Brasil. Civis e militares perante as prioridades
Desde a conclusão das eleições presidenciais, em novembro de 2022, diversas pequenas manifestações de militantes ou simpatizantes do populismo de direita têm tido lugar nas imediações de alguns quarteis, pedindo intervenção militar que anularia o processo ou alteraria o resultado. Sem sucesso nem a nível de captação de simpatias locais e muito menos a nível da hierarquia de topo, onde o nome avançado para ministro da Defesa tem larga aceitação, inclusive com elogio da parte do atual vice-presidente, general Hamilton Mourão, senador eleito para o próximo mandato.
A intervenção das forças armadas na história política brasileira tem sido constante, com exceção das últimas décadas marcadas por postura profissional. A partir da campanha que elegeu Jair Bolsonaro emergiram grupos civis pedindo nas ruas golpe militar e notou-se participação direta de oficiais de reserva tanto nas campanhas como no exercício posterior de cargos oficiais. Se estes oficiais têm simpatias no pessoal da ativa isso tem ficado num grau muito discreto como, aliás, sucede em muitas faixas da população civil que preferem manter silêncio sobre suas opções eleitorais.
No processo eleitoral, o exército efetuou uma missão de verificação eletrônica sobre a confiabilidade das urnas, concluindo não ter constatado qualquer anormalidade. Esta conclusão deu lugar, depois, a declaração proveniente do ministério da Defesa relativizando o alcance do documento, no que pode ter sido motivado tanto por protestos bolsonaristas como remetendo à justiça eleitoral a condição de única legalmente habilitada a conclusões definitivas.
Uma missão destas representava vários riscos desnecessários à instituição, a menos que a se tratasse de teste prático à operacionalidade e capacidade das unidades de guerra de narrativas e ciberguerra.
Mas a participação política militar ou militarizada vem de muito longe, de tal forma que as batalhas de Guararapes, no século XVII, são apontadas como a origem do exército brasileiro. Não é o melhor símbolo, na medida em que foram combates entre potências coloniais e comando direto por mercadores de escravos. As duas potências coloniais em disputa pelo açúcar de Pernambuco mobilizaram efetivos locais sob comando "metropolitano", ou seja, grande parte das tropas de ambos os lados eram ameríndias, negras e mestiças mas a chefia mantinha-se europeia.
Do lado português foram citados nomes de brancos em funções de comando e unidades ameríndias e negras como supletivos. Este ponto tem sido apresentado como prova de não racialização e os nomes de Felipe Camarão e Henrique Dias citados como comandantes. Estes, na verdade, comandavam forças de emboscada e apoio nas duas batalhas do morro dos Guararapes, situado no atual município de Jaboatão dos Guararapes, zona metropolitana de Recife, em abril de 1648 e fevereiro de 1649. Combates inseridos numa guerra mista - guerrilha e clássica - desencadeada pelos portugueses contra a ocupação holandesa de Pernambuco, representando momentos de grande aproximação de Recife, ponto estratégico para os dois impérios coloniais e para todo o Atlântico Sul, politicamente em formação.
Tal formação tinha como eixo central a movimentação de escravos e, quando ocorreram os confrontos de Guararapes já Portugal tinha restaurado sua independência, após 60 anos sob coroa espanhola e também tinha recuperado, meses antes, o maior centro exportador de escravos, Angola, com uma armada constituída no Rio de Janeiro. O interesse pela escravatura era evidenciado em ambos os casos pela própria atividade dos comandantes de ambas as operações: João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros em Pernambuco, Salvador Correia de Sá e Benevides no Rio de Janeiro, ambos em seguida nomeados governadores de Angola, abrindo o período de mais intensa captura e exportação de escravos.
A saída dos holandeses do Recife só se produziu em 1654, na base de acordo costurado na Europa. Evaldo Cabral de Mello no seu livro "O Negócio do Brasil", com base em documentos da Torre do Tombo (Lisboa) descreve o acordo no qual a monarquia portuguesa pagou em ouro a retirada holandesa. Este pagamento é efetivamente um negócio até porque reverteu, em larga maioria, para uma empresa - a Companhia da Índias Orientais, com sede em Amesterdão - sendo lucrativo pelo valor aurífero em si e porque a presença holandesa no nordeste brasileiro era custosa, devido à guerra eficaz movida pelos portugueses e suas forças locais, com excelente logística a partir da Bahia além de que, se os portugueses falhassem, era provável uma intervenção inglesa.
Após o restabelecimento da presença portuguesa, os comandantes brancos passaram (ou voltaram) a exercer suas funções político-empresariais com o perfil referido, Henrique Dias foi nomeado "governador dos pretos", cargo cuja designação é bem explicita e não implica nenhum poder efetivo, a não ser atividade de ligação, eventualmente moderadora, dentro do regime escravista. De Felipe Camarão quase não se ouviu mais falar.
As forças militares mobilizadas em Pernambuco, incluindo o aparelho logístico da Bahia, e as do Rio de Janeiro, com os prolongamentos nos dois séculos seguintes constituem a base das forças armadas coloniais, comandadas por metropolitanos e sujeitas à ação dos governadores e vice-reis. Dentro dessas forças cresceram sentimentos de nacionalidade brasileira como exemplifica a conspiração mineira de 1789 onde se destacou o alferes Tiradentes, enforcado por isso.
Ainda como dado das lutas inter-coloniais, a Inglaterra, Holanda e França estabeleceram-se nas Guianas, norte da Amazônia. A presença francesa seria contestada militarmente pelo poder português durante a instalação de D. João VI no Brasil, em parte porque os limites dessa presença estavam mal definidos desde o período que abrangeu os confrontos pernambucanos, mas principalmente como retaliação pela ocupação de Portugal pelas tropas e administração napoleónica. Foi um dos objetivos estratégicos de D. João VI, conforme assinala o relato histórico do exército brasileiro no seu site, informando que a ofensiva contra a Guiana francesa "foi constituída, basicamente, por brasileiros, tendo porém, em suas fileiras, oficiais ingleses e portugueses, bem como algumas praças daquelas nacionalidades" (site consultado em 06.12.2022)
Por essa razão e pelo papel da Inglaterra na guerra napoleônica, inclusive poder político direto em Portugal, esta bem sucedida operação foi luso-britânica com mobilização de efetivos locais. Caiena foi conquistada em 1809 tendo a componente naval assumido grande dimensão no resultado. Embora o território da atual Guiana francesa tenha sido devolvido na sequência do Congresso de Viena, a operação teve um valor central: garantiu a fixação da fronteira do Brasil no Oiapoque e a grande envergadura amazônica do país.
Guararapes e Caiena/Oiapoque tiveram função semelhante no desenho territorial brasileiro. Os desenhos político e cultural têm outros fatores, atores, autores. Porém, ao longo deste período desenvolveram-se também forças armadas civis coloniais e de perfil terrorista: os "bandeirantes" e os capitães de mato, ambos de grande brutalidade contra as populações dominadas do Brasil, sobretudo ameríndios e negros.
Os "bandeirantes" ganharam elogios históricos enormes como personalidades ilustres que expandiram as fronteiras brasileiras. Na verdade eram unidades que abriam caminho à presença colonial fazendo limpeza étnica e vários dos seus chefes elogiados por certa História oficial eram, sob qualquer lei, criminosos de delito comum. Os capitães de mato são, na verdade prolongamento dessa tradição colonial, especializados na captura de escravos fugitivos, fenômeno comum em todas as Américas e principal forma de resistência entre os escravizados. No Brasil, as fugas deram lugar a numerosos quilombos, expressão angolana que pode ser traduzida por acampamento, em certos casos com perfil de auto-defesa. O mais conhecido foi Palmares e dois de seus líderes são figuras históricas nacionais. A importância decorreu da grande atratividade e de funcionar como "muito mau" exemplo para a sociedade escravista. Não tinha características de base revolucionária, ou seja, não era um espaço territorial de onde saíssem operações contra centros ou vias de comunicação inimigas nem depósitos de material de guerra, mas exercia efeitos de desobediência e fuga das fazendas.
Só foi destruído após várias de tentativas às quais os habitantes responderam com bem executadas movimentações, deslocalizações e armadilhas. Dois elementos têm importância especial: Palmares estava politicamente organizado constituindo, de facto, uma federação de mocambos previamente existentes desde finais do século XVI. Foi ferozmente combatido tanto por forças portuguesas como holandesas, demonstração da afinidade colonial perante este tipo de desafio.
Por alturas da tomada de Caiena, já repercutia largamente no Brasil a independência do Haiti, resultado de ação efetivamente revolucionária, com insurreição, captura de armas ao inimigo e confronto direto prolongado de 1791 a 1804, motivo de pavor constante nos senhores de escravos em todas as Américas, principalmente no Brasil por possuir a colónia de maior número de escravizados e porque pairava sempre a possibilidade dos quilombos se tornarem bases revolucionárias.
Causar incerteza no campo inimigo é guerra psicológica, intencional ou não, daí que a ação dos capitães de mato não visava apenas recuperar as "peças" perdidas pelos proprietários das plantações, mas também evitar aumento dos efetivos mobilizáveis em fuga. A imagem desses capitães de mato não era diferente dos "bandeirantes" e perante propostas de envolver o exército na caça aos fugitivos, ficou conhecida a expressão de recusa "nós não somos capitães de mato".
Em 1817 a insurreição pernambucana - reprimida com mais brutalidade que a conspiração mineira de 1789 - mostrou outro pormenor militar de premira grandeza. Do lado insurrecional surgiu uma força armada que, pela sua amplitude, devia ter passado por preparação de pelo menos alguns meses, sendo claramente uma força brasileira com centro de decisão e comando local. A forte presença de mestiçagem poderia, em caso de vitória, colocar os abolicionistas em melhor posição que no modelo 7 de setembro. Do lado colonial, os praças seriam brasileiros em maioria sob comando de "reynóis".
Cinco anos depois, um dos motivos de hesitação da componente brasileira do referido modelo estava ligada ao receio de que as forças armadas só obedeceriam ao futuro Pedro I, receio talvez infundado. Marcilio Cassoti no seu livro "A vida intima de Leopoldina" assinala, logo nos primeiros anos do recém proclamado Império brasileiro, uma proposta de chefes militares à imperatriz para derrubar o marido e colocá-la no poder.
Força armada improvisada emergiu na Bahia, centro dos mais importantes combates contra as forças portuguesas que se mantiveram leais a Lisboa após o 7 de setembro. Com o mesmo tipo de unidades escaramuças ocorreram por breves momentos em outros pontos do extenso território.
Para além da independência e até da proclamação da República, levantes armados tiveram lugar com características de separatismo regional ou movimentos messiânicos. O maior impacto esteve na guerra Farroupilha (1835-1845) onde os rebeldes chegaram a controlar o Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina, com apoio internacional e evolução para operações militares convencionais a partir de combatentes em farrapos. Os contornos desta guerra, a partir da sua segunda fase, revelaram alguns pontos comuns com a Guerra da Secessão norte-americana.
Em todos os casos, a unidade territorial brasileira foi preservada com exército e marinha governamentais que, embora muito abaixo do que já naquela época era possível, tinham superado a fase embrionária ou "artesanal". A guerra do Paraguai funcionaria como motor de modernização da estrutura militar do país, inclusive pelas inesperadas dificuldades que apresentou, quer dizer, guerra de coligação sub-continental prevista para poucas semanas durou mais de cinco anos (dezembro 1864-março 1870) A partir de então a influência política dos altos comandos militares aumentou, culminando no golpe de estado instaurador da República em 15 de novembro de 1889.
A hierarquia das forças armadas brasileiras manteve um perfil elitista herdado do período colonial que nem a modernização originada por novos relacionamentos internacionais nem a transferência de tecnologia conseguiram superar. Aliás, outras forças armadas em aliança ou acordos com o Brasil tinham perfis do mesmo gabarito. Por essa razão alguns acontecimentos históricos têm alto relevo. Entre eles a revolta da chibata, na Marinha de Guerra, representou uma revolta sobretudo de marinheiros negros submetidos a castigos corporais violentos. O resultado imediato foi repressão ainda mais severa mas hoje o líder dessa revolta é herói para grande parte da população e até da própria Marinha.
Outro acontecimento importante, por razão diferente, foi a intentona comunista de 1935, decorrente da linha do então PCB em conexão com a política externa da URSS, injustificada, errada e, obviamente derrotada, mas que demonstrou o extremo da diversidade de opiniões existente na baixa oficialidade. Aliás, Luís Carlos Prestes, a grande figura do comunismo brasileiro, era antigo oficial do exército. Ao contrário da revolta da chibata, porém, ninguém vê os autores dessa intentona como heróis.
A revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder teve suporte militar prolongado nas fases seguintes do getulismo que, como todo o caudilhismo latino-americano da época, implantou ditadura. O lado desenvolvimentista da mudança em 1930 e anos seguintes pôs termo a vários capítulos do modelo 7 de setembro, na medida em que o novo regime procurou sair da dependência total de bens primários e de obediência sistemática a algumas grandes potências. Criou indústrias, tentou jogar nas contradições internacionais por um tempo e aderiu a regras de obediência negociando-as.
Assim, o Brasil entrou na segunda guerra mundial, único país latino-americano a colocar tropas no teatro de operações europeu, experiência de impacto em si e geradora de novos quadros de pensamento estratégico, muito influentes na Escola Superior de Guerra, durante algum tempo designada como "Sorbonne" e marcada também por diversidade de pontos de vista. Por exemplo, o Presidente Marechal Dutra situava-se abertamente à direita, enquanto o posterior ministro da Guerra, Marchal Lott (no governo Juscelino Kibitschek) montou dispositivos para reduzir ações anti-constitucionais e, mais tarde, adotaria posições de centro-esquerda com candidato presidencial.
Na "Sorbonne", a linha dominante era pró-ocidental sem excluir nacionalismo em detalhes importantes: ser tratado como igual em todas as negociações e defender a Petrobrás como empresa estratégica estatal. Na crise sucessória causada pela renúncia sem motivo do Presidente Jânio Quadros em 1961, esta linha agiu no sentido de evitar a posse do vice-presidente João Goulart, ação contrariada graças a resistência no Rio Grande do Sul, possível pelo apoio do II Exército, então o mais equipado do país e situado no sul, considerado naqueles anos como área de segurança prioritária. Ao mesmo tempo, projetou a liderança do governador do Estado, Leonel Brizola, como figura nacional marcante, empenhado na viragem do getulismo para populismo de esquerda (embora recusasse a designação de "populista").
Em 1964, nenhuma forma de resistência impediu o golpe que derrubou Goulart. Inserido na estratégia do campo ocidental visando conter a URSS, este golpe teve importantes fatores internos, como aliás, todos os golpes latino-americanos desse período. A contenção da URSS implicava contenção da esquerda revolucionária por todo o lado. No Brasil ela era muito fraca sendo com frequência confundida com o nacionalismo - representado, por exemplo, pela Frente Parlamentar Nacionalista - ou pelo populismo oriundo do getulismo. Os motivos internos estavam ligados à política dos conservadores brasileiros contra a crescimento dessas tendências que também não agradavam às visões elaboradas na "Sorbonne".
Goulart ele próprio não via com bons olhos - mas também não considerava perigosas - as tendências de base marxista, acreditando na sua própria capacidade de expansão dentro do movimento sindical e de possuir um bom esquema militar. A sua proposta de reformas de base era, na verdade, uma modernização do capitalismo interno que, aliás, os próprios militares contribuiriam para implementar quando, mais tarde, um importante setor tecnocrático entrou no governo.
Desde a independência que ninguém podia fazer política no Brasil sem algum tipo de articulação e concordância com os militares. Se o pensamento militar exterior ao esquema de João Goulart não apreciava seus posicionamentos e alianças, pior foram dois atos sentidos como grave indisciplina pondo em causa a hierarquia militar: uma grande assembleia de sargentos com autorização e presença oficial e a ocupação de um sindicato por elevado número de marinheiros com proclamações revolucionárias.
O regime instalado teve duração próxima de vinte anos, com dois perfis maiores: repressão brutal com recurso sistemático à tortura e modernização da Economia, sobretudo num período de grande crescimento denominado como "milagre brasileiro". Muito dependente da conjuntura internacional, o "milagre" caiu, como tem acontecido em todos os momentos de grande crescimento, antes ou depois do regime iniciado em 1964, que de militar passou a ser designado com frequência, mesmo por opositores, como civil-militar, em virtude do grande papel atribuído a tecnocratas ou políticos civis.
Muitos destes sobreviveram à democratização, como o ex ministro da Fazenda, Delfim Neto, bastante consultado por personalidades de toda a sequência de governos eleitos, ou como políticos do partido pró regime civil-militar ARENA, sob novo nome de Partido Progressista, que também tem estado em toda essa sequência de governos, incluindo os de esquerda. A democratização pôs termo ao bipartidarismo obrigatório e novos partidos foram criados, em alguns dos quais entraram personalidades do anterior regime, civis ou militares. Foi nesse quadro partidário que fez carreira parlamentar Jair Bolsonaro, até chegar à Presidência da República.
Em consonância com situações presentes em alguns momentos políticos dos séculos XIX e começo do XX, também surgiram no período pós 1964 e, sobretudo, pós 1968 até meados dos anos 1970, grupos armados clandestinos civis com participação de militares de baixas patentes, revelando fraco desempenho na organização combativa e escolha dos alvos, resultantes do grande erro ao optarem pela luta armada como forma de resistência naquelas circunstâncias. Vários componentes desses movimentos também entraram com muito relevo na luta política posterior, sendo a ex Presidente Dilma Roussef o principal exemplo.
Desde a democratização, as estruturas de comando e o conjunto da oficialidade das forças armadas mantêm o mais longo período de silêncio político da sua História.
Segundo o Global Fire Power, o Brasil é a décima potência militar mundial (coincidindo, portanto, com seu lugar nos PIBs), classificação sempre sujeita a confirmação e, por isso mesmo, os estados-maiores brasileiros estão preocupados acima de tudo na sua constante atualização. A força aérea tem em andamento um poderoso programa de construção de aviões SAAB de alto desempenho em cujo contrato figura transferência de tecnologia. A marinha estuda vias, meios e opções de modernizar a esquadra. O exército não precisa de aumentar o efetivo, porém, não pode ficar for da corrida a novas tecnologias de equipamento.
São estas as prioridades e não quem está no governo. Não é mero acaso que o primeiro nome apontado por Lula para o próximo ministério tenha sido o ministro da Defesa. O país superou há muitos anos a preocupação com a fronteira sul, mantendo as prioridades na Amazônia e no Atlântico Sul. Na primeira, há indicações de muita melhoria na segurança da Colômbia, mas não há nada garantido sobre evolução da Venezuela e, agora, o Peru aparece como foco de instabilidade ameaçadora para toda a região amazônica ocidental - brasileira ou não.
O Atlântico Sul, já de alto relevo nas trocas internacionais, é sempre motivo de atenção em virtude de suas margens petrolíferas, de subida no gabarito ao mínimo problema na zona do canal de Suez ou até em virtude de alguma ação imprevisível. Aqui a atenção pode, de repente, virar alerta.
Isto não significa ausência de interesse pela política nacional, sendo muito provável a maioria de todos os escalões não gostar de Lula e do PT. Seja assim ou não, pouco importa, pois a política de Defesa não se faz em bases de gostos opinativos nem sob pressão de pequenos grupos nas proximidades de quarteis. As forças armadas observam com atenção o equilibrado jogo político partidário do momento, em função das suas prioridades.
A designação oficial dos partidos como "legendas" corresponde a linguagem eleitoral oficial, no entanto, quando se analisa de perto verificamos que as legendas nem sempre são verdadeiros partidos políticos. São muitas vezes gabinetes eleitorais com fracas afinidades dentro delas próprias, elemento facilitador das articulações por quem está no poder: tem mais para oferecer e, sobretudo, é conhecida a vontade dessas legendas em ficarem sempre "por cima".
Centralidade imediata é o novo governo definir uma política económica vocacionada para o desenvolvimento e não apenas para assistencialismo ou ficar pela solução das urgências. Central também seria a disposição de acabar com os restos de colonialidade e do modelo 7 de setembro, com participação em postos governamentais não apenas decorativos, de personalidades vindas dos segmentos até aqui subalternizados. Para não se cair em disfarces com novos Felipe Camarão e Henrique Dias.
Pesquisador no NEA/INEST/UFF (Rio de Janeiro) e no CEI/ ISCTE/IUL (Lisboa)