Nas negociações com a Turquia sobre a crise de refugiados, a Europa perdeu a superioridade moral. No início do ano, a União Europeia estava paralisada pela perspetiva de três ameaças simultâneas e potencialmente destrutivas: grexit, brexit e a crise de refugiados. Desde então, uma delas tem diminuído de intensidade, mas não desapareceu; a segunda permanece por decidir; e a outra está em perigo de explodir..A crise a abrandar é a da Grécia. O acordo da semana passada afastou o risco de uma saída da Grécia da zona euro no futuro imediato. O acordo deixa caracteristicamente uma séria de pontas soltas, o que é preocupante, mas não necessariamente desastroso..Numa concessão significativa, o Fundo Monetário Internacional aceitou que um acordo sobre o alívio da dívida para Atenas fosse adiado por mais dois anos. Isto agrada a Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças alemão, porque o seu partido opõe-se à redução da dívida. Mas o acordo exige também que ele e outros ministros das Finanças europeus deixem claro antes do final deste ano quais as medidas de alívio da dívida que pretendem propor. Os números terão de ser razoáveis - um acontecimento inédito na política de resolução de crises da zona euro. Há uma enorme pressão sobre as autoridades da zona euro para apresentarem uns números que o FMI possa aceitar..Os ministros das Finanças europeus acederam também a que as necessidades brutas de financiamento da Grécia não excedam os 15% da produção económica. O NBF é o instrumento de medida preferido do FMI. É o dinheiro que um país necessita para financiar as taxas de juro e a amortização da dívida. A aceitação de um teto NBF é um grande passo em frente, pois é o mecanismo que obriga ao alívio da dívida. O problema com este último acordo é que os credores podem não manter a sua palavra. A ironia é que o Bundestag poderia aprovar o alívio da dívida grega hoje, mas poderá não ser capaz de o fazer após as eleições federais do próximo ano..A Alternative für Deutschland, um partido populista, anti-imigração e antieuro, e os liberais estão ambos a favor de a Grécia sair do grupo da moeda única. Nenhum destes partidos tem assento no Bundestag, mas ambos têm a expectativa de, no próximo ano, atingirem os valores mínimos para terem representação parlamentar. Se os juntarmos aos céticos entre os democratas-cristãos no poder, poderá não haver maioria para o alívio da dívida. O compromisso de Schäuble nesta semana para o alívio da dívida em 2018 simplesmente não é credível. A segunda das crises potenciais é o brexit. As sondagens sugerem que as hipóteses para a campanha pela permanência melhoraram, embora nada esteja ainda garantido - muita coisa pode acontecer antes da votação de 23 de junho. Os ataques da Comissão Europeia a Boris Johnson, o ex-presidente da Câmara de Londres e militante pelo brexit, ou as sugestões de que a UE iria penalizar o Reino Unido se a votação fosse a favor da não permanência não ajudam. Estas coisas favorecem a campanha pela saída..Embora as perspetivas para a Grã-Bretanha se manter na UE possam parecer ligeiramente melhores do que um mês atrás, o acordo sobre os refugiados de Angela Merkel com o presidente Recep Tayyip Erdogan, da Turquia, vai na direção oposta. A princípio parecia que a chanceler alemã se iria livrar da confusão da sua política de migração ao conseguir de Ancara um acordo de troca de refugiados. O acordo prevê que a Turquia envie um refugiado legal para a UE por cada migrante ilegal que os barcos de patrulha turcos apanhem no mar Egeu. O principal efeito tangível não é a troca, mas o sinal que envia aos refugiados. São menos os que desde então têm escolhido as rotas marítimas. Erdogan ameaçou na semana passada não ratificar o acordo. Ele rejeita o pedido da UE para modificar as leis antiterroristas do seu país, que lhe permitem perseguir dissidentes políticos, incluindo jornalistas. A promessa da UE de permitir a isenção de visto aos turcos para viajarem no Espaço Schengen está oficialmente subordinada à proteção dos direitos civis na Turquia. Erdogan insiste agora para que a UE liberalize o regime de vistos incondicionalmente, caso contrário deixará cair o acordo sobre os refugiados. A UE não pode aceitar isto - embora esteja atenta a uma escapatória. Na verdade, Erdogan dá a impressão de que precisa menos do acordo do que Merkel. Ela visitou-o na semana passada e, diplomaticamente, evitou encontrar-se com deputados curdos, cuja imunidade tinha acabado de ser levantada pelo Parlamento turco, ou com jornalistas locais, que enfrentam acusações criminais apenas por fazerem o seu trabalho..Se o acordo cair e Ancara relaxar as patrulhas, a crise de refugiados vai inflamar-se novamente. Mais importante ainda, o acordo viola os valores europeus. Ele só pode funcionar se a UE fizer vista grossa às violações turcas dos direitos humanos. De todos os argumentos para sair da UE, este tem alguma substância: nas suas negociações com a Turquia, a UE perdeu a superioridade moral. Até ao final do ano podemos descobrir que a UE escapou por pouco a todas as três. As autoridades irão felicitar-se umas às outras. Mas logo a seguir vão perceber que a crise da dívida grega continua por resolver, que as novas regras do Reino Unido como membro da UE são terrivelmente difíceis de gerir e que o único vencedor do acordo com a Turquia é Merkel, como sempre.