Durante mais de dez anos gravou discos a bordo dos The Czars, um colectivo com sede em Denver (no Colorado) que, todavia, nunca alcançou o devido reconhecimento. Agora, aos 41 anos, John Grant dá finalmente que falar. E tudo por conta da aclamação (com votação de cinco em cinco, por exemplo, na revista Mojo) do seu primeiro álbum a solo (ver texto secundário).."Foi frustrante", reconhece o músico ao recordar a discreta projecção da obra dos Czars. O relativo desinteresse global levou-o mesmo a "querer desistir da música, e a pensar que a banda era um fracasso" por culpa sua. Pensava que talvez não fosse "suficientemente bom" e que, por isso, "deveria fazer outras coisas". Como "regressar aos restaurantes, a servir à mesa"... Voltou às aulas, para retomar estudos que havia deixado inacabados . "Mudei-me para Nova Iorque por algum tempo. Mas na realidade a música é algo que acabamos por nunca pode poder deixar totalmente. Continua a remexer algo dentro da cabeça", reconhece. E acabou mesmo por regressar. .A auto-estima correu, de facto, alguns furos abaixo da média em vários momentos da vida de John Grant. "Parte dessa falta de auto-estima pode ter a ver com a forma como fui educado", confessa, recordando uma educação passada entre uma família profundamente religiosa. "Fui de-senvolvendo esta ideia de que, se temos um certo orgulho em nós mesmos e naquilo que fazemos isso era, na verdade, uma expressão de vaidade. Ou seja, uma coisa má! E por isso nunca aprendi o que era ter autoconfiança", explica. E acrescenta que, se "sentia que algo era bom, então qualquer coisa má ia acontecer depois"..Da etapa da vida em família, na juventude, recorda outros momentos de verdadeiro conflito entre o que sentia e os modelos que lhe eram apresentados como os que deveria seguir. "Cedo me foi dado a entender que não era certa a atracção que sentia por pessoas do mesmo sexo", recorda John Grant, que agora projectou na canção Sigourney Weaver algumas memórias desses dias de dor interior. A canção, do alinhamento deste seu novo disco, fala de uma altura em que a sua família se mudou do Michigan para o Colorado. "Eu tinha uma esperança de que essas sensações que tinha não iam connosco para o Colorado, que iam ficar no Michigan... Mas cheguei ao Colorado, a uma nova escola, e essas sensações ainda estavam lá. Chamavam-me nomes... E foi difícil, sobretudo porque não sabia como lidar com aquilo", descreve, juntando à discriminação que sentiu quanto à sua sexualidade um outro conflito, de classes, vivido entre os colegas da nova escola. .O tempo ensinou-o a levar algumas destas memórias doridas às suas canções. "A canção é uma dádiva que recebi e que me ajuda a lidar com as coisas mais difíceis da vida. Mas por vezes é difícil de avançar. Durante anos senti-me atolado nas drogas e no álcool. E fiquei ali... Não me sentia a progredir mental e espiritualmente. Para continuar uma carreira na música senti que tinha de ficar sóbrio", reconhece. E diz que "de outra forma não conseguiria ter feito este disco.".Apesar do reconhecimento que sente finalmente com o novo disco, John Grant ainda se sente, por vezes, dividido por conflitos interiores. Alguns deles passando pela sua relação com a fé. "Ainda acredito que existe um Deus", começa por explicar. Mas sente "um conflito constante", porque "parece que não podemos ter uma vida espiritual se esta é a nossa sexualidade. Essa é uma questão importante. E ainda não encontrei a resposta", conclui.