) é o nome de um açoriano que começou a dar nas vistas na série televisiva Fama e depois disso teve participações em A Praia da China, Murphy Brown e Os Homens do Presidente, entre outras. Nascido em São Miguel, Botelho juntou-se aos pais que haviam emigrado para Fall River e um dia decidiu rumar à meca do cinema.
Recorde-se ainda Nuno Salvação Barreto, membro dos Forcados Amadores de Lisboa, contratado em 1951 pela MGM para fazer a pega a um touro no épico Quo Vadis, e o lutador Tarzan Taborda, que teve uma pequena participação no papel de um soldado americano no filme sobre o desembarque na Normandia O Dia Mais Longo, de 1962.

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