No contexto de uma suspeita de abuso sexual, a entrevista à criança pode e deve ser complementada com estratégias facilitadoras de comunicação, como a atividade lúdica ou o desenho, especialmente úteis com crianças mais novas que sentem maiores dificuldades em expressar-se verbalmente..Pensando em concreto nos desenhos, será que existem desenhos típicos das situações de abuso sexual?.Sabemos que o desenho é uma forma privilegiada de aceder ao mundo interno da criança, facilitando a expressão dos seus pensamentos, emoções, desejos e receios. Os desenhos podem ainda encorajar a verbalização de experiências traumáticas, criando algum distanciamento que é sentido como protetor..Apesar da importância desta estratégia projetiva, a sua subjetividade é inquestionável. Os desenhos das crianças são difíceis de codificar e, por esse motivo, recomenda-se muita prudência na sua interpretação, tendo em conta que não existem protocolos de aplicação estandardizados, nem sistemas de codificação que possam garantir confiança e validade dos resultados. Ao mesmo tempo, existe uma margem de erro importante e os resultados ou interpretações não podem ser generalizados. Por outro lado, o desenho depende de variáveis individuais da criança (p. ex., idade, competências gráficas, motivação), bem como de outros aspetos relacionados com questões sociais e culturais..Não obstante estas limitações, persiste a ideia de que será possível identificar indicadores gráficos de abuso sexual nos desenhos de crianças vítimas de abuso sexual (p. ex., a representação dos órgãos genitais nas figuras humanas desenhadas, o predomínio da cor preta). No entanto, a investigação conclui que estes mesmos indicadores também surgem nos desenhos de crianças que não foram sexualmente abusadas, o que remete para a enorme variabilidade que os desenhos podem assumir..Neste contexto, os desenhos devem ser devidamente contextualizados, não apenas com a narrativa que a criança faz sobre os mesmos (p. ex., "conta-me a história do teu desenho", "diz-me o que significa", "o que está a acontecer?"), como também com a restante informação de que o psicólogo dispõe. Por outro lado, um desenho não pode ser interpretado de uma forma isolada. É importante conhecer outros desenhos da criança que tenham sido realizados noutros contextos, por forma a ter-se uma visão mais global..Neste sentido, é preciso alguma cautela, não apenas nas interpretações que se fazem dos desenhos infantis, como também com o peso que se atribui às mesmas aquando das conclusões ou pareceres no âmbito de uma suspeita de violência sexual, sendo certo que análises simplistas de desenhos constituem um perigo de falsos positivos e podem comprometer os interesses daquela criança em concreto, mas também de um suspeito que pode ser inocente..Conclusão a reter: não é possível determinar a existência de uma situação de abuso sexual a partir de um desenho infantil e é muito perigoso assumir-se o contrário..Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal