Do buraco negro onde caiu o futebol holandês nos últimos anos, com a seleção a falhar as últimas grandes provas do futebol internacional (Euro 2016 e Mundial 2018), emergiu uma luz a carregar a ilusão de um futuro que resgate o brilhante legado das gerações que fizeram da Holanda o país do futebol total..Um jovem irreverente capaz de jogar ao ataque desde a defesa e à defesa logo no ataque, reinventando conceitos e posicionamentos num estilo disruptivo para o futebol do seu tempo. A descrição poderia eventualmente ter sido feita por quem viu Johan Cruyff jogar naquele Ajax que revolucionou a Europa na transição das décadas de 1960 para 70, mas os termos são utilizados agora para descrever Frenkie de Jong, a nova joia que, acreditam os holandeses, pode ser o novo génio revolucionário num país que sempre prezou a tradição vanguardista do seu legado futebolístico..Mais uma vez, o ninho do talento é o popular clube de Amesterdão que projetou Cruyff e alimentou as grandes gerações do futebol holandês (Neeskens, Van Basten, Rijkaard, Bergkamp, Davids, Kluivert, os irmãos de Boer... enfim, a lista seria fastidiosa). Um Ajax que nesta terça-feira recebe o Benfica, na Liga dos Campeões, com Frenkie de Jong, aos 21 anos, como rosto principal de uma nova geração de talentos que o clube já tem preparada para enfrentar a elite europeia..No país de Cruyff, o futebol do jovem Frenkie faz, curiosamente, evocar mais a figura de Beckenbauer, o líbero alemão que deixou a laranja mecânica de 1974 sem o título mundial. Jogando a médio defensivo ou até mesmo a central, como aconteceu na época passada, de Jong espanta pela facilidade com que consegue romper linhas inimigas - tanto com uma correria pelo meio do relvado como com longos passes de um lado do campo ao outro..Um criador desde trás, como Beckenbauer no seu tempo, num futebol moderno que cada vez mais exige capacidade de criação aos jogadores recuados, de forma a criar desequilíbrios nos posicionamentos defensivos dos adversários. Prova dessa conjugação rara de características é dada também pelas estatísticas da Eredivisie, a liga holandesa, onde Frenkie de Jong foi na época passada o melhor driblador e melhor passador do campeonato, com 91,5% de passes certos e 90,3% de dribles bem-sucedidos..Formado no modesto Willem II.Frenkie até nem cresceu nas famosas escolas de formação do Ajax. Natural de Arkel, perto de Roterdão, de uma família de fanáticos do Feyenoord, De Jong escolheu no entanto o Willem II para a sua formação futebolística e só se mudou para o Ajax em 2015, para a equipa de sub-21, depois de ter jogado uma única vez pela equipa principal do Willem. Pela formação sénior do Ajax estreou-se em setembro de 2016, numa temporada (2016-17) em que ainda repartiu tempo entre a equipa principal e a B, ganhando o prémio de jogador do ano das camadas jovens do clube. A afirmação a tempo inteiro no onze principal chegou na temporada passada, solidificada já com o atual treinador, Erik ten Hag..Mas o jovem médio defensivo - posição onde se tem consolidado nesta temporada, com o número 21 nas costas - não é o único nome do Ajax a sustentar as esperanças de futuro tanto do clube como da seleção holandesa. No clube de Amesterdão crescem ainda nomes como Matthijs de Ligt, central de 19 anos promovido ainda antes de De Jong e que enverga já a braçadeira de capitão, ou Danny van de Beek, médio de 21, todos eles já escolhas habituais do selecionador Ronald Koeman na nova laranja que ainda recentemente vergou a Alemanha por 3-0, na Liga das Nações, neste processo de retoma do futebol holandês no panorama internacional..No Ajax atual, às novas pérolas holandesas acrescentam-se ainda outros excitantes prospetos estrangeiros como o brasileiro David Neres (21 anos), o austríaco Wober (20) ou até o camaronês Onana (22), que se tornou dono da baliza..No regresso à Liga dos Campeões, onde o popular clube holandês, quatro vezes campeão europeu (três consecutivas na época de Cruyff, entre 1971 e 1973, e outra em 1995, com a geração de Kluivert, Davids, De Boer e Van Gaal no banco), não se apresentava desde 2014-15, a nova geração de talentos do Ajax - pontuada com a experiência de outros jogadores, como Daley Blind, Schone ou Huntelaar - tem-se mostrado à altura do cenário..Uma vitória por 3-0 sobre o AEK de Atenas a abrir o grupo e um assinalável empate em casa do grande favorito Bayern de Munique, a uma bola, deixaram a equipa holandesa a repartir a liderança do grupo E com os alemães, com quatro pontos, mais um do que o Benfica. O que reforça a importância do duplo encontro que se segue entre as duas equipas (terça-feira na Amsterdam Arena, dia 7 de novembro na Luz)..Tal como aconteceu com o Ajax de Cruyff no seu tempo, também agora o Benfica surge no caminho da nova geração do clube holandês para aferir a qualidade do apregoado Frenkie de Jong. Não se espera que este Ajax seja capaz de dominar a Europa como o do início dos anos 1970, isso não se afigura possível num futebol cada vez mais entregue ao domínio dos clubes das ligas mais endinheiradas, mas há expectativa sobre o real impacto desta nova fornada de talentos na paisagem da elite europeia..Interessados fazem fila.Num mundo globalizado ao instante, a fama de De Jong já entusiasmou, naturalmente, todos os que seguem minimamente o fenómeno do futebol. E já fez o nome do jovem holandês saltar para as agendas de todos os mais importantes clubes e homens de negócios do futebol mundial, do Barcelona ao Manchester City, do Tottenham à Juventus, entre outros..Segundo a imprensa catalã, o Ajax já pôs preço ao Barcelona para poder levar as suas duas principais joias, De Jong e De Ligt: 130 milhões de euros. E os media ingleses garantem que Pep Guardiola também está muito interessado em ter o talento do novo Beckenbauer nas mãos, com o Manchester City disposto a bater o seu recorde de transferências e gastar mais de 70 milhões de euros na contratação de Frenkie. Para Xavi, antigo capitão do Barça, De Jong "é precisamente o jogador de que o Barcelona precisa". Arie Haan, antigo internacional holandês da geração de 1970, vai mais longe: "É ainda melhor do que Beckenbauer, porque é mais rápido e passa melhor.".Nesta terça-feira, a equipa de Rui Vitória vai aquilatar de perto todo esse hype em redor da anunciada futura superestrela do futebol holandês, num duelo de Champions em que o Benfica também tem pode puxar de alguns (bons) galões em matéria de talento jovem. Assim o seu treinador resolva lançar para a discussão nomes como Gedson Fernandes, João Félix ou até o mais recente João Filipe Jota (Rúben Dias está castigado após o vermelho em Atenas).