Aclamado, mas de mãos a abanar: a viagem agridoce de Zelensky

Em três capitais europeias ouviu palavras de apoio e recebeu homenagens, mas o presidente ucraniano não regressou com bagagem adicional. A Moldávia foi avisada por Zelensky de um plano russo para derrubar a democracia.
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O presidente ucraniano protagonizou uma viagem com paragens em Londres, Paris e Bruxelas quando o primeiro aniversário da invasão russa se aproxima e as forças de Moscovo voltaram a ter a iniciativa no terreno. O objetivo era reavivar as opiniões públicas dos parceiros ocidentais e dos seus dirigentes para a necessidade de adicionar mais armamento e de forma mais expedita para Kiev, por um lado; e de pressionar a frente da integração europeia, uma semana depois da cimeira Ucrânia-UE que decorreu na capital ucraniana. Volodymyr Zelensky foi agraciado com a grã-cruz da Legião de Honra pelo presidente francês, recebeu efusivos abraços e ademanes, ovações e loas, mas no imediato levou para casa nada de concreto.

À boleia de Paris para a capital belga no avião presidencial francês, ao lado de Emmanuel Macron, o líder ucraniano foi recebido pelo presidente do Conselho e pela presidente da Comissão no aeroporto de Bruxelas, "o coração da família europeia, à qual a Ucrânia pertence", como declarou Ursula von der Leyen.

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Mais tarde disse estar impressionada com a rapidez das reformas ucranianas, mas lembrou que há "um caminho difícil a percorrer" perante um Zelensky que já vê o seu país na UE já este ano.

Já a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, ao discursar no hemiciclo, traçou uma linha entre o sacrifício dos ucranianos "pela Europa", pelo que defendeu medidas como "um comércio mais fácil", "o processo de adesão mais rápido possível" e fundos para a reconstrução, mas também para as tropas e para fornecer equipamento militar. "Os estados devem considerar, rapidamente, como um próximo passo, fornecer sistemas [de mísseis] de longo alcance e os caças de que necessita para proteger a liberdade que demasiados tomaram por garantida. A nossa resposta deve ser proporcional à ameaça, e a ameaça é existencial".

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Com os papéis aparentemente invertidos, coube a Zelensky uma alocução centrada na defesa dos valores europeus, em contraste com "a força antieuropeia que tenta roubar a Europa de todos". Para concluir: "Uma Europa livre não pode ser imaginada sem uma Ucrânia livre. Só a nossa vitória irá ser o garante de cada um dos valores europeus comuns."

Mais tarde, em conferência de imprensa conjunta com Von der Leyen e Michel, Zelensky mostrou-se otimista quanto à assistência militar. "Sem dúvida, estou muito inspirado pelas declarações de que a Europa estará connosco até à vitória. E hoje ouvi dos líderes de alguns estados europeus que estão prontos a fornecer-nos as armas necessárias, incluindo aviões."

Convidado especial da cimeira dos 27 líderes, no discurso de abertura agradeceu o apoio mas não deixou passar em claro que o seu país precisa de mais "artilharia, munições, tanques modernos, mísseis de longo alcance e caças".

Na véspera, perante os parlamentares britânicos, centrou as atenções nos aviões de combate, embora peritos militares lembrem que o mais urgente será a obtenção de sistemas de mísseis de longo alcance, e que o Reino Unido não tem as aeronaves de que Kiev precisa. Na ressaca do jantar de Zelensky no Eliseu, um oficial da força aérea francesa confirmou a ideia de que os Mirage são uma hipótese, e que há 13 desses caças disponíveis.

O presidente ucraniano revelou aos chefes de Estado e de governo da UE que Kiev tinha "intercetado um plano de destruição da Moldávia pelos serviços secretos russos", no qual se "mostra quem, quando e como vai derrubar a democracia da Moldávia e estabelecer o controlo" sobre o pequeno país situado entre a Ucrânia e a Roménia. Zelensky disse ter avisado Chisinau, embora não soubesse precisar "se Moscovo deu de facto uma ordem para avançar com o plano".

Pouco depois, os serviços secretos da Moldávia confirmaram que a Rússia estava a agir no sentido de desestabilizar a antiga república soviética. "O Serviço de Informações e Segurança confirma que, tanto a partir das informações apresentadas pelo nosso parceiro ucraniano como das nossas atividades operacionais, foram identificadas ações subversivas com o objetivo de minar a República da Moldávia, de desestabilização e de violação da ordem pública." O SIS disse ainda não poder pormenorizar "porque há o risco de comprometer diferentes atividades operacionais em curso".

A Moldávia, presidida pela pró-europeia Maia Sandu, recebeu o estatuto de candidata à adesão à União Europeia ao mesmo tempo que a Ucrânia. Apesar da sua neutralidade, tem sido alvo de ameaças da Rússia, que ali mantém tropas na região separatista da Transnístria. Há dias, o chefe da diplomacia russa Sergei Lavrov disse que o Ocidente quer transformar a Moldávia "na próxima Ucrânia" e acusou Sandu de querer levar o país para a NATO e "unir-se à Roménia".

cesar.avo@dn.pt

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