A chuva castigou os mais pobres

Entre os 102 mortos confirmados só há pessoas dos escalões sociais mais baixos. Ninguém abastado morreu
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O inédito dilúvio que se abateu na terça-feira sobre o Rio de Janeiro castigou os mais pobres. O número de mortes chegou aos 102 - todos pertencentes às classes mais baixas. Eram, em geral, pessoas sem emprego fixo, que viviam de biscates e não conseguiam residência na cidade asfaltada. Por isso, procuraram as favelas. Foi aí que a tragédia as surpreendeu. Há também cerca de 50 desaparecidos - também dos escalões sociais mais baixos. O temporal deixou ainda dois mil desalojados.

Ao contrário do que sucede nos Estados Unidos, onde são os ricos que moram nas encostas, os morros do Rio são ocupados pelos mais pobres, que ali erguem habitações frágeis, geralmente apenas de madeira. Segundo os especialistas, estes morros são compostos de rocha, com uma camada ténue de terra. Quando a terra se molha, transforma-se numa massa pantanosa que desce ladeira abaixo, levando consigo barracas e vidas humanas.

Não há notícia de que nenhum membro das classes mais abastadas tenha morrido nesta tragédia, tal como também não há registo de portugueses entre as vítimas. As classes média e alta tiveram apenas de lamentar a perda de alguns voos para outras cidades.

De qualquer modo, a vida no Rio vai voltando aos poucos ao normal. O jogo de futebol entre o Flamengo e a Universidade do Chile, para a Taça Libertadores da América, foi adiado para hoje, dia em que está prevista a reabertura das escolas. Mas os adultos já ontem voltaram ao trabalho e os transportes públicos estão novamente a funcionar.

Segundo os meteorologistas, uma onda de frio, vinda do Sul, encontrou um Rio de Janeiro com um ar invulgarmente quente, cercado de águas igualmente quentes. A cortina de montanhas que rodeia a cidade ajudou a concentrar a chuva durante muito tempo no mesmo local, gerando o excesso de precipitação. O cimento e o asfalto dificultaram a drenagem das águas, ampliando os riscos de inundação. Como a maré estava alta, o oceano não ajudou a escorrer as águas dos rios: pelo contrário, actuou como uma barreira. Na lagoa Rodrigo de Freitas, na zona mais nobre do Rio, o nível das águas subiu até metro e meio, inundando as áreas circundantes.

Segundo o engenheiro ambiental, o Rio é uma cidade vulnerável, pois trata-se de um local com muito cimento, cercado pelo mar, de um lado, e de montanhas, do outro. A proliferação de favelas resultante da desordem da ocupação do solo é o elemento que completa este perigoso quadro.

Quando ocorrem intempéries a cidade é servida pelo sistema Alerta Rio, que procura avisar a população para a iminência de fortes chuvadas e convoca bombeiros e polícias para estarem a postos. A acção de resgate foi eficaz, mesmo sem ter evitado mortes.

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