O chefe da diplomacia chinês, Qin Gang, não viajou até Jacarta para participar na reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) por estar "doente". Coube por isso ao seu antecessor no cargo Wang Yi, principal diplomata do Partido Comunista Chinês, assistir ao encontro e, pela segunda vez no espaço de um mês, reunir à margem com o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken..Foi um diálogo "sincero e construtivo" que surge em plena polémica com o facto de alegados piratas informáticas (hackers) chineses terem entrado em emails governamentais dos EUA e depois da cimeira da NATO, onde os Aliados voltaram a usar linguagem forte contra a China - para desagrado de Pequim, que também criticou a presença no encontro em Vílnius, na Lituânia, do Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia.."As ambições declaradas e políticas coercivas da República Popular da China desafiam os nossos interesses, segurança e valores", dizia o comunicado da cimeira da NATO, Pequim apressou-se a reagir, acusando a Aliança Atlântica de distorcer a posição da China e tentar deliberadamente desacreditar o país. "Opomo-nos firmemente ao movimento da NATO para leste na região da Ásia-Pacífico e qualquer ação que ponha em causa os direitos e interesses legítimos da China será objeto de uma resposta resoluta", afirmou a delegação chinesa junto da UE..O documento adotado pelos 31 países em Vílnius lembrava ainda que Pequim "usa uma ampla gama de ferramentas políticas, económicas e militares para aumentar a sua presença global e projetar poder, enquanto permanece opaca sobre sua estratégia, intenções e reforço militar", citando por exemplo as operações híbridas ou cibernéticas que "visam os aliados e prejudicam a segurança da Aliança"..Isto numa altura em que a Microsoft denunciou que piratas informáticos a operar da China violaram as contas de correio eletrónico de pelo menos 25 organizações, incluindo agências do governo norte-americano - incluindo dentro do Departamento de Estado. .Ontem, na reunião com Wang Yi, Blinken "deixou claro que qualquer ação contra o governo americano, empresas americanas, cidadãos americanos, é uma grande preocupação para nós e que tomaremos as medidas necessárias para que os responsáveis prestem contas disso", segundo relatou um responsável norte-americano sob anonimato, citado pela AFP. Contudo, Blinken não terá acusado diretamente a China de envolvimento..O secretário de Estado também apelou ao restabelecer "com urgência" os canais de comunicação ao nível militar entre os dois países. "É da nossa responsabilidade manter abertos os nossos canais de comunicação, incluindo entre os nossos dois exércitos, e penso ser urgente que o façamos", sublinhou Blinken, segundo o mesmo responsável. Do lado chinês, de acordo com a agência de notícias Xinhua, Wang Yi defendeu que "os EUA devem empreender ações concretas para levar as relações China-EUA de volta ao caminho correto", apelando à adoção de "uma atitude racional e pragmática" para trabalhar com Pequim..O encontro de ontem faz parte dos esforços de Washington e Pequim de manterem aberto um diálogo para "gerir de forma responsável a concorrência" entre as duas maiores economias mundiais. Veio depois da visita da secretária do Tesouro norte-americana, Janet Yellen, a Pequim, e antes da visita do enviado especial para o Clima, John Kerry, à China. Mas os encontros que têm servido para aliviar a tensão têm sido seguidos de declarações que voltam a acender os ânimos. Depois de Blinken ter estado em Pequim, onde reuniu com o presidente chinês, Xi Jinping, além de Qin Qang e Wang Yi, o presidente norte-americano, Joe Biden, comparou o homólogo a "ditadores", num jantar de angariação de fundos para a campanha..Enquanto isso, Pequim reforça os laços com Moscovo, estando prevista "nos próximos meses" uma visita do presidente russo, Vladimir Putin, à China. "A China e a Rússia apoiam-se mutuamente de forma firme para garantir interesses legítimos, continuar o caminho de uma convivência harmoniosa e um desenvolvimento benéfico para ambos", disse ontem o diplomata chinês, que também se reuniu com o chefe da diplomacia russo, Sergei Lavrov. "Temos cada vez mais pontos de interesse e planos de convergência, por isso vejo com otimismo o desenvolvimento futuro", afirmou este último..Hoje será a vez de o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, reunir com Wang Yi, prometendo discutir as preocupações de Pequim sobre a expansão da NATO. Entretanto, Pequim e os dez países da ASEAN concordaram concertar nos próximos três anos um pacto de não-agressão, com o objetivo de impedir que as frequentes disputas territoriais no Mar do Sul da China resultem num conflito armado, segundo um diplomata envolvido nas negociações citado pela AP..susana.f.salvador@dn.pt