Este filme nasce de uma peça escrita por si, mas curiosamente não tem qualquer tipo de movimento teatral, ao contrário do seu filme A Festa (1998), que posteriormente inspirou um texto para teatro....Quisemos jogar precisamente com isso! Sabe, A Festa é ainda uma peça com enorme sucesso e que viaja por todo o mundo. O engraçado na versão teatral do A Comuna é que também não há ideias de cinema: são apenas pessoas numa casa. E, claro, não temos a criança. Uma criança num palco não dá... O filme é muito diferente da peça..Viveu na primeira pessoa, enquanto criança, o sonho da ideologia hippie dinamarquesa com o aparecimento das comunas (viveu numa comuna dos 7 aos 19 anos). Olha para esses tempos e esse modo de vida como uma utopia?.Não, de modo algum! As comunas foram uma experiência, funcionaram como um sacrifício mas é claro que tinham grandes problemas. Por outro lado, trouxeram um grande ideal de oportunidade, de força e virtude, características que me deixam saudades. A minha visão antiquada e romântica faz-me acreditar que nós testámos isso tudo com a nossa vida e que o amor é capaz de superar tudo..Mas ainda não me respondeu porque é que acha que as comunas não foram uma utopia..Porque eram antes um sonho. Ainda hoje acho que era uma possibilidade... Os anos 1980 mudaram o espírito, trouxeram um sentimento de liberdade individual e do direito à privacidade, que também tem muito cabimento. Trata-se de um novo leque de valores que, por sua vez, também são inatacáveis e são aqueles que cada vez mais as pessoas se agarram. Não sei se o meu filme mostra mas estas comunidades eram mesmo capazes de apagar a tua personalidade e privacidade. Tiravam-te o direito a teres sentimentos! Agora, depois dos anos 2000, os valores de partilha foram transformados por comportamentos indignos e egoístas. Venho de um país que fez anúncios em jornais iranianos para evitar que os refugiados escolhessem a Dinamarca como destino... Tenho vergonha disso. Além de ser embaraçoso, é errado! Toda esta situação dos refugiados é muito complicada..Voltando ao filme, está convencido de que não idealiza o passado?.Não idealizo! Mas é óbvio que adorei ter vivido numa comuna quando era puto mas o lado negro que a história tem mostra que esta experiência impedia que as pessoas tivessem prazer em viver em coletividade. Lembro-me de que viver numa comuna tinha muito que ver com aquilo que se queria mostrar ao mundo. Depois de três semanas a partilhares a tua vida em grupo, as defesas pessoais baixam. Como criança aprendi a navegar no meio daquilo tudo. Chegava um tipo novo que queria instalar-se connosco e eu só imaginava: deixa ver como é que ele aguenta até segunda-feira depois de estar bêbado também aos domingos... Foi nessa observação que me tornei escritor. Aprendi na comuna que a vida real não faz sentido..Um dos temas do filme é a questão da maneira como o adultério era encarado na sociedade....Sim e agora esses temas são todos uma agenda... Hoje quando alguém engana alguém é quase um crime. Antes havia aquela ideia de que não podíamos aprisionar o nosso parceiro na monogamia, éramos ensinados a deixar o outro ir....Disse em entrevistas que já trocou uma mulher por outra. O filme é um pedido de desculpas seu?.Sim, mas nunca poderei compensar essa pessoa pelo o que fiz... Estou cheio de culpa dentro de mim. Trocar alguém é muito brutal e este filme tem algo de confissão pessoal. Estive num casamento durante 20 anos e o que digo aos meus filhos é que a continuidade entre dois seres humanos é importante e para nos separamos tem de haver uma razão muito forte. No meu caso, havia...