A hora de Olívia Byington

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Olívia Byington já tem uma carreira de 30 anos na música popular brasileira, mas é a primeira vez que chama a um dos seus discos apenas e exclusivamente Olívia Byington. Falta de imaginação? Nada disso: excesso de aplicação. Pela primeira vez na sua vida, a cantora brasileira larga a pele de intérprete de temas alheios e transforma-se em compositora de corpo inteiro, assinando a totalidade das canções do seu oitavo álbum. "Estou dedicada a este disco como talvez nunca me tenha dedicado em toda a carreira a um trabalho", afirma. "É muito grande a sua importância na minha vida."

Curiosamente, a brasileiríssima Olívia Byington acabou por escolher lançar o mais pessoal dos seus discos - conta com participações dos cúmplices Maria Bethânia e Seu Jorge - primeiro em Portugal e só depois no Brasil. A explicação reside numa portuguese connection, um nome que não se tem cansado de construir pontes entre os dois lados do Atlântico: Tiago Torres da Silva. São dele as letras de nove dos 12 temas do álbum, e sobre a sua pessoa só se ouvem elogios a sair da boca de Olívia. "O Tiago é genial", repete várias vezes, chegando a traçar comparações entusiasmadas com Chico Buarque (o que já é excesso de simpatia). Tirando as hipérboles, a verdade é que a dupla, como se diz no futebol, está bem entrosada.

Mas, afinal, o que aconteceu para a Olívia compositora tomar conta dos acontecimentos e deixar a Olívia intérprete em pousio? "Foi um desvio do meu caminho", admite. "Estava dedicada a fazer um disco de Caetano Veloso, no meio de uma pesquisa enorme, buscando as coisas mais diferentes. Para isso, voltei a tocar violão e comecei a fazer introduções para as suas músicas no violão. E aí, conversando com o Geraldo Carneiro, meu parceiro, amigo e poeta, ele perguntou-me: 'Vem cá, você vai dar essas introduções para o Caetano? Para quê? Vai em frente, acaba de compor a música'."

E assim, Caetano ficou sem um disco em sua honra, e Olívia redescobriu o prazer de compor, actividade a que não se dedicava desde os anos 80. Mas a história não acaba aqui. "Foi por essa altura que conheci o Tiago Torres da Silva, que me enviou a letra Areias do Leblon. No outro dia tranquei-me no estúdio, comecei a compor e tudo foi saindo de uma maneira meio vulcânica." Aí, o seu filho mais velho, de 20 anos, também teve um papel decisivo: "Ele ia a passar e perguntou-me: 'que música linda é essa do Caetano? Essa eu não conheço'". A mãe explicou-lhe e ele foi taxativo: "Você tem de voltar a compor."

Empurrada de todos os lados e tomada pela tal inspiração vulcânica - "consumiu-me durante quatro meses, fiquei dentro daquele universo, compondo as músicas, não dormia, foi uma coisa mesmo de transe, de surto criativo" -, Olívia Byington tornou-se uma inevitabilidade. "Tudo o que fiz antes confluiu para aqui, para este disco, que tem a minha identidade. Esse disco é resultado da minha vida inteira, de conviver com Tom Jobim, com Egberto Gismonti. Estou muito orgulhosa dele." E o pobre Caetano? "O Caetano está na gaveta, esperando. Está na fila." Para já, a hora é mesmo de Olívia.

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