A pesada herança dos Orleães

Nas últimas 24 horas a França esteve de olhos postos em Chantilly. Aristocratas de todo o mundo reuniram-se ontem em torno de uma das mais importantes famílias europeias
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Desde a manhã cedo de ontem que em Chantilly, França, se reuniu uma das famílias mais importantes da história de França: os Orleães. No Palácio de Chantilly - que pertenceu durante gerações ao clã - o duque de Vendôme, filho do actual conde de Paris, casou-se com Philomena de Tornos y Steinhart, uma aristocrata de ascendência espanhola. O enlace obedeceu às velhas regras protocolares instituídas há muitos séculos: a noiva apresentou--se de ombros cobertos, tanto na igreja como no copo--d'água, e os convidados eram da mais alta estirpe.

À festa compareceram vários ramos do clã espalhados pelo mundo e muitas personalidades, como a duquesa de Cadaval e o seu marido Charles- Philippe d'Orléans, o príncipe Felipe de Espanha e a mulher Letizia, os Grimaldi do Mónaco e a família real de Marrocos. Pela pompa e circunstância anunciada pela imprensa, pela primeira vez nos últimos meses a França voyeurista pôde descansar das aventuras de Nicolas Sarkozy e da mulher, a supermodelo Carla Bruni.

De longos braços e força magnânima, os Orleães foram uma das famílias mais poderosas da Europa. Estiveram presentes no império do Brasil, na monarquia portuguesa (a rainha D. Amélia era filha do conde de Paris, neto do último rei de França), na história espanhola e francesa. Fizeram casamentos com princesas inglesas e alemãs.

Implicados em teias de intriga, urdindo as mais maquiavélicas conspirações, os Orléans deixaram uma marca na história e por isso mesmo a história não foi branda para com eles.

Luís XIII teve vários filhos, o mais novo era atarracado, muito moreno e vaidoso. Adorava polvilhar-se com pó-de-arroz e adornar-se com os mais excêntricos acessórios. O mais velho, pelo contrário, era louro, altivo mas igualmente vaidoso. Ambos marcaram os destinos de França.

As duas crianças foram educadas por um tutor, o escritor François Lamothe Le Vayer, mas o homem, apesar de inteligente, não dava um passo sem pedir a opinião do mais influente dos cardeais, o italiano Mazarino.

A ideia do eclesiástico era preparar o filho mais velho do monarca para ser rei, mas quando se apercebeu de que o irmão mais novo era substancialmente mais esperto que o mais velho tomou medidas drásticas. Filipe foi incentivado a não estudar, garantindo assim que o primeiro duque de Orleães nunca fizesse sombra ao seu irmão, o futuro rei Luís XIV. Com esta estratégia, Mazarino conseguiu que Filipe se transformasse num frívolo odioso e que os irmãos rivalizassem até à morte.

O duque de Orleães não estudou e dedicou-se apenas a futilidades. No livro La famille d'Orléans depuis son origine jusqu'a nos jours chamam-lhe " debochado". O jovem duque passava o dia na companhia de amantes, adorava jóias e era capaz de usar 20 anéis ao mesmo tempo. Quando o seu irmão já era rei, o mesmo livro conta um episódio elucidativo sobre a relação de ambos. Certa vez o duque de Orleãess resolveu tomar um pequeno-almoço reforçado e encheu o prato de carne, logo de manhã. O irmão tirou-lhe o prato da frente e insultou-o com os piores nomes. Sem hesitar, o duque pegou na refeição e atirou-lha à cara, acertando-lhe em cheio.

Luís XIV considerava-se um ser superior às outras pessoas. " O povo não passava de uma matéria explorável, um compósito de vilões. A nação residia apenas na pessoa do monarca", lê-se em La famille d'Orléans depuis son origine jusqu'a nos jours.

A dinastia dos Orleães poderá apenas ter dado à França um rei - Luís Filipe -, mas marcou o percurso do país muito além desse momento da história. Ainda hoje o nome incendeia polémicas e desencadeia acesas discussões. Para a maioria dos historiadores, como a linha primogénita dos Borbom está extinta, a linha mais próxima da casa real de França é representada pelo actual conde de Paris, tio de Charles-Philippe d'Orléans, duque de Anju, casado com Diana de Cadaval. Henrique de Orleães é por isso para muitos o actual rei de França.

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