Antes de partir para o exílio na semana passada, a ex-primeira dama tunisina ainda teve tempo para um último acto de rapinagem: deslocou-se ao Banco Central da Tunísia, onde exigiu, e conseguiu, que lhe fossem entregues barras de ouro no valor de 45 milhões de euros. E Leila Trabelsi Ben Ali parte, em seguida, calma e sem remorsos, ao encontro do marido que a aguarda na cidade portuária saudita de Jidá..Este último "assalto" de Leila reforça os epítetos com que é classificada pela imprensa internacional. Para o diário britânico Guardian, ela é a "Lady Macbeth da Tunísia" e para The Telegraph a "Imelda Marcos do mundo árabe" ou a "Rainha de Cartago", epítetos que pouco devem incomodar a segunda mulher de Ben Ali, convencida que estava da sua capacidade - e possibilidade - para assumir oficial e abertamente o poder após o desaparecimento do marido..A menina que nasceu em Outubro de 1956 numa família pobre e iliterada de Tunes, e que teve de partilhar com os seus onze irmãos o pão que o pai conseguia como vendedor de fruta na cidade velha da capital, transformou-se numa mulher inteligente, ambiciosa e desprovida de escrúpulos. Supersticiosa, Leila é, tal como a sua mãe, versada em magia, malefícios e sortilégios, assim como também é provida de uma paciência sem limites, de uma intuição apurada e de um charme a que poucos resistem. Junte-se todos estes atributos numa mesma pessoa e não surpreende que ela, a cabeleireira do salão Donna na rua de La Soukha, tenha conseguido chegar tão alto na escala social. Frequentado pela alta sociedade tunisina, o salão serve-lhe para estabelecer contactos que irá explorar a seu tempo. E fica mesmo ao lado do Ministério do Interior, cujos corredores Leila percorre com certo à-vontade. É dada como espia dos líbios na Tunísia, depois como espia dos tunisinos nos meios líbios. Mas a sua sorte muda mesmo quando se envolve com o general Ben Ali de quem tem uma filha. Em 1987, Ben Ali sobe ao poder, divorcia-se e casa com Leila. E , com ela leva todo o clã Trabelsi. Tímidos no início, Leila e os irmãos vão perdendo com o tempo qualquer inibição na sua ganância, ao ponto do nome da família se transformar em sinónimo da corrupção que grassa na Tunísia. Uma nuvem apenas na vida de Leila, que domina de facto o poder nos últimos anos dada a doença do marido, prende-se com a atitude de desprezo, embora disfarçado, com que a tratam as outras primeiras damas árabes que digerem mal as intrigas e a manipulação da "cabeleireira do Donna".