A diáspora brasileira

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Brasil foi, até há pouco tempo, um país importador de mão-de-obra. Poucos anos depois de proclamada a independência, passou a receber imigrantes de quase todas as partes do mundo. Era gente que vinha arriscar projectos de vida numa terra que oferecia oportunidades e tinha riquezas como poucas. O término do trabalho escravo, ao correr do século XIX, favorecia a entrada de estrangeiros, que, ao contrário do que acontecia no país de origem, não encontravam dificuldades, quer na agricultura, quer no comércio, quer nas minas, para se empregarem.

A composição demográfica reflectiu a presença de muitas etnias e culturas e em algumas das principais cidades, como o Rio de Janeiro, São Paulo, Santos, Recife, Belém, Salvador, Manaus, Vila Rica e São Luiz, os elementos estrangeiros tinham bastante influência.

As séries estatísticas mostram que o Brasil recebeu milhões de imigrantes, à frente deles os portugueses e os italianos, que se ocuparam em diversos ofícios e profissões, que constituíram famílias, que arriscaram empreendimentos, que ficaram ricos ou continuaram pobres - e aqui morreram.

As políticas de emigração mudaram conforme as épocas e os Governos: quando faltava mão-de- -obra, mandavam-se os «engajadores» aliciar jovens nas províncias do Norte de Portugal para virem trabalhar nos engenhos do Nordeste e no comércio do Rio de Janeiro; ou, então, quando escasseavam os empregos, aumentavam-se restrições à entrada de trabalhadores de fora, exigia-se a autorização prévia das autoridades e a «carta de chamada».

Nas últimas décadas, a situação começou a mudar - e milhares de brasileiros saíram do país para arriscar em terra alheia a sua aventura. Inverteram-se os fluxos das migrações. Os Estados Unidos, o Japão e a Europa foram os principais destinos. Calcula-se que mais de três milhões de brasileiros vivem e trabalham no exterior.

Esta nova realidade trouxe consequências internas e repercute-se em diversos quadrantes da vida nacional. A começar pela política externa. Os Governos passaram a preocupar-se não só com a extensão e a eficácia de uma rede consular, que se tornou necessária para atender os milhões de brasileiros que vivem lá fora, mas também se viram obrigados a cuidar dos direitos e garantias desses cidadãos nos Estados onde residem, para não serem discriminados pela nacionalidade, para terem o mesmo tratamento trabalhista e previdenciário que têm os nacionais, para os filhos terem acesso à escola, para não ficarem excluídos do sistema de saúde e assim por diante.

Um segundo aspecto onde se reflecte a importância da diáspora é o das remessas cambiais. São cinco mil milhões de dólares por ano, ou mais, que ingressam no país, como resultado das transferências dos brasileiros que trabalham no exterior. E não existe nenhuma contrapartida, como acontece com as exportações ou com o turismo. Esses são recursos que entram sem qualquer encargo no balanço de pagamentos.

Ainda no quadrante económico, a diáspora tem também influência na colocação de produtos brasileiros nos países de acolhimento. E essa influência, às vezes, é importante até para mexer com os próprios hábitos da sociedade local, como é o caso, por exemplo, dos dekasseguis no Japão.

Por último, temos os gens e os patterns culturais que são levados pelos que emigram e transplantados na terra de destino, a língua que espalham, as imagens do país que valorizam, os traços de brasilidade que perduram. A própria maneira de ser e de estar no mundo, como diria o prof. Adriano Moreira.

A saída de brasileiros do país pode ter sido, muitas vezes, dolorosa; foi, quase sempre, uma aventura; representou perdas e separou famílias. Mas, por outro lado, esses milhões de brasileiros que vivem longe da pátria acabaram por lhe dar uma outra dimensão. Cada um repercute um pedaço da alma nacional. E é importante que os Governos levem o Brasil para mais perto deles.

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