Agosto não será o melhor dos meses para visitar a cidade de Praga mas é óptimo para ler sobre ela. Até porque a praga de turistas que invade Praga nesta época do ano desaconselha quaisquer dois dias que sejam a deambular pelas tradicionais ruas da capital checa ou mesmo um banho na história de séculos que passa sob as suas pontes famosas. Por isso, nada melhor que distrairmos o olhar e o pensamento pelas páginas de literatura que lhe diz respeito e que nos abre a vontade de a visitar em melhores dias. Como é o caso do livro do escritor John Banville que a Asa editou recentemente na colecção "O Escritor e a Cidade", da qual em edições do DN já foram comentados o passeio parisiense de Edmund White e o da Florença de David Leavitt..Imagens de Praga não foge ao esquema mental que os anteriores escritores-protagonistas desta colecção utilizaram para desenvolver a sua prosa sobre uma e outra cidades europeias. Mas o irlandês Banville abandona um pouco o caminho do roteiro que ambos tentaram percorrer ao longo das suas páginas para se preocupar algo mais com a história de Praga, com uma tentativa - conseguida - de fazer este esboço de forma pouco maçadora para os leitores que não estejam exactamente em busca de conhecer todo o seu passado. Assim sendo, de capítulo em capítulo, o autor vai misturando essas datas e acontecimentos num imenso boião de conversas tidas com amigos e relatos condimentados com muitos pormenores de estadas várias e outros assuntos bem inesperados..É o caso da primeira das sete partes em que o volume se divide e na qual Banville nos introduz ao livro. Intitulada "Perspectiva a Cidade de Sudek", conta-nos uma das suas visitas à bela cidade de Praga sob um método inesperado, como se fosse um quase romance ou conto. Começa assim: "Era Inverno quando vi pela primeira vez a cidade coberta por um manto de neve reluzindo ao sol de um final de Janeiro excepcionalmente luminoso." Este, que poderia quase ser o início de uma qualquer fotonovela, surpreende nos períodos que se seguem e faz-nos entender que esta sua forma de escrever é sincera e que, principalmente, se coaduna com o facto político com que nos irá entreter ao longo de sucessivas páginas, o de que estamos no tempo da Guerra Fria dos anos sessenta..John Banville coloca-nos de posse de um seu segredo, o de que entre as tarefas que terá de desempenhar como escritor em visita a um país estrangeiro tem uma outra, que se enquadra nos ritos de espionagem e secretismo próprios da época, que é fazer sair da ex-Checoslováquia um embrulho que permitirá ao filho do senhor que o entrega fazer dinheiro para pagar os seus estudos numa faculdade dos Estados Unidos da América. O pacote é nada mais nada menos que um conjunto de fotografias a preto e branco feitas por um dos grandes pioneiros desta arte, Josef Sudek....Está dado o mote para percorrermos Praga sob um manto de equívocos tão habituais como os criados pelo seu personagem mais destacado - Kafka - e descobrir a cidade com uma vontade real.