'Tuk-tuks' substituem burros em gaza

O bloqueio israelita tornou mais caro alimentar os burros, normalmente usados no transporte de mercadorias e pessoas em Gaza, do que comprar a gasolina que faz funcionar estes triciclos motorizados oriundos das grandes metrópoles do Sudeste asiático.
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Os famosos carros de burros da Faixa de Gaza têm agora um sério concorrente: o tuk-tuk, um triciclo motorizado oriundo das metrópoles do Sudeste Asiático, alimentado pelo combustível barato que recentemente invadiu o território palestiniano.

Os tuk-tuks, triciclos construídos com a parte da frente de uma scooter soldada a um atrelado de duas rodas, são um meio de transporte particularmente bem adaptado às condições económicas de Gaza, que se encontra debaixo do bloqueio israelita há quatro anos.

Ahmed Al-Idrissi, um contabilista palestinano de 29 anos que ganha a vida a comprar e revender electrodomésticos desde que foi despedido em 2007, desembaraçou-se do seu carro por 5400 euros há alguns meses. Para o substituir comprou um tuk-tuk topo de gama por 1900 euros.

O veículo azul novo em folha, com "Wadi Terbo" pintado de lado e pára-choques e faróis ainda protegidos pelo plástico de bolhas, percorre 25 quilómetros com apenas um litro de combustível. É capaz de atravessar a estreita faixa costeira em pouco mais de uma hora com o preço do combustível - mais barato que a água - a raramente ir além dos três dólares por dia.

"Já a comida para os burros é cara porque vem de Israel. Neste momento, a coisa mais barata em Gaza é o combustível", afirmou Idrissi.

Após o encerramento das fronteiras com Israel e com o Egipto, em Junho de 2006, é uma vasta rede de túneis escavados sob a fronteira egípcia - rede taxada e regulamentada pelo movimento islamita Hamas, no poder em Gaza - que abastece os 1,5 milhões de habitantes de basicamente todos os bens de consumo, incluindo a gasolina egípcia fortemente subsidiada.

Hoje, o litro de combustível importado do Egipto custa 50 cêntimos de dólar (0,40 euros), menos de um terço do preço do litro importado de Israel.

Isto explica em parte o recurso aos geradores que funcionam a combustível, que fazem trabalhar os ventiladores e sistemas de ar condicionado ao longo das ruas superpovoadas de Gaza, durante os frequentes cortes de electricidade.

Isso permite igualmente a Abu Fayez, 36 anos, ajudar o seu irmão mais velho, conduzindo o seu tuk-tuk amarelo vivo por entre as quintas do território, onde compra galinhas que revende no mercado Chajayak de Gaza.

"É muito mais rápido que um burro. Pode chegar a 80 quilómetros por hora. E o animal ia custar-me 20 a 30 shekels (quatro a seis euros) por dia para a comida, quando o combustível é apenas dez shekels (dois euros)", sublinha.

Os tuk-tuks de Gaza são normalmente fabricados na China, enviados ainda em peças separadas pelos túneis egípcios e montados de novo na cidade fronteiriça de Rafah. Apesar do aligeirar recente do bloqueio israelita, os automóveis não estão ainda autorizados a entrar na Faixa de Gaza.

E, nestes últimos meses, os concessionários da rua Salaheddine, a principal artéria de Gaza, resignaram-se a expor os tuk-tuks nas suas montras para continuar em actividade.

Mustafa Abu Warda, vendedor de carros há mais de 30 anos, gostava de retomar a sua actividade comercial. Como a maioria dos empresários palestinianos, lamenta a existência desta economia "subterrânea" dos túneis.

"Quando vendíamos carros importados de Israel, toda a gente ficava a ganhar: os vendedores, os mecânicos, os donos das garagens. Todos tinham trabalho. Com os tuk-tuks, só quem ganha é o proprietário do túnel", queixa-se Warda.

"Preciso pagar uma comissão de 230 euros por cada tuk-tuk e a minha margem de lucro não é mais que uma centena de euros. Estou praticamente deficitário", afirmou.

Ainda assim, percebe o interesse do novo transporte: "Os burros morrem. Os tuk-tuks não."

Jornalista da AFP

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