Gostava de escrever discursos para Barack Obama. Sem brincadeira, gostava mesmo. O mais que provável futuro Presidente dos Estados Unidos é um orador invulgar, que transforma qualquer texto fraquinho numa prosa notável. Foi o que ele fez em Berlim. Numa oratória luminosa, frases que brilhavam. Imagino que muitas das pessoas que assistiram ao discurso tenham pensado que este era um momento histórico. Tirando uma perna partida, a eleição está praticamente ganha: Obama tem mais dinheiro e a Imprensa já decidiu. Mas há qualquer coisa naquela retórica que lembra sermões de um sacerdote dotado. O problema é a substância. Sem a parte vistosa, o que diz o futuro presidente é bastante idêntico ao que dizem os outros. Em Berlim, Barack Obama disse que a Europa era um aliado fundamental, que os EUA tinham de ouvir mais vezes esse fantástico aliado e que no Afeganistão era preciso nova ajuda militar europeia. Os europeus têm 25 mil soldados no Afeganistão e, curiosamente, este discurso foi feito na Alemanha, onde a opinião pública é hostil ao envolvimento alemão no conflito. Foi como se as pessoas não ouvissem o que o candidato, de facto, estava a dizer. O Afeganistão é a verdadeira frente da guerra, tem afirmado Obama. Na estratégia para o Iraque, onde este candidato diverge do rival republicano, John McCain, os democratas querem uma retirada em 16 meses, com transferência de duas brigadas para o Afeganistão. Barack Obama já afirmou que seria aceitável a divisão do Iraque em três partes (xiita, sunita, curda). O que não explicou foi que essa solução colocaria o Iraque indefinidamente sob controlo dos americanos. A parte xiita precisa de protecção em relação à Arábia Saudita e ao Irão; a sunita, em relação à parte xiita e à Arábia Saudita; a curda, em relação à Turquia e ao Irão. Haveria, portanto, bases americanas residuais para proteger toda esta gente dos respectivos inimigos. Obama parece ter razão quando diz que o Afeganistão é a frente mais importante da guerra contra o terrorismo. A força expedicionária é insuficiente para ocupar o terreno, reconhecem os comandantes da NATO, e os rebeldes talibãs movem-se com grande à-vontade, intimidam a população, desfazem o esforço de reconstrução, financiam-se com o tráfico de droga. A NATO arrisca-se a perder este conflito difícil. Mas a avaliar pelo entusiasmo com que saudaram o discurso de Berlim, os europeus estão dispostos a enviar tropas frescas.|