A "não questão" no meio de tantas questões

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Ainda bem. O Presidente Marcelo - Celinho, como lhe chamou RAP, de forma simpática, diria até carinhosa - falou a propósito do Acordo Ortográfico e, espero eu, tão cedo ninguém voltará ao tema. Quanto mais tempo melhor. Depois de há uma semana ter admitido repensar o assunto, se países como Moçambique e Angola decidissem não ratificar o Acordo, ontem, Marcelo Rebelo de Sousa disse: "É um não tema. É uma não questão."

Não podia estar mais de acordo com o Presidente. Não só o debate sobre o desaparecimento de "c" é vácuo e maçador, como existem coisas, essas sim verdadeiramente importantes, para resolver em todos os países de língua portuguesa. Em cada um e, em alguns casos, na sua relação com Portugal. Começando por Angola, o país recorreu ao FMI, vive uma crise, que se agrava com a queda do preço do petróleo. Além disso, as relações com Portugal têm vivido momentos de tensão, em que o caso da disputa pelo BPI é apenas o mais visível.

Seguimos para o Brasil. O "vexame histórico", como alguém ontem se referia ao caso do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, sem fim à vista, é apenas um lado do problema. Também a economia brasileira já viveu melhores dias. Recentemente, o FMI agravou as suas previsões para o colosso brasileiro, prevendo uma contração do PIB de 3,8% em 2016. As duas crises - a política e a económica - misturam-se, resultando numa situação social potencialmente explosiva.

E Moçambique? Moçambique não só acaba de enterrar os corpos das 13 vítimas, que perderam a vida em circunstâncias ainda por esclarecer, como vive severos riscos ao nível da paz e da situação económica, financeira e social. O caso das dívidas ocultas, que poderá custar a suspensão das ajudas financeiras dos doadores internacionais, que pesam 12% do orçamento para 2016, é um duro golpe na credibilidade internacional do país.

E há, claro, Portugal. É verdade que a geringonça já aguentou seis meses e que assim deverá continuar, mas a situação económica e financeira do país é tudo menos tranquila. A tentar sair de uma das maiores crises por que passou, prevê-se um crescimento económico magro e muitas dificuldades ao nível do investimento e da criação de emprego. Não é por causa da crise dos refugiados que deixamos de tentar resolver o problema da sustentabilidade das economias europeias, mas há problemas e problemas. E, visto o filme dos acontecimentos no mundo que fala português, o Acordo Ortográfico pode bem ser encarado como um capricho de quem se afeiçoou a escrever de uma certa forma. É, de facto, uma não questão, como disse Marcelo.

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