"Obviamente que nunca fiquei feliz com a situação, mas foi do género: 'OK, esta é a minha condição agora. É uma porcaria? É, mas eu vou tentar viver com isto da melhor forma", conta Catarina Oliveira. Quanto tempo demoramos a mudar de roupa? A sentar no carro? A tomar banho? Ela também não sabia. Mas há três anos, no primeiro dia de 2016, de viagem no Brasil, deixou de sentir as pernas..Uma inflamação na medula, mielite transversa, descobrir-se-ia mais tarde, tirou-lhe a capacidade de andar. Teve de aprender a fazer todas as pequenas coisas na nova condição e de ganhar força e resistência física para as executar. Todavia, quando lhe perguntamos em que medida a cadeira de rodas a transformou, responde que "o que mudou menos foi a questão do andar". A grande "viagem", como lhe chama aquela rapariga do Porto, teve outras geografias. "Sou uma pessoa muito mais paciente, vejo a vida de forma diferente, vivo muito mais o momento presente.".Hoje com 30 anos e um canal de YouTube, C Feliz, com 2500 subscritores, e quase cinco mil seguidores no Instagram, onde fala do seu quotidiano numa cadeira de rodas e de questões que muitos querem saber mas não perguntam, como em relação ao sexo num paraplégico, Catarina Oliveira olha para trás e recorda que, quando soube como seria a sua vida na nova condição, nunca a preocupou a questão de continuar a ser ela, mas de como as pessoas iriam dali em diante olhar para ela, se iam ou não ver além da cadeira de rodas.."A cadeira de forma nenhuma me prende. É a forma de eu estar liberta, porque sem ela eu não saía de casa. Hoje em dia eu em casa sou completamente independente, como se andasse." Essa independência, conta, foi conquistada, e grande parte do caminho fez-se através do desporto. Catarina, que já antes praticara voleibol e ténis, começou, ainda no centro de reabilitação, a jogar andebol, seguiu-se o ténis, o remo e a canoagem. Hoje frequenta sobretudo o ginásio. "Obviamente que o desporto sempre me deu prazer, mas era aliado ao aspeto físico, à manutenção de um corpo bonito. Hoje em dia isso também é importante, mas já não é tanto esse o foco, é mais ganhar resistência e força para o dia-a-dia. O desporto dá-nos essa liberdade.".Outra das mudanças aconteceu no seu futuro profissional. Em 2016 Catarina Oliveira era estudante de Medicina. "E voltei. Mas outra das coisas que a cadeira me trouxe foi pensar sobre a minha vida e sobre o que me fazia bem. Nos últimos anos já não estava muito feliz no curso e não sabia bem o que queria. A cadeira trouxe-me também essa lucidez. Transferi-me de curso e agora estou em Nutrição, que era realmente o que eu queria. Não sei porque demorei tanto tempo a perceber.".Se há um elemento comum em cada um dos vídeos ou publicações de Catarina Oliveira, esse terá qualquer coisa que ver com a alegria. Podia ter sido tudo diferente? "Depois do que me aconteceu conheci muita gente na cadeira, ouvi muitas histórias, e de facto não consigo bem explicar porque é que reagi tão bem, foi uma coisa natural. As coisas acabam por ser cada vez melhores quando a pessoa aceita", responde..Podia ser tudo mais fácil, acaba por dizer, se não existissem ainda tantas barreiras físicas. No Porto, por exemplo, é impensável sair à noite e tentar ir à casa de banho sozinha, ou passear pela baixa sem alguém que, a determinado momento, a auxilie. Mas nada disso a tem parado. "Nós muitas vezes andamos a correr, até parece que a vida passa por nós assim meio a correr, e quando somos obrigados a parar, obviamente não por uma coisa boa, acabam por vir coisas boas, no fim."