A revolta de Júlia Stepanova, a delatora que o COI castigou

Atleta que denunciou esquema de doping russo pede ao Comité Olímpico que reveja a sua exclusão do Rio 2016
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Sem a coragem de Júlia Stepanova, e do seu marido, Vitaly, muito provavelmente nunca se teria sabido do esquema de dopagem a larga escala patrocinado pelas autoridades estatais na Rússia. E, no entanto, a corredora de 800 metros acabou por ser uma das atletas mais castigadas pela reação do Comité Olímpico Internacional (COI), que no domingo passado não excluiu a Rússia dos próximo Jogos Olímpicos, ao contrário do esperado (e reclamado) por muitos outros países e atletas, mas retirou, sim, qualquer hipótese de Júlia poder competir no Rio de Janeiro.

Graças a Stepanova, repita-se, fez-se luz sobre um dos maiores escândalos de doping da história, destapado nos últimos tempos por relatórios independentes ao abrigo da Agência Mundial Antidopagem (AMA), e que deixou o desporto russo em xeque antes dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que começam no próximo dia 5 de agosto. Foram a atleta e o seu marido, Vitaly, um antigo funcionário da agência antidopagem russa RUSADA, quem denunciou o esquema de doping a larga escala levado a cabo pelo regime de Vladimir Putin.

Primeiro procuraram a AMA, em 2010, que lhes respondeu que não tinha poderes de investigação. Depois, em 2014, já um ano depois de Stepanova ter sido suspensa por irregularidades no seu passaporte biológico, o casal decidiu fazer chegar a denúncia ao jornalista Hajo Seppelt, que acabou por desencadear a atenção global sobre o caso através de um documentário emitido na cadeia televisiva alemã ARD.

Daí até ao cenário atual que deixou todo o desporto russo sob descrédito e ameaça de exclusão olímpica foram dois anos de investigações e relatórios que levaram, primeiro, a Federação Internacional de Atletismo (IAAF) a suspender o atletismo russo de todas as competições (Jogos Olímpicos incluídos), e, mais recentemente, o COI a delegar nas respetivas federações internacionais a decisão de permitir ou não atletas russos no Rio 2016, sob uma condição: que nunca tenham sido castigados por doping.

E foi esta condição, imposta no domingo passado pelo organismo presidido por Thomas Bach, que acabou por tramar Júlia Stepanova, a quem a IAAF tinha dado permissão para participar nos Jogos do Rio como atleta neutral, "pelo seu extraordinário contributo para a defesa de um desporto limpo".

Uma permissão agora recusada pelo COI, que em compensação convidou Júlia e Vitaly a estarem presentes como convidados na cerimónia de abertura. A atleta e o marido, que vivem escondidos na América do Norte desde que denunciaram o esquema de doping russo e aceitaram colaborar com as investigações AMA e a IAAF, não escondem a revolta com a decisão do COI. "É uma decisão injusta. Não denunciámos o caso com a expectativa de receber um convite para assistir aos Jogos. Não queremos nenhum favor, queremos um tratamento justo", reagiu o casal, em comunicado, lembrando a perseguição das autoridades russas desde que fizeram a denúncia.

"A Júlia foi prejudicada na carreira por ter tomado esta atitude em defesa de um desporto limpo. Ela já cumpriu a sua pena por doping e agora está a ser penalizada outra vez, enquanto o esquema comprovado de doping de estado passou em claro para o COI", reforçou Vitaly, esperando que o organismo "reveja a exclusão" de Júlia Stepanova.

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