É um mal geral e o cenário é preocupante em todo o mundo. Tanto, que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decidiu dedicar-lhe este Dia Mundial da Saúde - a 7 de Abril - que assinala a sua fundação, em 1948. Todos os anos é escolhido um único tema de saúde de impacto a nível global, para a campanha global da OMS e seus parceiros. Este ano o tema é a hipertensão arterial, pela necessidade de alertar as pessoas para o perigo que representa para a saúde cardiovascular..Para percebermos bem o que é a hipertensão, basta pensar nas artérias como os corredores do metro. Uma artéria sujeita a hipertensão é como um corredor cheio de gente a passar e, devido à pressão das pessoas em circulação, estas encostam-se com força às paredes, provocando o desgaste destas devido à constante sobrecarga. A hipertensão não se vê, não se sente. Mas o mal está lá..A hipertensão é apropriadamente apelidada de doença silenciosa: não tem sintomas, não se manifesta e só é detectada quando medida. Acontece frequentemente ser detectada apenas após episódios que podem deixar lesões graves e está na origem de doenças cardiovasculares fatais, como o acidente vascular cerebral (AVC) ou o enfarte do miocárdio. Falamos de hipertensão quando a tensão arterial (valores da pressão que o sangue exerce sobre os vasos sanguíneos) é superior aos valores considerados normais e saudáveis, de 130/85 mmHg ou, como vulgarmente se diz, 13/8,5. Quando se verifica que um indivíduo tem sistematicamente os valores da tensão acima destes, então há uma situação de hipertensão que, se não for tratada, afecta a normal circulação de sangue, contribuindo para a danificação de órgãos vitais como o cérebro, coração e rins..Com excepção dos factores genéticos e a idade (que não conseguimos modificar), uma grande parte dos casos de hipertensão arterial surge associada a comportamentos de risco, como a má alimentação, em particular o consumo excessivo de sal, o sedentarismo, o tabagismo, o alcoolismo, o stress, o excesso de peso e obesidade. Apesar de ser uma doença crónica e (com raríssimas exceções) sem cura, pode ser prevenida, com a adopção de medidas simples ligadas a um estilo de vida saudável, evitando os comportamentos de risco mencionados, como reduzir o consumo de sal, fazer exercício físico (bastam 2 caminhadas por semana), não fumar e ter cuidado com a alimentação. Um estudo agora divulgado pela Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH) revela que 42,2% da população é hipertensa. Preocupante? Sim. Praticamente metade dos portugueses são atingidos por uma condição que está nas suas mãos evitar. E refira-se que houve uma ligeiríssima redução dos hipertensos, face a dados anteriores também da SPH, mas que ainda não é suficiente. Muito continua por ser feito e as más notícias não ficam por aqui. O consumo médio de sal anda na casa dos 10,7 g por dia, quando a OMS recomenda 5 g por dia para os adultos. E existem dados que comprovam que uma redução no consumo de sal tem impacto directo na redução do número de AVC..Além de ser um problema de saúde, acredito que este é um problema cultural com origem em comportamentos enraizados que se traduzem em factores de risco. Muitos países, como Portugal ou o Japão, têm hábitos de consumo elevado de sódio (o sal convencional é composto por cloreto de sódio), através de alguns produtos típicos das gastronomias destes países. Nós, com os enchidos e o bacalhau, só para dar alguns exemplos, e os japoneses com o molho de soja (que também contém imenso sódio). É fundamental que exista a urgência em repensar estes hábitos e enquadrá-los nas épocas em que surgiram, em que o sal servia como forma de conservar os alimentos, por um lado, e de mascarar um pouco o sabor, quando os alimentos já não eram frescos. .Por outro lado, o próprio estilo de vida sedentário e a facilidade em consumir fast food com frequência abrem caminho a uma saúde com cada vez mais problemas. Pela primeira vez na história da humanidade, estima-se que a esperança média de vida das crianças de hoje (se forem obesas) seja inferior à dos seus pais, devido aos hábitos adoptados, sobretudo nos últimos 20 anos. Em todo o mundo, existem 155 milhões de crianças com obesidade infantil. Há um vídeo elucidativo da Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil que pode ser consultado online (www.apcoi.pt/obesidade-infantil/) com dados reveladores de como o panorama é assustador..Mas, lentamente, começam a perceber-se sinais de preocupação. As grandes marcas mundiais demonstram cuidados, alguns governos legislam limites de sódio nos alimentos, os próprios desenhos animados transmitem a mensagem de que é importante ter um estilo de vida saudável e sem excessos. Estes sinais percebem-se nas ruas, nos blogues, nas redes sociais, na televisão e por aí fora. Países que têm conduzido este problema com seriedade, como o Reino Unido, demonstram que vale a pena insistir na redução do consumo de sal como forma de combater a hipertensão. O consumo médio de sal baixou entre 2012 e 2006 cerca de 1 g, o que revela acção, mesmo que tímida, por parte de todos. Este problema passa também por uma questão de consciência colectiva, em que os próprios cidadãos devem começar a manifestar-se e a exigir medidas preventivas, sejam na redução de sal dos produtos comercializados ou na obrigação de informação elucidativa e adequada nos rótulos..Mas em pleno século XXI pode-se mudar este paradigma e adoptar um estilo de vida mais actual e preparado para os dias que vivemos, em que todos temos pouco tempo e recursos, mas em que têm de ser encontradas soluções para vivermos melhor, e mais tempo..* DIRECTOR MÉDICO DA BONSALT/ANGELINI FARMACÊUTICA